Nonato Guedes
Coincidência das coincidências, no Dia do Rádio, que foi celebrado ontem, partiu vítima da Covid-19 Otinaldo Lourenço de Arruda Mello, que se tornou legenda da radiofonia paraibana no comando de programas de repercussão como Mandando Brasa e Antena Política, na Rádio Arapuan. Pernambucano de Surubim, advogado trabalhista e professor da Universidade Federal da Paraíba, Otinaldo formou gerações de profissionais de imprensa, foi diretor de veículos de imprensa, teve passagens por jornais impressos como “O Momento” e pela TV Cabo Branco, onde era entrevistador. Dividi bancada com ele no “Bom dia, Paraíba”, da afiliada da Rede Globo, e pude não apenas aprender mas ter o privilégio de conviver com uma figura fascinante, dono de uma verve brilhante e de vasta cultura.
Entre os anos de 1950 a 1970, Otinaldo Lourenço, irmão do historiador José Octávio de Arruda Mello, revolucionou o rádio, quebrando a pasmaceira reinante e irradiando a repercussão do seu trabalho por todo o Estado e Estados vizinhos. Faleceu com 86 anos de idade e, na nota de pesar, o Sindicato de Jornalistas Profissionais da Paraíba acentua que ele conseguiu unir qualidade e popularidade na sua militância radiofônica. Responsável pela modernização da Arapuan, imprimiu na grade de programação da emissora um estilo inspirado no modus operandi da BBC de Londres, conciliado com o gosto popular. Faleceu no Hospital Memorial São Francisco, onde duelava contra a insidiosa doença que tem ceifado vidas pelo mundo afora. Era casado com Yone Lacet, com quem viveu belíssima história de amor, e tinha um casal de filhos. Autoridades, políticos, profissionais de classe, expoentes de entidades da sociedade manifestaram pesar pela sua morte e reconhecimento aos valiosos serviços prestados.
Otinaldo notabilizou-se, também, por ser, assumidamente, um Monarquista, forma de governo que exaltou em artigos nas páginas de jornais e em comentários em outros meios de comunicação. Chegou a discutir com o então senador Fernando Henrique Cardoso, nos microfones da TV Cabo Branco, a respeito do tema, quando ele esteve em João Pessoa para defender o Parlamentarismo (sem Monarquia) no plebiscito que se realizou no país após a ditadura militar e que acabou consagrando mesmo o presidencialismo como regime. Quando cheguei em João Pessoa, em junho de 1978, procedente de Cajazeiras, tive Otinaldo como meu diretor de programação na rádio Correio, na Barão do Triunfo, no Centro. Guardo em meus arquivos uma advertência que ele me fez por chegar atrasado para “aberir” a emissora, por volta de 5h da manhã. A advertência acabou servindo de pretexto para uma sólida amizade, forjada em inúmeros encontros. Em algumas ocasiões de celebração do Natal frequentei sua casa, a convite, para dividir ceia com figuras ilustres como o ex-governador e ex-senador Antônio Mariz, de quem Otinaldo era amigo pessoal.
Ele atuou, também, na Comunicação, nos governos de Ernani Sátyro e Dorgival Terceiro Neto. Era repórter em tempo integral, antenado com os acontecimentos e, sobretudo, com pesquisas históricas. O texto de Petrônio Souto, seu companheiro de jornada, diz muito do personagem: “Numa época em que João Pessoa tinha apenas uma emissora de ondas médias e a Tabajara reinava absoluta, ele pegou uma rádio incipiente, amadora, de potência e abrangência quase nulas com transmissor caseiro e transformou a Arapuan na mídia mais poderosa e influente do Estado. Estou falando do jornalista, radialista e advogado Otinaldo Lourenço, o homem que provocou uma verdadeira revolução na radiofonia paraibana entre boa parte dos anos 50 e meados dos anos 70. A audiência só tinha ouvidos para a Tabajara e seus programas de auditório e radionovelas. Convencido de que jamais poderia concorrer com a emissora oficial, Otinaldo imaginou um rádio moderno, inspirado na BBC de Londres e na Rádio Jornal do Brasil, regido não mais pelo rádio-espetáculo, pelo entretenimento, mas pela notícia”.
É ainda Petrônio Souto que afirma: “(Otinaldo) formou equipe jovem, entusiasmada e competente, remodelou totalmente a grade de programação, elaborou o Manual de Redação, criou o Departamento de Utilidade Pública e a Central de Notícias Dulcídio Moreira, colocando na embalagem o slogan “Se a Arapuan não deu, o público não sabe o que aconteceu”. Assim, programas como Mesa de Redação, Dramas e Comédias da Cidade, Antena Política e o Plantão Arapuan, só para citar alguns exemplos de grande sucesso, passaram a ser um hábito quase religioso para a audiência, a ponto de fazer eco em todos os cantos da Capital e de uma área que hoje é chamada de região metropolitana de João Pessoa. Sua vida, ou a parte mais ativa de sua existência, se confunde com a história do rádio da Capital”. O “Galo”, como o chamávamos carinhosamente, deixa saudades imorredouras!!!
O slogan era: “Se a Arapuan não deu, o fato não aconteceu”.