Nonato Guedes
O ex-governador Antônio Mariz, cuja morte completou 25 anos, ontem, e que ainda hoje é referência no cenário político paraibano e nacional, foi insistentemente convidado pelo PMDB para ser candidato a prefeito de João Pessoa em 1988, mas recusou todas as pressões e não entrou no páreo. Numa entrevista ao extinto “Correio da Paraíba”, de meados de 88, o engenheiro Haroldo Lucena, que era secretário de Transportes e Obras do governo Tarcísio Burity, chegou a dizer que pelo menos por três vezes renunciou à candidatura em favor de Antônio Mariz. Dispôs-se a ser vice de Mariz sem problemas, mas, como ele não aceitou, não abria mão da indicação para mais ninguém.
O doutor Haroldo, irmão do senador Humberto Lucena, que também presidiu o diretório estadual do PMDB, contou nessa entrevista que retirou seu nome da disputa durante as negociações preliminares em que Mariz ainda era cogitado. Quando ficou evidente que Mariz não disputaria a prefeitura da Capital, Haroldo ganhou estímulo para lutar pela indicação. Acabou sendo confirmado, mas a luta foi inglória. Numa competição com sete candidatos, o vitorioso foi o ex-governador Wilson Braga, do PFL, que buscava reabilitação depois de ter sido derrotado ao Senado em 1986 pelo empresário Raimundo Lira. Para prefeito, Braga ganhou em primeiro turno, ficando o empresário João da Mata (PDC) em segundo, Haroldo em terceiro e, sucessivamente, nas outras posições, Carlos Bezerra, do PT, Hermano Almeida, do PTB, Antônio Augusto Arroxelas pelo PDT e Jaêmio Carneiro, pelo PV.
As eleições diretas para prefeitos de Capitais haviam sido restauradas em 1985 e, na primeira delas, o PMDB ganhou com o médico e ex-deputado federal Antônio Carneiro Arnaud, num acordo com o esquema do então governador Wilson Braga, que indicou o vereador Cabral Batista para vice. A chapa Carneiro-Cabral derrotou o então deputado Marcus Odilon Ribeiro Coutinho, que era apoiado pelo também deputado Tarcísio Burity (federal), por uma diferença de cerca de dez mil votos. Os adversários de Carneiro chegaram a qualificar o resultado como “vitória de Pirro”, diante da estrutura que reforçou a chapa por ele encabeçada, com apoio de três máquinas – federal, estadual e municipal. O Brasil vivia sob o signo da Nova República, cujo mentor principal, Tancredo Neves, morreu antes de assumir e a cadeira acabou ocupada pelo vice José Sarney, escolhido no bojo de uma composição denominada Aliança Democrática, que substituiu ao regime militar vigente por 21 anos no país.
Conquanto tivesse perdido o governo do Estado em 78 por via indireta para Tarcísio Burity e em 82, no voto direto, para Wilson Braga, Antônio Mariz tinha chances concretas na disputa pela prefeitura de João Pessoa, conforme avaliação corrente entre analistas políticos em 1988. Além de ser bem votado como deputado federal na Capital paraibana e possuir imagem positiva junto a segmentos de classe média e de elite, Mariz beneficiava-se da narrativa dos analistas de que João Pessoa era um reduto peemedebista-oposicionista. Tal avaliação ignorava que Wilson Braga começava a consolidar espaços políticos importantes na Capital, ousando enfronhar-se em setores periféricos mediante ação social de governo, com a participação ativa e carismática da sua mulher, a deputada federal Lúcia Braga.
Em 88 o PMDB precisava de Mariz para permanecer no poder (o mandato de Carneiro Arnaud estava expirando e não havia no horizonte o instituto da reeleição, que só foi introduzido uma década depois). Mariz, que havia sido prefeito da cidade de Sousa, no sertão paraibano, empalmando administração exemplar, focada na austeridade e obsessiva prestação de contas do destino dos recursos públicos, parecia talhado para representar o peemedebismo em João Pessoa e pavimentar o terreno para a conquista do governo do Estado. Mas Mariz, talvez por remanescer em 88 de embates difíceis que chegaram a traumatizá-lo politicamente, fez de tudo para não ser colocado como alternativa. Isto não o impediu, uma vez homologado o nome de Haroldo Lucena, de integrar-se à campanha. Profundamente ético, não poderia ter sido outro o comportamento de Antônio Mariz no processo que se desenrolava.
Mas nem houve transferência de votos para Haroldo em proporção suficiente para elegê-lo prefeito da Capital nem a campanha do candidato peemedebista empolgou setores do partido ou parcelas influentes do eleitorado. O próprio governador Tarcísio Burity, que tinha admiração confessada por Mariz, não encampou a candidatura de Haroldo alegando, entre outras razões, que a considerava fadada por antecipação ao insucesso. Em vão Haroldo esperou o apoio oficial, que acabou contemplando o candidato João da Mata, bafejado com o segundo lugar no páreo, mas a uma boa distância do favorito absoluto Wilson Braga.
O restante da história é bastante conhecido. Wilson Braga não esquentou cadeira na prefeitura, saltando logo em 1990 para disputar novamente o governo do Estado, quando acabou derrotado em segundo turno por Ronaldo Cunha Lima. Ascendeu à titularidade do mandato de prefeito o vice Carlos Mangueira, que não era tido como braguista ortodoxo. Mariz guardou-se para disputar o Senado em 1990, quando foi vencedor, neutralizando Marcondes Gadelha nas urnas. Quanto ao doutor Haroldo, acabou sendo vice-prefeito de João Pessoa no começo do ano 2000 na segunda gestão de Cícero Lucena, que está de volta ao páreo este ano postulando a prefeitura pelo PP, seu novo xodó partidário…