Nonato Guedes
De volta ao cenário político paraibano como pré-candidato a prefeito de João Pessoa nas eleições deste ano, concorrendo pelo PP, o empresário Cícero Lucena foi catapultado da construção civil para o posto de candidato a vice-governador na chapa encabeçada por Ronaldo Cunha Lima, vitoriosa em 1990 pelo PMDB, derrotando Wilson Braga em segundo turno. Sua escolha para vice surpreendeu analistas da mídia mas Lucena foi uma revelação à frente do poder, demonstrando vocação como administrador e projetando-se como político. Guindado ao cargo titular com apenas 37 anos, o paraibano de São José de Piranhas, no Alto Sertão, transmitiu dinamismo e descascou abacaxis à frente do governo.
Ele foi presidente da Gepasa, Gradiente e do Sindicato das Indústrias da Construção Civil, tendo se filiado ao PMDB quando completou 18 anos e se registrou como eleitor, A partir de então, participou de todos os embates eleitorais do Estado, sempre nos bastidores. Nenhuma das campanhas desse período ficou sem sua colaboração. Em 1988, por exemplo, foi um dos principais articuladores da campanha municipal em João Pessoa, ao lado do candidato Haroldo Lucena, que fora “cristianizado” pelo governador Tarcísio Burity e sofria ataques de expoentes de proa do governo. Fiel ao partido, Cícero assumiu a administração da campanha e providenciava desde a armação dos palanques até o programa de televisão que era levado ao ar. Fazia questão de discutir cada detalhe e se inteirava, minuciosamente, dos releases que eram distribuídos com jornais, rádios e televisões. Seu entusiasmo contagiou a equipe que apoiava Haroldo e Cícero passou a ser estimulado a sair dos bastidores para figurar no palco.
Convidado por Ronaldo para ser seu vice, não teve concorrentes na convenção e engajou-se na campanha com a mesma disposição com que lutou para construir suas empresas. Era o homem da “logística”, encarregado de assegurar os meios para a campanha, mas também fazia questão de participar das atividades políticas, tendo visitado todos os municípios juntamente com o poeta Ronaldo. Conheceu vilarejos, entrou em casas de taipa, provou dos alimentos que compõem a dieta do povo, ouviu lamentações dos desassistidos pelo Estado e, depois de diagnosticar essa realidade, voltou imbuído de mais energia para lutar pela vitória. “Nunca vi tanta miséria; estou amargurado”, desabafou o peregrino de Santiago de Compostella. Concluída a jornada, foi incumbido por Ronaldo a presidir a comissão de transição formada por técnicos de alto nível como Gleryston Lucena, José Soares Nuto, Juarez Farias, Zenóbio Toscano, Fernando Catão, Lindemberg Vieira da Cunha. Na retaguarda jurídica contava com as luzes de Solon Benevides. A comissão apresentou propostas, incluindo reforma administrativa, para racionalização e enxugamento da máquina administrativa e ideias para o desenvolvimento setorial.
Cícero manteve postura discreta e equilibrada e desceu a rampa do Palácio da Redenção com 80% de aprovação. Teve papel decisivo, sempre com Ronaldo, na reabertura do Paraiban, alvo de liquidação extrajudicial decretada pelo governo de Fernando Collor de Mello. Assumiu a titularidade do governo por dez meses quando Ronaldo se desincompatibilizou para concorrer (e ganhar) uma vaga no Senado. Um dos testes difíceis de Cícero foi tomar as rédeas do governo quando do “incidente do Gulliver” em que Ronaldo atirou no ex-governador Tarcísio Burity. A aprovação alcançada ao fim do mandato foi o passaporte para, depois, eleger-se por duas vezes prefeito de João Pessoa e senador, tendo ocupado, no governo de Fernando Henrique Cardoso, a secretaria de Políticas Regionais, com status de ministério. Não teve maiores espaços no governo FHC, de resto dominado pelo “paulistério”. Mas por suas mãos passou o projeto de transposição das águas do rio São Francisco, que viraria realidade na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT.
Lucena era de diálogo mas não fugia do confronto. Na disputa de 94 inspecionava obras nos domínios da Grande João Pessoa quando foi avisado de que Lúcia Braga comandava manifestação contra o governo em frente ao Palácio, arrebanhando favelados. Ele encarou Lúcia e, de microfone em punho, lamentou que ela estivesse fazendo política “em cima da miséria alheia”. A manifestação foi esvaziada. Sobre seu estilo, definia: “Procuro governar como se estivesse na iniciativa privada, estimulando a capacidade e a competência dos que querem evoluir”. Foi do céu ao inferno após a passagem pela prefeitura pessoense diante das denúncias da “Operação Confraria” versando sobre superfaturamento de obras. Depois de muita luta, conseguiu certidão de inocência.
Na conjuntura de 2020 tem pendências no meio do caminho, por conta de processos atinentes a prestações de contas na esfera do TCU, mas é confiante na reversão e na garantia da sua elegibilidade. Ele foi peça relevante na montagem da Comissão Interpoderes, criada para tentar isonomia salarial entre Executivo, Legislativo e Judiciário. Contou com a decisiva liderança da mulher, Lauremília, para se firmar junto a camadas que habitam favelas de João Pessoa. Em 2006 candidatou-se ao Senado pelo PSDB derrotando Ney Suassuna. Em 2012, foi para o segundo turno na disputa a prefeito da Capital contra Luciano Cartaxo, que levou a melhor. Este ano, corteja, novamente, a cadeira que Luciano ocupa. Ainda tem cacife no jogo.