Nonato Guedes
A campanha que se desenrola tendo como pano de fundo a disputa por prefeituras em João Pessoa, Campina Grande e outros 221 municípios, encobre ensaios de movimentos de alguns atores políticos que miram a cobiça pelo próprio governo da Paraíba em 2022. O atual governador João Azevêdo, com as coligações do seu partido, Cidadania, e o ex-governador Ricardo Coutinho, que força a barra para atrair o PT e sair do isolamento na corrida à prefeitura da Capital, são os protagonistas mais visíveis por razões óbvias – Azevêdo tem direito a concorrer à reeleição e teoricamente está livre da tutela do antecessor e Ricardo sonha com o tricampeonato até para dar uma resposta ao fogo cruzado que passou a enfrentar, desde que deixou o governo, no bojo da Operação Calvário.
O prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues, do PSD, que está se despedindo do segundo mandato consecutivo no Palácio do Bispo, tenta se credenciar como alternativa no esquema liderado pelo ex-senador tucano Cássio Cunha Lima, que não demonstra interesse em voltar a postular o Executivo estadual. As grandes fichas de Romero, é claro, estão sendo jogadas na disputa campinense, onde ele se aliou à senadora Daniella Ribeiro (PP) para tentar derrotar, sobretudo, o senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-Pros). Não há qualquer registro de presença do alcaide da Borborema na disputa em João Pessoa, mas isto não o impede, lá na frente, de se posicionar rumo ao Palácio da Redenção. Confiará, sobretudo, na perspectiva de uma dobradinha com o presidente Jair Bolsonaro, com quem tem canais e que é candidato à reeleição.
Da parte do prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PV), que também está concluindo o segundo mandato, por outro lado, não houve estratégia mais massiva com vistas a vincular o mapa de 2020 a prováveis pretensões políticas em 2022. Cartaxo tem um estilo meio complicado de fazer política, que muitas vezes divide mais do que agrega, e está longe de exibir o jogo de cintura ou a desenvoltura que outros expoentes do quadro político paraibano demonstram possuir. Ele opera muito em torno do “clã” familiar, o que ficou evidente em 2014 quando lançou o irmão gêmeo Lucélio ao Senado, repetindo a dose em 2018 com a candidatura ao governo. Em ambas, Lucélio não logrou êxito, ainda que tenha sido entronizado na conjuntura política local. Este ano, para a própria sucessão, Luciano optou por lançar uma concunhada, a ex-secretária de Educação, Edilma Freire, para dar continuidade ao projeto de oito anos. A candidata não avançou substancialmente nos dígitos, mas o esquema de Cartaxo sonha com milagres ou reviravoltas, pelo que dá a entender.
Para quebrar o isolamento das coligações partidárias, o alcaide pessoense acabou se aliando a outro “clã” familiar – o dos Feliciano, com raízes a partir de Campina Grande, que tem como figura central a vice=-governadora Lígia, secundada pelo marido, o deputado federal Damião Feliciano, também presidente estadual do PDT. Alguns analistas avaliam que o “clã” pedetista se aliou a Cartaxo como estratégia para descolar a vice-governadora da imagem do governador João Azevêdo, conferindo autonomia ao núcleo campinense nos embates futuros. Por esse raciocínio, Lígia estaria se preparando para uma candidatura ao governo contra o próprio João Azevêdo, o que, naturalmente, não é admitido por ninguém.
Uma eventual projeção de Lígia deslocaria o “clã” Cartaxo – Luciano ou Lucélio para posição coadjuvante no cenário estadual, envolvendo, principalmente, o governo. A dificuldade de encaixar essa equação é que Luciano já foi vice, na chapa de José Maranhão, e com ele investiu-se no governo em fevereiro de 2009 quando a Justiça decretou a cassação do restante do mandato de Cássio Cunha Lima. Voltar a ser vice pode não estar nos planos de Luciano, mas, seguramente, não deverá constar mais do projeto de Lígia, que ascendeu por duas vezes ao cargo, em circunstâncias naturalmente distintas, e tem logrado sobreviver às turbulências da difícil harmonia entre contrários que se tornam aliados por interesse estratégico. Uma terceira hipótese que não deixa de ser cogitada é a de ficar restrita a 2020 a aliança entre PV e PDT, sem desdobramentos de maior alcance em 2022. Já houve precedentes, com o antigo PMDB e o antigo PFL, partidos que foram sucedidos respectivamente pelo MDB e pelo DEM. Em política não há regra escrita sobre pactos definitivos entre agrupamentos ou lideranças. Tudo é muito dinâmico – e, particularmente, na Paraíba, o dinamismo é mais intenso, como observou um outrora “expert” do jogo local, o ex-deputado Manoel Alceu Gaudêncio.
De concreto, sabe-se, desde o começo da campanha eleitoral atípica deste ano, que o governador João Azevêdo aposta alto num projeto político próprio que se tornou viável com o seu rompimento com o antecessor Ricardo Coutinho. Esse projeto ganhará aparência mais definida com o balanço das urnas de 2020 e com o tamanho da força que o Cidadania exibirá, ora em faixa própria, ora com candidatos a prefeito “emprestados” de outras siglas. As demais forças irão se mover na esteira desse desempenho de Azevêdo. Afinal, a atração maior, cobiçada, é mesmo o governo do Estado, não apenas prefeituras de cidades importantes que estão em jogo este ano.