Nonato Guedes
Através da deputada estadual Estela Bezerra o PSB fez uma investida para tentar liderar a oposição à administração do prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena (PP), empossada há apenas três dias, e se deu mal. Atribuiu-se a Estela uma orquestração nas redes sociais acusando o gestor de ter extinto a Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, o que demonstraria a sua falta de compromisso com um contingente expressivo da população paraibana. Era “fake news” e foi derrubada de imediato com o anúncio dos nomes de mais duas mulheres para compor o quadro de auxiliares da administração municipal: a jornalista Nena Martins para a própria secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres e a ex-vereadora Raíssa Lacerda para a secretaria executiva de Cidadania e Direitos Humanos.
No episódio, além da precipitação cometida por expoentes do grupo do ex-governador Ricardo Coutinho, derivada da mistura de má-fé com desinformação, evidenciou-se um aspecto: o PSB não mostra cacife para assumir papel relevante no campo da oposição ao governo de Lucena. Além da decepcionante performance do ex-candidato a prefeito Ricardo Coutinho na última campanha eleitoral, o agrupamento dos “girassóis” é incapaz de aglutinar forças de esquerda em torno de um projeto de suposta “resistência” ao poder instaurado com o fim das duas gestões empalmadas por Luciano Cartaxo (PV). O próprio Ricardo sumiu do noticiário no pós-eleitoral, certamente em virtude das preocupações mais urgentes com demandas judiciais decorrentes do seu envolvimento em processos da Operação Calvário, que apura desvios de recursos na Saúde e na Educação do Estado. O seu grande “feito” na campanha foi o de infernizar a vida de petistas locais, que tinham candidato próprio – o deputado Anísio Maia, vítima de golpes rasteiros articulados por Coutinho em conluio com o ex-presidente Lula da Silva, que se prestou a deprimente papel antidemocrático no pleito paraibano.
Diga-se, a título de reconstituição, que nas gestões anteriores de Cícero como prefeito da Capital, entre 1996 e 2004, Ricardo se apresentou ao público como o “grande carrasco” de Lucena, denunciando-o por supostas irregularidades que acabaram custando ao alcaide envolvimento na famosa Operação Confraria. Cícero dedicou-se até o último dia do exercício do mandato de senador a desmontar acusações assacadas contra ele em esferas da Justiça e acabou obtendo um atestado de absolvição por parte de colegiados respeitáveis. Coutinho fez da orquestração contra Cícero o cavalo de batalha da sua campanha para suceder a ele na prefeitura de João Pessoa, logrando o intento em duas eleições consecutivas – a de 2004 e a de 2008, saltando em 2010 para a disputa ao governo do Estado, como coroamento do projeto de poder que havia arquitetado, bem ao seu estilo personalista. Mal concluiu dois mandatos no governo estadual, já se viu frente à frente com os homens da Lei, por escândalos gravíssimos cuja repercussão ainda está sendo mensurada em meio a investigações que estão tendo prosseguimento.
Liberado pela Justiça para se candidatar a prefeito no ano passado, Ricardo Coutinho foi extremamente descortês para com o eleitorado pessoense, em nenhum momento oferecendo explicações concretas ou respostas irrefutáveis para os escândalos de corrupção e desvio de recursos públicos na Era que comandou no Estado. Preferiu recorrer, como é comum em casos da tipologia, à narrativa da “vitimização”, considerando-se perseguido político, na linha adotada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O resultado da encenação de Ricardo veio nas urnas com a decepcionante votação por ele alcançada. Seus partidários apostavam que ele estaria no segundo turno, uma avaliação que desdenhava da inteligência e do discernimento da maioria dos eleitores de João Pessoa. Em vez de Coutinho, deu-se a reabilitação de Cícero, obstinado em fazer o melhor dos seus governos, como tem repetido.
Em tese, pelo que traduziu o mapa das eleições realizadas em 15 e 29 de novembro (dois turnos) na Capital paraibana, o mais credenciado a liderar a oposição a Cícero Lucena seria o MDB, que, com a candidatura do radialista Nilvan Ferreira, logrou avançar para o segundo turno, protagonizando uma disputa dramática com o vencedor. Ocorre que, além de ser um partido esfacelado na Paraíba, o MDB acabou, lamentavelmente, entrando na UTI de um hospital particular de São Paulo, com a internação do senador e ex-governador José Maranhão, acometido pelo novo coronavírus. Maranhão é o grande comandante da legenda, figura respeitada no cenário local e na conjuntura nacional, e se recupera das complicações da covid-19. Foi ele o mentor da candidatura de Nilvan, uma aposta na imagem do “outsider” da política e na expectativa de renovação por parte de segmentos expressivos do eleitorado. A ele cabe dar as coordenadas da posição em relação a uma gestão titulada por um político experiente e testado na adversidade da militância política.
Além do MDB-Nilvan, sobressai com credenciais legítimas para atuar no campo da oposição em João Pessoa o deputado federal Ruy Carneiro, do PSDB, que teve a sua melhor performance como candidato a prefeito dezesseis anos depois de ter sido derrotado, ficando no terceiro lugar, a menos de mil votos de ir para o segundo turno no embate contra Cícero Lucena, de quem foi auxiliar em gestões passadas. Ruy representa um projeto solitário – na própria campanha, fez-se gigante para a travessia eleitoral e surpreendeu com o desempenho. Além disso, abstraindo algumas idiossincrasias, tem espaço de articulação política indiscutivelmente superior ao de Nilvan Ferreira. Sobre Ricardo Coutinho, cabe dizer que continua sem fichas, até concluir-se o calvário judicial a que está submetido, como quem passa por um fogo cruzado intenso.