Nonato Guedes
A expectativa é que chegue ao fim, hoje, o impasse administrativo que se arrasta há semanas na cidade de Bayeux, na região da Grande João Pessoa, fomentado por grupos políticos que se aproveitaram do vácuo institucional de poder para protagonizar um vergonhoso espetáculo de repercussão nacional, pontuado por “chicanas”, manobras de procrastinação de decisões judiciais e investidas de perpetuação de supostos líderes que não estão à altura de responsabilidades e desafios e que somente contribuíram para mergulhar a população numa crise sem precedentes. Todo esse corolário tem se desenrolado em meio à pandemia do novo coronavírus, numa demonstração de insensibilidade e de desrespeito à população de Bayeux.
A origem do quiproquó vergonhoso foi a vacância do cargo de prefeito, decretada desde o dia 14 de julho, quando o então prefeito afastado Berg Lima, do PL, efetivou renúncia no bojo de processo de cassação de mandato instaurado no legislativo local. A atitude de Berg, conhecido da opinião pública de outros carnavais, num dos quais chegou a ficar preso após ser flagrado recebendo propina paga compulsoriamente por um comerciante de Bayeux, debaixo de ameaça de retaliação, originou a vacância do posto de titular do executivo municipal, pois o vice-prefeito da chapa geminada eleita em 2016, Luiz Antônio (PSDB), havia tido o mandato cassado em abril de 2018 pela Câmara de Vereadores. O município passou a ser governado interinamente pelo presidente da Câmara, Jefferson Kitta, do Cidadania.
Ontem, depois de muito vai e vem, dois magistrados – o desembargador Fred Coutinho e o juiz Francisco Antunes, da Quarta Vara Mista de Bayeux, determinaram a realização das eleições, que se processarão por via indireta, mediante escolha do legislativo municipal, e para o cumprimento de mandato-tampão que se estenderá até o dia 31 de dezembro próximo, uma vez que as eleições diretas para escolha de novos prefeito e vice estão asseguradas para o dia 15 de novembro, nos termos de resoluções válidas para todo o país e fixadas pelo Tribunal Superior Eleitoral. Como se sabe, o pleito originalmente traçado para outubro teve que ser remarcado para duas datas de novembro – 15 (com realização do primeiro turno) e 29 (com segundo turno) em virtude de medidas de distanciamento social tomadas por autoridades sanitárias entre as ações de enfrentamento ao coronavírus.
Na situação anormal enfrentada pelo município de Bayeux suspeita-se que grupos políticos com ambições de poder prolongaram o impasse, deliberadamente, na expectativa de tirar vantagem e beneficiar-se do comando da administração municipal numa das cidades mais importantes do mapa da Paraíba. O próprio prefeito renunciante, Berg Lima, teria cometido o gesto de caso pensado, orientado pelos seus aliados a fazê-lo como estratégia para tumultuar o quadro e ganhar proveito. Os “maquiavéis” de Bayeux, mercê dos expedientes excusos, conseguiram pelo menos o propósito de bagunçar a situação política-institucional do município. Na cidade, o tempo ficou congelado porque a moeda corrente passou a ser a inação administrativa, com ausência de atuação do poder público na execução de obras e na aplicação de investimentos, emergenciais ou não, em setores essenciais do município.
O jogo político de bastidores em Bayeux, nessa fase vergonhosa para a história do município e da Paraíba, foi tão sórdido que acabou obnubilando a própria atuação mais firme do Judiciário, em quem foram depositadas esperanças por parte da população e de figuras responsáveis quanto a um desideratum profilático que abreviasse a sarabanda patética de convocações anunciadas e invalidadas em tempo recorde ou de eleições marcadas e desmarcadas com uma sem cerimônia desprezível. Nesse ínterim, houve profusão de decisões judiciais já respaldadas por análise de mérito, convergindo para a realização do pleito indireto, para ater-se ao que dispõe lei orgânica adrede alterada para contemplar interesses pouco republicanos de facções ambiciosas e descompromissadas com o espírito público. A “ópera buffa” que se instalou em Bayeux ainda teve um último capítulo: a queda de braço entre o presidente da Câmara, Inaldo Andrade (PP) e o vice-presidente Uedson Orelha (PSL), sobre uma questão prosaica: o horário da realização das eleições indiretas. Orelha pugnava pelo feito às 10h desta quarta-feira. Andrade ganhou a parada, com a confirmação do pleito para 15h.
A verdade é que se perdeu tempo demais na discussão de filigranas, de querelas e questiúnculas que, no fundo, não constituem fator determinante relevante, traduzindo, na verdade, a pequenez de atitudes dos que se dizem representantes do povo. Teria sido cômico se não acabasse sendo ridículo o último e desesperado recurso extraído da cartola pelos “maquiavéis de fancaria” de Bayeux, ontem, acionando o Supremo Tribunal Federal para se debruçar sobre questão de suposta “alta indagação”. A Corte, em jogo rápido, denegou o ardil que encobria laivos de vigarismo político-jurídico. É deprimente essa conjuntura toda. Mas cabe à população de Bayeux tomar consciência e amor próprio, empalmar os próprios destinos que estão em jogo e dar o troco nas urnas a oportunistas que são arautos do atraso e do descalabro administrativo na cidade de Bayeux. Da mesma forma como a pandemia do coronavírus vai passar, a bagunça em Bayeux também vai passar.