Nonato Guedes
Quarto maior colégio eleitoral do Estado, a cidade de Bayeux, na Grande João Pessoa, enfrenta uma balbúrdia política e administrativa que repercute negativamente em toda a Paraíba. No bojo de impasses legais gerados em meio a situações artificiais produzidas por grupos que se enfrentam pelo controle da hegemonia política, Bayeux encaminha-se para a investidura de um quinto prefeito em menos de quatro anos, a ser escolhido por via indireta, por um colégio de apenas 17 eleitores – os vereadores que compõem a Câmara Municipal. O município tem pouco mais de setenta mil eleitores, que assistem, perplexos, ao espetáculo de bagunça institucionalizada na vida pública de Bayeux.
A conjuntura é deprimente porque a Justiça fica praticamente de mãos atadas para interferir no processo de modo a propiciar a retomada da normalidade administrativa em condições plenas e ideais. A convocação da eleição indireta, a ser ferida dentro de prazo relativamente curto, é alternativa prevista na lei orgânica do município em casos anormais como o que se verifica e que foi provocado pelo prefeito afastado Berg Lima com a decisão de oficializar sua renúncia ao mandato, o que foi prontamente aceito por se tratar de ato unilateral e, portanto, irretratável e inquestionável. Especula-se que haja manobra insidiosa por trás do gesto de renúncia, calculada com vistas a favorecer interesses pessoais do prefeito renunciante.
De concreto, a manobra perpetrada já possibilitou a derrubada, na esfera do Tribunal de Justiça, de processos que vinham tramitando e inquinando o ex-prefeito Berg Lima de supostos crimes de responsabilidade. Esses processos voltam a instâncias judiciais de primeiro grau, demandando novos rituais legalistas, com espaço para o ex-prefeito manter-se ativo, senão no “front” propriamente dito, certamente nos bastidores do jogo pelo poder na cidade. O prefeito renunciante verbalizou declarações em que apela para o bom mocismo, insinuando que praticou o gesto extremo com o fito de promover a “pacificação” ou a concórdia no tenso ambiente político de Bayeux. Tal manifestação não é levada a sério, inclusive diante da constatação de que pessoas ligadas a Berg Lima operam, de forma articulada, para decidir a parada da escolha do prefeito-tampão da cidade.
O descrédito em relação às verdadeiras intenções do prefeito renunciante é reforçado pela constatação de que Berg Lima, no período de menos quatro anos, tem sido o pivôt de um dos maiores impasses ocorridos na história do município satélite da Capital. Ele estava afastado em meio a denúncias de cometimento de irregularidades administrativas e o vice, Luiz Antônio, foi igualmente declarado impedido de exercer a titularidade, que, na sequência, foi transferida ao presidente da Câmara Municipal, Jefferson Kita. Cabe lembrar que Berg Lima, anteriormente, fora pilhado em flagrante de recebimento de propina, mediante extorsão feita contra comerciante local. Ele chegou a ser preso e cumpriu pena, conseguindo escafeder-se mediante ações de liberdade impetradas por advogados que constituíra para sua defesa.
Afastado da prefeitura, que não logrou retomar mediante incursões sucessivas no Judiciário, o prefeito foi adrede instruído a renunciar, com o argumento de que isto atenuaria sua situação pessoal, complicada diante de processos a que responde e que, na interpretação dos adversários, são devastadores para a carreira política do ex-gestor de Bayeux. De mais a mais, o mandato originalmente conferido a Berg Lima está se concluindo, com a alternância de poder programada para primeiro de janeiro do próximo ano. A eleição legítima e representativa que é a eleição direta para escolha de novo prefeito pela população teve que ser remarcada pelo TSE de outubro para novembro deste ano, em virtude das medidas restritivas de aglomeração decretadas no bojo das medidas sanitárias de prevenção e enfrentamento ao novo coronavírus. A probabilidade de que o ex-prefeito seja alijado em definitivo do cenário de poder é palpável e, em última análise, é o que faz Berg Lima agir com desenvoltura para buscar tumultuar a vida política, administrativa e institucional da cidade.
A situação é tanto mais grave para a população de Bayeux quando se leva em conta que o impasse administrativo ocorre em paralelo com a tragédia de saúde pública ocasionada pela disseminação do coronavírus no território, o que obriga a administração municipal, com todas as limitações que já vinha demonstrando, a ter que dar prioridade à adoção de medidas urgentes e protocolos eficientes com vistas a resguardar vidas. Tudo conspira para um caldo de cultura extremamente desfavorável à população da chamada “cidade francesa”. Mas a crise é uma oportunidade para o eleitorado abrir os olhos e fazer escolhas mais positivas em seu próprio benefício na “eleição da pandemia”, como está sendo denominada por autoridades médicas e especialistas da Justiça e da política no Brasil.