Nonato Guedes
Uma verdadeira “overdose” de ideias e propostas tem pontuado o discurso de 14 candidatos a prefeito de João Pessoa nas eleições programadas para 15 de novembro em primeiro turno. É como se a quarentena ditada pela pandemia do novo coronavírus, com medidas de isolamento social, tivesse tido uma utilidade: a fertilidade intelectual, a abundância de teorias ou formulações sobre como alavancar a Capital paraibana de uma vez por todas. Chega a ser comovente a desenvoltura com que postulantes prometem o paraíso, da mesma forma como é extraordinária a capacidade de produção de alternativas engenhosas, a baixo custo. A impressão que se tem é que tais fórmulas milagrosas estavam em “incubadoras”, submetidas a estágios probatórios para, enfim, terem a sua viabilidade alardeada a plenos pulmões, com um verniz revolucionário poucos vezes visto na história política-administrativa pessoense.
São tantas as propostas, sugestões e indicações de solução dos graves problemas estruturais enfrentados pela população pessoense que fica difícil enumerá-las de forma ordenada para melhor compreensão dos eleitores. O bombardeio midiático incessante ganhou visibilidade quando da estreia do Guia Eleitoral, o horário gratuito reservado a candidatos, partidos e coligações. Um espaço para que os postulantes mostrem a cara e vendam o peixe no mercado das preferências políticas-eleitorais da massa votante. E é incrível como eles (candidatos) se esmeram na tarefa. Um deles, cujas habilidades técnicas eram desconhecidas do público, procura compensar a lacuna informando que “convocou” uma equipe de especialistas de alto nível, com a missão de subsidiá-lo sobre o que deve ser apresentado à população.
Há propostas para tudo – da retomada de BRTs à proliferação de escolas, unidades de saúde, creches, áreas de lazer, ambientes de sociabilidade que tornem João Pessoa uma cidade cada vez mais atraente, a par das suas belezas naturais e do riquíssimo patrimônio histórico-cultural-religioso que tem se sustentado ao longo de décadas, convivendo com as intervenções focadas na urgência dos projetos de modernização, dentro da concepção de que não é possível perder o bonde da História. De um modo geral, as metas convergem para colocar a Capital paraibana no patamar das metrópoles emergentes competitivas, que se sobressaem, justamente, pela qualidade de vida que oferecem e pelos instrumentos de locomoção e acessibilidade que estão incorporados, em definitivo, à visão “politicamente correta” do que deve ser o espírito de gestão pública.
Em meio ao cipoal de proposituras, repontam as críticas às administrações recentes, por falhas, omissões ou deslizes em pontos cardeais do rosário de decisões imperiosas para fazer João Pessoa avançar, respeitando-se as suas peculiaridades e a própria imagem consolidada de cidade aconchegante, campeã em hospitalidade. As gestões consecutivas empalmadas pelo atual prefeito Luciano Cartaxo (PV) constituem, por óbvio, o foco comum da crítica de postulantes que não contam com o seu beneplácito. Mas sobram alfinetadas, também, para quem já foi prefeito, como Cícero Lucena, do PP, ou Ricardo Coutinho, do PSB. Estes estão de volta ao páreo e contornam olimpicamente as insinuações sobre o passado, preferindo naturalmente, capitalizar “o lado bom” que possa ter sido implementado nos respectivos períodos administrativos.
O cardápio de intenções e propostas descamba para o apelativo, o folclórico ou o demagógico. O candidato Ruy Carneiro, do PSDB, por exemplo, protocolou em cartório um documento comprometendo-se a congelar por quatro anos os seus salários, os do vice-prefeito José Gadelha e os vencimentos de secretários e ocupantes de cargos de diferentes escalões. Trata-se, conforme ele, de “uma mãozinha” para contribuir com vistas à redução de despesas, inclusive de custeio da máquina administrativa municipal, com isto priorizando investimentos, via aplicação de recursos, em setores essenciais da população de João Pessoa. Um candidato se diz tão eclético e solidário que auxiliou até em trabalho de parto, com isto procurando demonstrar que estará sempre ás ordens para qualquer missão, mesmo as que não sejam inerentes ao ofício de prefeito. Ricardo Coutinho, que sempre foi incensado por ter feito gestões exitosas na prefeitura pessoense, hoje lamenta, prostrado, que a cidade tenha sido “maltratada” devido à incúria e insensibilidade dos gestores que por lá passaram. E há os mais sofisticados, que propugnam a ideia de “Cidade Inteligente” – seja lá o que isto signifique ou qual benefício traga de concreto para a comunidade.
Ainda que pareçam ridículas ou jocosas muitas das propostas que congestionam os ouvidos de eleitores, promessas de candidatos não chegam propriamente a fazer mal. A elas corresponde uma reação, que será tanto mais emblemática quanto maior for o grau de conscientização política do eleitorado pessoense. Em última análise, a pressão popular tem muita força para fazer valer a propaganda que foi alardeada nesta campanha. Na hora da onça beber água – quando, por exemplo, da discussão do preço das passagens de transportes coletivos – é que se vai testar a sinceridade dos caçadores de votos que hoje se atropelam numa das mais concorridas disputas eleitorais de João Pessoa.