Nonato Guedes
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que está se despedindo do cargo, criticou duramente o presidente Jair Bolsonaro por ter manifestado intenção de influenciar na escolha do novo dirigente da Casa. Para Maia, Bolsonaro quer fazer do Parlamento “um anexo do Palácio do Planalto” e o governo está usando as eleições para formar uma maioria na base de pressões, ameaças, cargos e emendas. De acordo com ele, as promessas feitas a deputados em troca de apoio a Arthur Lira (PP-AL) não poderão ser cumpridas, pois não há espaço fiscal no Orçamento.
– É um alerta aos deputados e deputadas. A intenção do presidente é transformar o Parlamento em um anexo do Palácio do Planalto, o que enfraquece o mandato de cada deputado e deputada e, principalmente, o protagonismo da Câmara dos Deputados nos debates com a sociedade – comentou o ainda dirigente da instituição. A declaração de Bolsonaro sobre o pleito na Câmara foi feita em café da manhã com deputados do PSL no Palácio da Alvorada em Brasília. “Vamos, se Deus quiser, participar e influir na presidência da Câmara com esses parlamentares (do PSL)”, destacou, argumentando que espera, com isso, construir “um relacionamento pacífico e produtivo para o Brasil”. Bolsonaro, que continua sem partido, já foi do PSL e concorreu, por ele, à presidência da República nas eleições de 2018.
Rodrigo Maia interpretou a frase do presidente como a prova de que a Câmara precisa de um candidato que dialogue e atue com independência. “Que tenha equilíbrio como o Baleia Rossi 9MDB-SP), que não seja de oposição ao governo, o que Baleia não é, mas que entenda que o Parlamento é um outro poder”, disse. Rodrigo Maia advertiu que a formação de maioria no Congresso não pode se dar da maneira como o governo está fazendo. “Uma coisa é formação de uma base, e com essa base você governa com os partidos que a integram. Outra coisa é você ser minoritário na Casa, como é o governo, e tentar formar uma maioria na base da pressão, na base da ameaça, na base de troca de emendas”, acrescentou. De acordo com o presidente da Câmara, o governo já teria se comprometido com o pagamento de emendas fora do Orçamento no valor de R$ 20 bilhões, mesmo sem espaço fiscal para tanto.
– Eu quero saber em que orçamento para o ano de 2021, com todo o problema do teto de gastos, se eles poderão cumprir, se vitoriosos, essa promessa. Cada dia que passa você vê, as pessoas vão vendo, que vão acabar sendo enganadas nesse toma lá dá cá. Vai ser um problema grave se por acaso eles vencerem a eleição. R$ 20 bilhões extraorçamentários é uma promessa que o governo e seu candidato não têm nenhuma condição de cumprir”, salientou. Maia colocou em dúvida a disposição dos parlamentares em aceitarem o “toma lá dá cá”. Explicou que as promessas “são uma peça de ficção” e que, para cumpri-las, o governo teria que fazer cortes de R$ 60 bilhões. Rodrigo concluiu afirmando: “O Parlamento sempre está disposto a participar do governo, a liberar os seus recursos para as suas bases, mas por aqueles que têm compromisso com programa e projetos do governo. Da forma como ele quer formar maioria aqui, eu acho que não vai dar certo. Vencendo ou perdendo, não vai dar certo”.
Na opinião do presidente da Câmara, a intervenção do Planalto vai deixar sequelas para os lados envolvidos na disputa. A disputa pela sucessão de Rodrigo Maia, agora, no início de fevereiro, está polarizada entre os deputados Arthur Lira, do PP-AL, apoiado por governistas ligados a Bolsonaro, e Baleia Rossi, do MDB-SP, que foi encampado por parlamentares de oposição e de esquerda e conta com simpatias dentro do próprio Partido dos Trabalhadores. Os dois postulantes têm sido pressionados a assumir compromisso mais enfático com o andamento do processo de impeachment do presidente Jair Bolsonaro sob alegados crimes de responsabilidade cometidos no exercício do cargo. O presidente Bolsonaro voltou a desdenhar, ontem, de manobras pelo impeachment, reiterando confiança em que o movimento não surtirá efeito.