Nonato Guedes
Os números da apuração do primeiro turno das eleições para prefeito de João Pessoa, ontem, causaram tensão devido ao embolamento de posições, projetando candidatos distintos, na corrida pelo segundo lugar, já que o ex-senador Cícero Lucena, candidato do PP, sustentou a liderança do páreo. Candidatos como o deputado Ruy Carneiro (PSDB), o deputado Wallber Virgolino (Patriota) e a ex-secretária de Educação municipal Edilma Freire (PV) chegaram a se revezar, para mais ou para menos, nessa maratona, até que no final das contas manteve-se a escrita que vinha sendo apontada pelas pesquisas do Ibope: o segundo turno será mesmo entre Cícero Lucena e o radialista Nilvan Ferreira, do MDB, que conquistou a vaga por décimos.
Cícero concorreu com o apoio do governador João Azevêdo (Cidadania), que fez sua estreia no comando da agremiação no Estado, na qual ingressou depois que deixou o PSB e rompeu com o ex-governador Ricardo Coutinho. Nilvan Ferreira, por um triz, não foi desalojado do segundo lugar por Ruy Carneiro, que ao final somou 16,37%, num crescimento espetacular que já vinha se desenhando nas proximidades da eleição e que foi atribuído à linguagem agressiva, contundente, empregada por Ruy, tanto contra Cícero Lucena, seu antigo aliado, como contra Ricardo Coutinho (PSB), despachado para uma humilhante sexta colocação no páreo. A radiografia da disputa na Capital paraibana assinala o isolamento da esquerda, que não logrou avançar na corrida, com o fortalecimento da direita e de forças de centro.
O confronto no segundo turno não será propriamente ideológico, já que há convergência de ideias entre Cícero Lucena e Nilvan Ferreira – este, numa linha mais identificada com o bolsonarismo, perfil reforçado com a escolha de um militar do Exército, o major Milanez, para seu vice. O embate tende a se dar entre quem tem experiência e quem não tem experiência para administrar os complexos desafios de uma cidade como João Pessoa, sobretudo no chamado pós-pandemia (alusão ao surto de coronavírus que grassa no mundo). Nesse quesito, o da experiência, Cícero leva vantagem indiscutível. Foi prefeito duas vezes da Capital paraibana, governador do Estado por dez meses, secretário de Políticas Regionais, com status de ministro, do governo federal. Além do mais, é empresário oriundo da construção civil e dialoga bem com representantes da classe empresarial, para cujas demandas tem sensibilidade, da mesma forma como tem boa penetração nas camadas mais humildes da população.
Cícero deverá agitar com mais ênfase neste segundo turno a facilidade de parceria com o governo do Estado, pela condição óbvia de ser o candidato apoiado pelo governador João Azevêdo. Para a população de João Pessoa, essa questão da parceria é preocupante, em virtude dos exemplos negativos ou de difícil relacionamento entre prefeitura e governo do Estado, como se deu da parte do governo Ricardo Coutinho com a própria gestão de Luciano Cartaxo, penalizada em pleitos e ações conjuntas que poderiam viabilizar investimentos de monta na Capital. Respaldado pelo senador José Maranhão, Nilvan terá que se desdobrar para lastrear uma possível gestão, principalmente junto a escalões federais. Cabe a pergunta sobre se o presidente Jair Bolsonaro se aventurará a participar da eleição em segundo turno em João Pessoa. No primeiro turno, quem mais procurou se associar ao capitão foi o deputado Wallber Virgolino, do Patriota.
Se ficar restrita à “província” a disputa do segundo turno em João Pessoa, haverá espaço para uma maior desenvoltura do governador João Azevêdo em prol da candidatura de Cícero Lucena. Isto implica não apenas no reforço colateral da logística da campanha de Lucena como na definição de políticas conjuntas Estado-Município para a partir do próximo ano. Haverá uma briga surda entre Cícero e Nilvan para atrair apoios expressivos do empresariado ou de segmentos produtivos do Estado. E uma grande incógnita: qual será a posição de candidatos como Ruy Carneiro (que atacou Cícero e Nilvan), Edilma Freire, Wallber Virgolino, Raoni Mendes, etc? A esquerda, aparentemente, ficou sem fichas nessa parada, podendo perfeitamente cruzar os braços e assistir tudo de camarote. Mas em política a dinâmica é surpreendente e composições inesperadas poderão emergir dependendo do avanço dos entendimentos que se processarão nos bastidores.
Sobre outros pontos da disputa na Capital: havia a impressão, na undécima hora do pleito, de que o candidato Nilvan Ferreira já tinha ido longe demais no seu projeto político e que poderia despencar de forma vertiginosa. Houve oscilações, mas não foi o cenário pessimista que predominou. É de se registrar a reação do esquema do prefeito Luciano Cartaxo (PV) nos últimos dias de campanha da candidata Edilma Freire. Se a mobilização tivesse sido empreendida com mais alguns dias de antecedência, a ex-secretária poderia figurar no segundo turno que será travado no dia 29. Por último: foi indiscutível o mérito do deputado federal Ruy Carneiro, que voltou a ser candidato 16 anos depois de uma derrota à prefeitura da Capital, começou desacreditado e por pouco mão chegou ao segundo turno contra Cícero Lucena. A questão é saber se Ruy vai liberar seus eleitores para votarem em quem quiserem, ou se vai arriscar fichas junto a um dos dois candidatos que ele combateu com veemência na primeira rodada eleitoral. Não é nada, não é nada, mas Ruy pode vir a ser o fiel da balança no jogo.