Nonato Guedes, com agências
O ministro paraibano Vital do Rêgo, do Tribunal de Contas da União, determinou que o governo Jair Bolsonaro cesse imediatamente a destinação de recursos de publicidade para sites e canais que promovam atividades ilegais ou cujo conteúdo não tenha relação com o público-alvo de suas campanhas. A decisão, de caráter cautelar (preventivo) foi tomada após a Folha de S. Paulo revelar em maio que averba oficial da propaganda da reforma da Previdência irrigou sites e canais na internet de jogo do bicho, em russo e infantis., As informações constam de planilhas da antiga Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência da República), agora abrigada no recriado Ministério das Comunicações.
O órgão, então comandado pelo secretário Fabio Wajngarten, contratou agências de publicidade que compram espaços por meio do GoogleAdsense para veicular anúncios em páginas de internet, canais do Youtube e aplicativos para celular. Por esse sistema, o anunciante escolhe que público quer atingir, em que tipos de veículo não quer que sua campanha apareça e quais palavras-chave devem ser vetadas. Então, o Google distribui a propaganda para quem cumpre os critérios estabelecidos pelo cliente. O montante pago pelo governo é dividido entre o Google e o site ou canal que recebeu a propaganda. Segundo as planilhas da Secom, dos 20 canais de YouTube que mais veicularam impressões (anúncios) da campanha da Nova Previdência no período reportado (6 de junho a 13 de julho de 2019 e 11 a 21 de agosto de 2019), 14 são primordialmente destinados ao público infanto-juvenil, como o Turma da Mônica e o Planeta Gêmeas.
Um dos mais contemplados com publicidade foi o GetMovies, voltado para crianças e 100% em russo – ao todo, foram 101.532 anúncios. Outra publicação que recebeu volume considerável de propaganda (319.082 inserções) foi o resultadodobichotemporeal.com. O jogo é ilegal no Brasil. Após revelação da Folha, o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, que atua perante o TCU, apresentou uma representação cobrando providências na Corte, entre elas a apuração de possíveis prejuízos ao erário. Além de proibir novos gastos, Vital do Rêgo determinou que a Pasta se explique em 15 dias sobre as despesas. Também ordenou que a pasta, sob o comando do deputado Fábio Faria (PSD-RN) desde sua recriação no mês passado – investigue os fatos e, no mesmo prazo, apresente ao tribunal “evidências robustas que afastem a ocorrência de indícios de irregularidade”. Na hipótese contrária, terá de instaurar uma tomada de contas especial, tipo de processo que busca quantificar danos ao erário e identificar seus responsáveis.
O TCU informa que a apuração do ministério não poderá se ater à campanha da Previdência, mas contemplar as demais lançadas pela Secom. O Tribunal requereu todas as planilhas de compra de espaços publicitários no GoogleAdsense ou qualquer outro sistema similar e também vai analisar os dados. Vital do Rêgo argumentou que caracteriza “flagrante desperdício de recursos públicos” a veiculação de propaganda em canais “de público-alvo completamente alheio ao que se pretende comunicar”. E comparou: “O caso em relevo – divulgar matérias afetas a regime jurídico-administrativo a crianças, sejam elas brasileiras ou de qualquer outra nacionalidade – equivale a vender areia no deserto, gelo nos polos ou água nos oceanos”.
E acrescentou o ministro: “No mesmo sentido, é inconcebível que, em um país carente como o Brasil, os escassos recursos públicos, parte dos quais destinados a campanhas informativas do governo federal, estejam a irrigar mídias que patrocinam atividades ilegais, ou delas se aproveitam, como é o caso do site que divulga resultados do chamado jogo do bicho”. Vital determinou que o ministério seja ouvido, também em 15 dias, sobre essas inserções publicitárias e que apresente “informações sobre medidas concretas, planejadas ou já implementadas no sentido de combater as ocorrências narradas, informando também eventuais resultados já alcançados”. Em nota, a Secom afirmou que tão logo as solicitações do ministro Vital do Rêgo chegarem serão adotadas as medidas determinadas e fornecidas as informações cabíveis.