Nonato Guedes
Nada como um pleito atrás do outro – e uma disputa no meio para provocar um divisor de águas na política paraibana. É o que vai acontecer nas eleições de novembro deste ano em todo o Estado, quando os esquemas do governador João Azevêdo (Cidadania) e do ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) tomarão rumos diferentes, em alguns casos chegando ao confronto acirrado como deverá concretizar-se em João Pessoa na disputa pela cadeira que é ocupada há quase oito anos por Luciano Cartaxo, do PV. Azevêdo e Ricardo foram aliados durante muito tempo e estiveram juntos no mesmo palanque em 2018, onde Coutinho pediu votos para João, eleito no primeiro turno. Depois da posse de Azevêdo, romperam.
O pleito de João Pessoa promete ser eletrizante porque o ex-governador, envolvido com processos da Operação Calvário e incomodado com o uso de tornozeleira eletrônica, testará seu prestígio fora do poder lançando como candidata à prefeitura sua atual esposa, a ex-secretária de Finanças do Estado Amanda Rodrigues, que nunca militou politicamente nem concorreu a qualquer cargo eletivo. Azevêdo, cujo grupo foi praticamente expelido do PSB por ação personalíssima de Ricardo, está se testando como chefe de um partido, o Cidadania, onde tem prepostos nas direções estadual (Ronaldo Guerra) e municipal em João Pessoa (Bruno Farias, vereador). O governador deverá ser o último ator importante do processo político paraibano a anunciar candidatura ou posição política do seu grupo na eleição na Capital – e inúmeras alternativas são examinadas na correlação de forças redesenhada no Estado.
Até ser eleito governador, João Azevêdo era tratado com respeito como um técnico qualificado, formulador ou planejador de políticas públicas de repercussão que foram implementadas nas gestões pilotadas por Ricardo Coutinho. Dava a entender que não tinha ambição maior pelo jogo político, embora seu nome tivesse sido cogitado por Ricardo para enfrentar disputas à prefeitura de João Pessoa quando o socialista foi alçado ao governo do Estado. Dizia-se que a prefeitura seria a plataforma de lançamento de Azevêdo na política estadual. Mas, por um motivo ou por outro – ora porque não estivesse “maduro” para a disputa, ora porque talvez Ricardo tivesse outros planos para ele – Azevêdo acabou debutando em grande estilo, na estação que conduzia ao Palácio da Redenção. Pelo meio do caminho que leva ao Centro Administrativo Municipal ficaram, em 2012, Estela Bezerra, e em 2016 Cida Ramos, nomes extraídos do bolso do colete por Coutinho para representar os girassóis na Capital.
Agora é João que está sendo desafiado a sair bem sucedido na prova dos noves – ou seja, transferir votos para candidatos que tenham seu apoio nas eleições municipais, principalmente em João Pessoa. O Cidadania não é considerado nenhuma “Brastemp” em termos de força política-eleitoral na Paraíba. Está ganhando impulso por ser o “partido do governador” – e porque, surpreendendo os incrédulos, “o governador” de plantão demonstrou apetite incomum para o jogo político a que parecia infenso, embora jamais hostil. Um exemplo desse apetite? Em cerca de uma semana dois deputados estaduais de oposição (Raniery Paulino, do MDB, e Eduardo Carneiro, do PRTB) foram cooptados para a base governista. A grande motivação, conforme se apurou, está no “toma lá, dá cá”, disparado pelo chefe do Executivo com vistas às eleições municipais. No desdobramento, 2022 entra no radar. Será o ano em que Azevêdo tentará a reeleição, plebiscitando o próprio governo.
A desenvoltura política do esquema governista liderado pelo sucessor de Ricardo Coutinho tem causado espécie em diferentes partidos e esquemas que estão se estruturando para ocupar espaços no pleito que o TSE adiou para novembro em virtude da situação excepcional de Saúde ocasionada pela pandemia do novo coronavírus. Na leitura dos aliados, Azevêdo passa recibo de que não está para brincadeiras na cena política e, sendo assim, convém que não seja tomado como “jejuno”, “neófito”, “inexperiente” ou qualquer outro rótulo engendrado para desmerecê-lo como estrategista, em comparação com cobras criadas que se julgam donas de maior influência e, consequentemente, consideram-se mais categorizadas para decidir a disputa em colégios de indiscutível relevância como a Capital da Paraíba. No contraponto, os adversários pagam para ver a tal “desenvoltura” de Azevêdo e seu esquema. Em princípio, trabalham com a hipótese de “puro blefe”.
O calendário eleitoral está espichando, com a pletora de prazos e ritos sob novos protocolos adaptados para os tempos de coronavírus – e, nesse caso, o governador João Azevêdo não dispõe de muito tempo para teorizar sobre fórmulas mais viáveis a serem testadas nas urnas em centros de expressão política na Paraíba. A perspectiva de poder que João oferece a dados de hoje é, aparentemente, o seu grande trunfo – pelo menos no confronto direto com Ricardo Coutinho, que cumpre a sina de líderes decaídos. Mas o governador deve estar advertido de que a cena comporta outros protagonistas, que, quem sabe, têm lá seus próprios trunfos para colocar na mesa quando o blefe for substituído pela força das evidências. Em qualquer circunstância, registre-se, o governador quer ao menos uma nesga de cacife para entrar no jogo mais pesado, em 2022.