Nonato Guedes
Uma reportagem detalhada do UOL Notícias revela que as eleições para prefeito nas capitais este ano assinalam um fenômeno – o isolamento do PT, imposto por outros dois dos maiores partidos de esquerda, PSB e PDT, unidos em muitos locais. Em João Pessoa, o ex-governador Ricardo Coutinho, candidato do PSB a prefeito, briga para assegurar o apoio do PT, com a simpatia da direção nacional, tendo indicado o petista Antônio Barbosa para vice. A questão foi parar na Justiça, uma vez que o diretório municipal do PT em João Pessoa, em convenção, homologou a candidatura própria do deputado estadual Anísio Maia, tendo como vice Percival Henriques, do PCdoB. Além de João Pessoa, o PT só se uniu ao PSB em Salvador. Já com o PDT, pela primeira vez, não tem aliança em nenhuma das cidades.
Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB, é taxativo: “Não houve nenhuma decisão, nenhum veto nosso de alianças. O PT se isolou e é hoje o grande responsável por toda a esquerda não estar unida nas grandes cidades”. No Recife, Marília Arraes, do PT, saiu candidata à prefeitura contra João Campos, do PSB. Siqueira garante que a candidatura do PT no Recife não foi o motivo do afastamento. “A eleição do Recife não é diferente do que o PT fez no restante do país. Não foi uma decisão por um local, isso não tem fundamento”, diz. Para ele, as falas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estimularam os partidos de esquerda a buscarem outras alianças.
Siqueira explica: “Desde que o Lula saiu da prisão anunciando que queria candidatos do PT em todas as capitais e que seria candidato em 2022, inviabilizou a unidade da esquerda. Então, nós fomos tratando de fazer outra articulação de centro-esquerda e fizemos dezenas de coligações em capitais e grandes cidades”. Para Siqueira, a situação é profundamente lamentável, “mas é compreensível pela história do PT”. E acrescenta: “Sempre repito: o PT, entre o partido e o Brasil, fica consigo mesmo. Isso ficou claro em 2018, não há novidade”. Carlos Lupi, que preside o PDT, também diz que não houve um veto do partido às alianças com petistas, mas foi aprovada uma preferência a coligações com o PSB. “Foram oito coligações nas capitais”, ressalta, admitindo a estratégia para daqui a dois anos: “É claro que a gente olha apontando para 2022. Para isso, 2020 vai ser uma plataforma importante”.
Lupi reforça a culpa dos petistas. “Foi o PT que foi se isolando. Como ele tem uma cultura hegemônica e quer sempre liderar o processo, acabou fazendo com que aliados vissem outros caminhos. O PT é assim: pode ter qualquer aliança, desde que seja ele na cabeça”. A professora da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) Luciana Santana disse ao UOL que a situação do PT acabou ficando “muito delicada”. E enfatizou: “Eu não vejo como isolamento total, mas uma estratégia de sobrevivência e de ampliação das bases. O partido está pensando em 2022 e acho que a maioria dos partidos também está”. Para Luciana, entretanto, o partido se arrisca ao afastar a possibilidade de alianças e pode pagar por isso com a perda de espaço, “porque fortalece a candidatura do Bolsonaro na reeleição em 2022”. Luciana concorda que 2020 pode ser considerado um balão de ensaio para daqui a dois anos. “A esquerda segue no rumo de não ter candidato único. Isso mostra que os partidos estão tentando se viabilizar eleitoralmente pensando 2022, construindo uma base mais ampla de forma territorial. A meu ver, a estratégia do PSB e do PDT foi acertada para buscar se fortalecerem”.
Em 2016, o PT conseguiu apenas uma vitória em capitais (Rio Branco), daí a luta renhida para recuperar parte do espaço perdido. O PT disputará isolado em 13 de 20 capitais. Nas outras seis, apoia candidatos de outros partidos. Na ótica dos líderes do PT, PSB e PDT, as rusgas na esquerda têm por trás uma disputa por espaço que envolve a manutenção de uma cidade polo e um olho em 2022. A presidente nacional petista Gleisi Hoffmann diz não enxergar um isolamento do partido em 2020 e afirma que o arco de alianças fechado é positivo. “Na maioria das capitais, estamos coligados. Temos 26 Estados. Em 14 estamos coligados nas capitais. Em 12 não estamos porque, ou não foi possível, ou era uma estratégia de outros partidos. Não há isolamento, mas conjunturas locais”, minimiza Gleisi Hoffmann. Ela diz que houve orientação do partido para que os diretórios lançassem candidatos nas maiores cidades. São 142 postulantes a 197 prefeituras onde pode haver segundo turno. E conclui: “Houve uma mudança no cenário político quanto a 2016 e seria importante ter espaços para falar do legado do PT e se defender dos ataques. Como não temos mais coligação para chapa de vereadores, essa eleição depende muito do trabalho da candidatura majoritária. Além disso, partidos do nosso arco se deram a opção de sair com muitas candidaturas por conta da cláusula de barreira”.