Nonato Guedes
Pelo menos junto a dirigentes e às cúpulas nacional e estadual do Partido dos Trabalhadores o prestígio do ex-governador Ricardo Coutinho (PSB), candidato a prefeito de João Pessoa, está consolidado, a despeito de acusações e insinuações que teimam em ligá-lo a um esquema criminoso responsável por desvio de recursos da Saúde e da Educação na administração do Estado. A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, confere a Ricardo um “tratamento principesco” que ele já não detém mais junto à cúpula nacional do PSB, partido no qual ingressou quando se sentiu ameaçado de expulsão das hostes petistas nos idos de 2003/2004.
O presidente estadual do PT, Jackson Macêdo, é francamente alinhado com a direção nacional e, por isso, destoa ou bate de frente com o diretório municipal de João Pessoa, presidido por Giucélia Figueiredo, que ainda ensaia resistência à interferência descabida de Ricardo e mantém o apoio à candidatura própria do deputado estadual Anísio Maia a prefeito da Capital paraibana, homologada em convenção conjunta com o PCdoB, que, por sua vez, indicou Percival Henriques como representante dos comunistas na chapa. A legitimidade dessa convenção está sendo questionada no Tribunal Regional Eleitoral pelo diretório nacional, que manifestou posição aberta pelo apoio à candidatura de Coutinho.
Os petistas defensores de Ricardo argumentam estar baseados numa resolução interna aprovada no âmbito do Partido dos Trabalhadores, prevendo poder de deliberação da direção nacional sobre candidaturas a prefeitos de Capitais envolvendo a agremiação. Esta resolução está sendo massificada agora, já que durante muito tempo o próprio ex-presidente Lula da Silva deu a público que a prioridade da legenda seria pelo lançamento de candidaturas próprias nas Capitais e grandes cidades, como estratégia para requalificar eleitoralmente o PT e prepará-lo para desafios maiores nas eleições gerais agendadas para 2022. De resto, tem sido praxe no PT o vai-e-vem de decisões ou deliberações, ao sabor das conveniências de ocasião, interpretadas pelos líderes maiores da agremiação. Isto cria uma situação difícil para a sobrevivência do próprio PT e contribui, em muitos casos, para seu isolamento. Mas as altas cúpulas do petismo pagam para ver, o que ficou evidenciado em outros pleitos históricos.
A “exegese” que se faz tanto na cúpula nacional do PT quanto na cúpula estadual é a de que a eleição municipal a ser travada a 15 de novembro representa uma continuidade do confronto com o governo do presidente Jair Bolsonaro e com as forças políticas que gravitam em torno da sua liderança, situadas à direita e ao centro. Isto equivale à constatação de que o PT priorizou a nacionalização das eleições deste ano, apesar do alcance restrito de que parecem se revestir. Por essa linha de raciocínio, as cúpulas petistas acabam nivelando, por exemplo, a eleição de São Paulo com a eleição a prefeito de João Pessoa. E, no que diz respeito à capital paraibana, apostam em Ricardo como o “líder anti-Bolsonaro”.
Com tal postura, Lula e os dirigentes nacionais e estadual do petismo atribuem irrelevância à postura de oposição a Bolsonaro que possa vir a ser empalmada pelo candidato do partido Anísio Maia, olvidando o histórico de coerência que este tem demonstrado, até aqui, em relação às ordens e diretrizes da direção do Partido dos Trabalhadores. Pelo visto não confiam em Anísio como um petista de raiz, preferindo apostar fichas em Ricardo, que se fez trânsfuga, na avaliação anterior que o PT havia feito, ao migrar para o Partido Socialista e aí tentar viabilizar candidatura a prefeito da Capital no início dos anos 2000, o que acabou se revelando um cálculo perfeito e adaptado à conjuntura da época. Nas posturas de agora, de 2020, está evidenciado o descrédito do PT quanto ao papel que possa vir a ser desempenhado pelo deputado Anísio Maia.
Uma avaliação fria e equilibrada dos fatos sugere que as cúpulas nacional e estadual petistas estão sendo injustas para com Anísio Maia e, da mesma forma, desrespeitosas para com a democracia, que foi manifestada em convenção que homologou a candidatura. Juridicamente, vale insistir, o espelho da convenção em conjunto com o PCdoB parece perfeito, incontestável, irretratável – salvo se algum fator declaradamente superveniente vir à tona no desdobramento da querela que está sendo discutida no Tribunal Regional Eleitoral, que ainda não emitiu juízo de valor sobre a controvérsia. No final das contas, o PT está patrocinando um cenário político surrealista na Paraíba e se aliando a quem já foi tido como desobediente e até mesmo algoz do partido, conforme documentos de um passado que se distancia no calendário.
O desfecho da pendenga terá que ser agilizado pela circunstância de que logo virá o Guia Eleitoral, com a reserva de tempo para partidos, candidaturas e coligações. Do PT pessoense e paraibano o PSB e Ricardo Coutinho querem apenas o tempo de televisão, a ser utilizado na defesa do ex-governador perante o rosário de acusações feito contraele. As cúpulas nacional e estadual sinalizaram que estão do lado de Ricardo, não do PT pessoense. Se a aliança consagrada em convenção for anulada, a consequência imediata será o lançamento de candidatura própria pelo PCdoB. E a incógnita, da parte do PT, quanto à sorte da candidatura e do candidato Ricardo Coutinho no processo eleitoral deste ano na Capital paraibana. Uma aposta que pode sair cara para o petismo com vistas a 2022.