Nonato Guedes
Foi surpreendente o desempenho do radialista Nilvan Ferreira, natural de Cajazeiras, no processo eleitoral de 2020 para a prefeitura de João Pessoa, com sua passagem para o segundo turno, desbancando ex-governadores como Ricardo Coutinho, deputados como Ruy Carneiro e candidata carimbada do oficialismo municipal, Edilma Freire. Nilvan esbarrou no paredão de votos conquistado por Cícero Lucena (PP),que assumirá a prefeitura em janeiro pela terceira vez, depois de ter sido vice-governador, governador do Estado, senador e secretário de Políticas Regionais com status de ministro no governo Fernando Henrique Cardoso. Ainda assim, foi estreita a diferença registrada entre o vitorioso Cícero Lucena, que invocou a experiência em momentos de crise como grande trunfo na campanha, e o neófito Nilvan Ferreira, que nem tinha trajetória em João Pessoa nem militância política mais efetiva no currículo.
O radialista cajazeirense saiu do pleito em segundo turno com um trunfo valioso, um cacife que em princípio é cortejado por lideranças políticas em geral: a votação expressiva alcançada que, em certos momentos da apuração, pareceu ameaçar a solidez do favoritismo de Cícero Lucena, que vinha sendo detectado por institutos de pesquisa, a exemplo do Ibope. O comunicador ingressou no páreo tencionando ser um “outsider” e, por outro lado, buscando demonstrar identidade com o presidente Jair Bolsonaro, por quem nutre admiração e com quem se afina em muitas das ideias e propostas. O suposto antipolítico tinha a forrar sua candidatura, além do prestígio da legenda, a própria imagem como homem de rádio, mais afeito à desenvoltura no confronto direto com telespectadores e eleitores virtuais.
Acabou sendo, pelo conjunto de fatores, o fenômeno na pulverizada competição eleitoral de 2020 em João Pessoa que despertou interesses e pretensões de pelo menos quatorze postulantes. Com um discurso propositadamente vago, mas recheado de apelos populistas focados no que seria uma “missão” – a de cuidar das camadas mais pobres de João Pessoa e fazer a Capital da Paraíba retomar o processo de desenvolvimento, com geração de emprego e renda, Nilvan apostou todas as fichas na capacidade de se comunicar melhor e numa presumível postura independente em relação a grupos políticos tradicionais, não obstante tenha aceito adesões de última hora do grupo Cunha Lima, de Campina Grande, e tivesse sido patrocinado, desde o primeiro momento, pelo senador José Maranhão (MDB), que atualmente se recupera da contaminação por Covid-19 num hospital em São Paulo. Ferreira não descuidou da apresentação de propostas, por mais discutíveis que fossem do ponto de vista da exequibilidade. Tornara-se conhecedor do caráter exigente do eleitorado de João Pessoa, especialista em protagonizar reviravoltas nas eleições de âmbito municipal.
Para o senador José Maranhão, a candidatura de Nilvan Ferreira a prefeito de João Pessoa soou como um “achado providencial”, uma espécie de presente dos Céus. O MDB vinha percorrendo história de declínio no cenário político estadual, onde pontificou em posição de destaque nas últimas três décadas. A agremiação enfrentou defecções em redutos estratégicos, perdendo quadros valiosos que se sentiam desmotivados com o enfraquecimento visível da legenda. Em João Pessoa mesmo, com exceção de 2021, quando o próprio Maranhão foi candidato próprio a prefeito, a posição do partido era secundária, de “coadjuvante”, geralmente fornecendo vices para candidatos competitivos a prefeito como Ricardo Coutinho e Luciano Cartaxo. Os vices indicados por Maranhão amargaram o ostracismo, o desprestígio e o isolamento na tomada de decisões executivas na Capital paraibana.
Maranhão não é só o líder maior do MDB paraibano – é o dono da agremiação partidária. Nenhuma decisão sobre candidaturas próprias ou alianças, sobretudo em redutos ou colégios eleitorais relevantes como João Pessoa, é tomada sem a anuência do senador ou até mesmo sem a sua articulação direta, na formulação de estratégia que considere a mais interessante para o projeto de expansão da sigla, com retomada de espaços em outros colégios eleitorais influentes, como base para reforçar eventual participação em disputas eleitorais estaduais. Não houve tempo, este ano, por exemplo, para o MDB plantar-se taticamente de forma mais decisiva em Campina Grande, onde, de resto, a fatura foi liquidada pelo esquema do prefeito Romero Rodrigues (PSD) em primeiro turno. Romero, diga-se, veio a João Pessoa no segundo turno “apoiar” Nilvan – um gesto meramente simbólico, já que não tem maior liderança política na Capital.
Quanto a Nilvan, as versões são de que foi definitivamente picado pela mosca azul da política. De imediato, além de avaliar os próximos passos a serem dados, vai aguardar o restabelecimento da saúde do senador José Maranhão para com ele discutir seu próprio papel no fortalecimento do MDB, não apenas na Capital mas em todo o Estado. Dependendo das suas motivações pessoais, que precisam ser levadas em conta, Nilvan tem consciência de que fez história na política pessoense-paraibana. A dúvida é sobre se o fenômeno ainda tem sobrevida para 2022, a disputa de maior dimensão em todo o país, ou se tudo não terá passado de uma “onda” na conjuntura atípica deste ano. A conferir!