Nonato Guedes
O economista paraibano Maílson da Nóbrega, que foi ministro da Fazenda no governo José Sarney, protesta, em seu blog na revista “Veja”, contra as pressões de Estados e municípios sobre a União pela destinação de mais recursos, advertindo que se trata de “um processo suicida” que tem graves reflexos na economia. Pondera, também, que a União não dispõe de recursos ilimitados em condições de atender a pleitos ou demandas de unidades satélites. Maílson conta que em países com desigualdades regionais de renda a repartição de receitas entre esferas de governo permite suprir as regiões menos desenvolvidas do mínimo de recursos para exercer suas funções e aproximá-las da situação.
– Aqui, o processo iniciou-se na Constituição de 1946, que criou o Fundo de Participação dos Municípios. A Constituição de 1967 estendeu a medida aos Estados e ao Distrito Federal. A partir dos anos 1970 começaram as pressões para expandir as transferências. Em 1975, os dois fundos – o dos municípios e o dos Estados e DF – eram abastecidos por 10% da arrecadação do Imposto de Renda e do IPI, metade para cada um. Em 1976, no governo de Ernesto Geisel, o percentual foi elevado para 18%, com a mesma proporção, acrescentando-se 2% para um fundo especial em favor das mesmas unidades da Federação – historiou Maílson da Nóbrega.
E prosseguiu: “Nos estertores do regime militar, os governos subnacionais conseguiram elevar a participação para 24% (1980), e 30% (1983). No segundo caso, criou-se uma diferença: 14% para os Estados e o DF e 16% para os municípios. Na Constituição de 1988, a participação saltou para 44%, sendo 21,5% para os Estados e 22,5% para os municípios. Também foram instituídos fundos de desenvolvimento regional com 3% da mesma base. Nos anos de 2007 e 2014, os municípios obtiveram novo aumento, para 24,5%. Em menos de quarenta anos, pois, as transferências quase quintuplicaram, de 10% para 49% da arrecadação daqueles impostos. Recentemente, o Senado aprovou nova elevação de 1 ponto porcentual, em favor dos municípios. Agora, pressiona-se a Câmara e o Senado para seguir o caminho”.
Maílson, cujo artigo intitula-se “Marcha da Insensatez”, diz que as justificativas para as transferências são as de que o cidadão mora no município e o fim do pires na mão de prefeitos e governadores à cata de recursos. “Nada disso – adverte -. À União cabem responsabilidades maiores em justiça, defesa, previdência, educação, saúde, infraestrutura, programas sociais de cunho nacional, que consomem mais de 90% de seus recursos disponíveis. A romaria a Brasília não acabou. Com o FPM engordado, multiplicaram-se os municípios, muitos sem escala para ofertar serviços públicos. Para o economista Marcos Mendes, os recursos acabaram financiando despesas de pessoal. Em 11% dos municípios o gasto com funções administrativa e legislativa é maior do que com a saúde; em 7%, supera o da educação.
E arremata o ex-ministro: “Essa marcha da insensatez contribuiu para a piora da qualidade das finanças públicas. Com as perdas no IR e no IPI, e dado o aumento de gastos determinado pela Constituição de 1988, a União foi obrigada a criar ou elevar tributos não partilháveis – as contribuições – que hoje representam mais de 40% da arrecadação e bagunçaram o sistema tributário. A excessiva repartição de receitas deteriorou a alocação de recursos na economia, limitando os ganhos de produtividade e o potencial de crescimento do país. É preciso dar um basta nesse processo suicida”.