Nonato Guedes
Uma declaração polêmica, mas sincera, partiu do novo prefeito de Campina Grande, Bruno Cunha Lima (PSD), em entrevista, ontem, à FM 98, do Sistema Correio de Comunicação: a de que, há uma década, aquela cidade, um dos mais importantes polos econômicos do Nordeste, é discriminada pelo governo do Estado. A afirmação surpreendeu pelo fato de que esse período abrange gestões empalmadas por Ricardo Coutinho (PSB), com quem o ex-senador Cássio Cunha Lima, expoente do grupo que Bruno integra, esteve aliado. Essa aliança foi mais nítida em 2010, quando Ricardo concorreu ao Palácio da Redenção e Cássio a ele se juntou a pretexto de derrotar o líder José Maranhão. Em 2014, Cássio e Ricardo já se enfrentavam ao governo. Coutinho foi reeleito mas ainda hoje Cunha Lima contesta a legitimidade do resultado, tendo surgido sinais da Justiça comprovando as denúncias de abuso de poder então formuladas.
Passando ao largo da história das alianças políticas, Bruno Cunha Lima apontou como exemplo para fundamentar a sua assertiva a não celebração de nenhum convênio entre o governo do Estado e a prefeitura da cidade Rainha da Borborema há dez anos, a despeito da relevância estratégica de Campina Grande e do seu pioneirismo empreendedor. Essa década abarcou praticamente os dois mandatos (oito anos, ao todo) enfeixados pelo prefeito Romero Rodrigues, presidente estadual do PSD. Na opinião do atual prefeito, que está há 14 dias no cargo, foi uma penalização injustificada sob todos os pontos de vista e que só não paralisou concretamente a cidade porque, lá, a iniciativa privada é muito forte e não faltaram investimentos pontuais de representnates do setor produtivo, com perspectiva de geração de emprego e renda. A discriminação, conforme ele, ocorreu a despeito de continuar vigorando no país um modelo injusto de distribuição do bolo tributário, que afeta municípios e Estados dependentes da Federação.
Ex-deputado estadual e ex-vereador, vencedor das eleições de 2020 em primeiro turno com o apoio decidido do prefeito Romero Rodrigues, Bruno Cunha Lima tocou em assuntos polêmicos para deixar claro que, apesar de divergir do governo João Azevêdo (Cidadania) não hesitará em cobrar dele investimentos em obras e equacionamento de demandas que, conforme sua análise, ficaram pendentes por falta de uma relação institucional mais republicana. Já houve uma audiência formal do governador, em Palácio, na Capital, ao prefeito de Campina Grande, mas o encaminhamento de soluções para pleitos formulados parece difícil, a julgar pela manifestação do sucessor de Romero no Palácio do Bispo. Um tratamento melhor teria sido dado, pelo seu relato, pelo governo Jair Bolsonaro. Bruno Cunha Lima esteve diretamente com o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, a quem entregou o primeiro protocolo de um município brasileiro para preparação à vacinação contra Covid que deve ser iniciada ainda este mês.
Na verdade, a audiência entre o governador João Azevêdo e o prefeito Bruno Cunha Lima deu prioridade à discussão sobre ações conjuntas para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus, que vão se tornando mais urgentes à medida que avançam os preparativos que culminarão com a deflagração do plano nacional de imunização, começando por Manaus, capital do Amazonas. Bruno avalia que, em relação à contaminação pelo coronavírus, Campina Grande mantém-se numa situação estável graças à eficácia de ações conduzidas pela administração de Romero Rodrigues e assume o compromisso de dar continuidade à celeridade, contando com o suporte do governo federal. Mas o governo do Estado – foi o que ele deixou entrever – ainda vai ter que se envolver mais de perto nas soluções de interesse da população campinense, gerando obras e serviços que impulsionem a retomada da atividade econômica local.
Na entrevista que concedeu à emissora, Bruno Cunha Lima não se furtou a comentar questões políticas agitadas por jornalistas-entrevistadores sobre o cenário eleitoral de 2022, quando estará em jogo o próprio governo estadual. Confirmou que dentro do grupo que integra há duas pré-candidaturas ensaiadas à sucessão de João Azevêdo, quais sejam as do ex-prefeito Romero Rodrigues e a do deputado federal Pedro Cunha Lima, do PSDB, filho do ex-senador Cássio. Bruno não vê mal nenhum no surgimento de mais de uma opção, opinando que, pelo contrário, pode facilitar o debate e dar clareza à opção apropriada para expressar o sentimento da maioria do eleitorado. Desse ponto de vista, recomenda que haja maturidade, por parte da oposição ao governo de Azevêdo, para definir um nome identificado com a voz rouca das ruas. Essa maturidade implica em unidade uma vez feita a escolha, o que teria ocorrido, lembrou, no processo de 2020 no esquema a que pertence, quando ele “disputou” a indicação com o deputado estadual Tovar Correia Lima e acabou sendo ungido.
A preferência de Bruno Cunha Lima, entre Romero Rodrigues e Pedro Cunha Lima? Na entrevista, ele foi hábil o bastante para não antecipá-la, embora tenha parecido que se traiu ao carregar nos elogios a Romero, certamente em função dos dois mandatos que empalmou e do legado que deixou e que, na sua avaliação, foi proveitoso para a cidade. Mas foi polido em reconhecer “qualidades de renovação” no perfil do deputado Pedro Cunha Lima, fixando-se, então, na tese da unidade que pode ser conseguida mediante realização, no tempo oportuno, de pesquisas qualitativas e quantitativas sobre intenção de votos em nomes apresentados ao eleitorado. Tudo o que Bruno deseja é fazer sua parte, credenciando-se como administrador. E é por isso que não dará trégua à administração estadual. Cobrará aquilo que julga que é direito da população de Campina Grande. Uma “deixa” que, no mínimo, reclamará reflexão da parte do governo Azevêdo.