Nonato Guedes
O ex-deputado federal Armando Abílio, recentemente falecido, teve trajetória partidária diversificada quando da militância política na Paraíba, o que o levou a pertencer ao PDS, PFL, PMDB, PSDB e PTB. Isto decorreu, é claro, das próprias escolhas de Armando Abílio quando confrontado com situações-limite na conjuntura local em que era inescapável tomar posição. Certamente uma das mais turbulentas passagens vivenciadas por ele deu-se no final dos anos 90 quando formou ao lado dos Cunha Lima, no PMDB, no embate com o grupo do então governador José Maranhão, pelo controle do partido e do governo. Batalha que, como se viu, favoreceu a Maranhão, premiado com a reeleição ao governo em 98 e com a hegemonia absoluta no PMDB, a ponto de provocar a debandada de Ronaldo Cunha Lima, Cássio e outros políticos, como Abílio, rumo ao ninho tucano.
O cisma no PMDB paraibano teve como gota d’agua a aprovação do instituto da reeleição para cargos executivos, de presidente da República a governadores estaduais. Ronaldo estava empenhado em precipitar o lançamento do filho Cássio, que se destacara na prefeitura de Campina Grande, na Câmara Federal e na superintendência da Sudene, a governador, quando foi surpreendido pelo anúncio de Maranhão de que desejava renovar o mandato titular a que foi alçado com a morte de Antônio Mariz, de quem foi vice. A tensão cresceu com alegados atos de hostilidade praticados por Maranhão e alcançou ponto máximo no episódio de celebração do aniversário de Ronaldo no Campestre Clube, em Campina, quando o poeta dirigiu duras palavras a Maranhão. (Mais tarde, quando cobrado pelo tom agressivo que caracterizou a fala no Campestre, Ronaldo redarguiu: “O discurso do Campestre não foi agressivo. Agressiva foi a situação que o gerou”).
O fato é que, em meio a uma atmosfera claramente beligerante, que tendia a se agudizar, nunca a retroceder, Ronaldo decidiu encabeçar chapa à presidência do diretório regional do PMDB, que denominou de “Ronaldo Cunha Lima – 100% PMDB”, enquanto o grupo de Maranhão patrocinou a candidatura do engenheiro Haroldo Lucena, à frente de chapa de chapa denominada “Senador Humberto Lucena”. O vice de Ronaldo numa disputa que se prenunciava acirrada era, justamente, o deputado Armando Abílio. Os governistas fiéis a Maranhão triunfaram por 37 a 34 votos. A primeira vice-presidente era a engenheira Aracilba Rocha. Lembra o historiador José Octávio de Arruda Mello em livro intitulado “Ronaldo Cunha Lima: a trajetória de um vencedor”:
“Com o diretório estadual do PMDB hegemonizado pelos maranhistas, a convenção estadual foi convocada para 14 de junho com o objetivo de compor chapas para o pleito de 3 de outubro, envolvendo governador do Estado, vice-governador e um senador da República. Reafirmando a liderança do bloco heterodoxo, Ronaldo apresentou-se candidato ao governo do Estado, tendo como vice Armando Abílio e como candidato a Senado o deputado estadual Afrânio Bezerra. Os governistas apresentaram a formação José Maranhão-Roberto Paulino-Ney Suassuna. Travada em clima de exaltação no Esporte Clube Cabo Branco em João Pessoa, a disputa foi vencida pelos maranhistas. Em um universo de 431 eleitores, obtiveram 232 votos contra 185, três nulos e um em branco. Ronaldo Cunha Lima imediatamente protestou, alegando fraudes, dentre as quais a transferência pelo governo do Estado, desde a véspera da convenção, para hotel da cidade de Natal, de eleitores que permaneceram em espécie de confinamento sob a custódia de secretários de Estado”.
José Octávio aduziu que o “inusitado acontecimento, transmitido ao vivo pelo Jornal Nacional da TV Globo, foi denunciado da tribuna do Senado por Ronaldo, que a ele se referiu jocosamente como o “Rapto das Sabinas”. Não obstante, os recursos interpostos foram rejeitados pelo relator da executiva partidária e pelas Justiças Eleitoral e Comum”. Maranhão foi candidato à reeleição em 98 em posição de vantagem absoluta. Seu adversário foi o deputado Gilvan Freire, por uma Frente de Esquerda (PT-PV-PCdoB), que totalizou 175.234 votos contra 877.852 do reeleito governador. Em Campina Grande, todavia, a votação de Gilvan, somada aos votos brancos e nulos, ultrapassou Maranhão. Proporcionalmente, José Maranhão foi o governador mais votado do país naquele ano, tendo como vice Roberto Paulino. Cássio só foi ter sua chance de chegar ao governo do Estado em 2002, derrotando Paulino, que postulava reeleição.
Armando Abílio foi, assim, protagonista de acontecimento que marcou época na história política das últimas décadas na Paraíba. Em 2001, acompanhando o grupo Cunha Lima, Abílio desfiliou-se dos quadros do PMDB e ingressou no PSDB, que se constituía com uma ponderável costela do peemedebismo. Reeleito deputado federal em 2002, Abílio se licenciou do mandato para vir ocupar secretaria do Trabalho e Ação Social no governo de Cássio Cunha Lima. Migrou para o PTB em 2006. E o curioso é o que o PSDB tentou, de todas as formas, tomar-lhe o mandato invocando infidelidade partidária. O entendimento, porém, foi desconsiderado pelo Supremo Tribunal Federal e Abílio chegou a presidir o diretório estadual petebista na Paraíba. Um líder que comprou suas brigas quando chamado à colação.