Nonato Guedes
São duras as medidas anunciadas conjuntamente pelo governo do Estado e prefeitura de João Pessoa para tentar controlar a “explosão” de novos casos de Covid-19 no território paraibano. Tais medidas são duras, mas indispensáveis, e, nesse sentido, louve-se a agilidade de ação do governador João Azevêdo (Cidadania) e do prefeito da Capital, Cícero Lucena (PP), fazendo-se sensíveis diante do agravamento da pandemia no território paraibano. A hora da verdade, por assim dizer, confronta, novamente, os poderes públicos, passada a temporada de eleições e de festejos que mesmo não tendo chancela ou patrocínio oficial não deixam de ser realizados, por iniciativa irresponsável dos que brincam com a vida e são inscientes acerca da gravidade do novo coronavírus.
Na definição do governador João Azevêdo, que pareceu apropriada, as medidas fazem parte do “choque” na mobilidade social e urbana para deter uma escalada preocupante de novos casos de Covid. As consequências do fenômeno são bastante conhecidas dos setores mais informados e conscientes da opinião pública: superlotação de leitos hospitalares na rede pública e privada, elevação do número de casos de infectados, propagação do vírus, com sua característica insidiosa, perversa, deletéria e, como se depreende das estatísticas, letal. O cerne da questão em pauta no radar das autoridades é o relaxamento do isolamento social. Houve frouxidão inquietante nesse aspecto, com o registro de aglomerações, acompanhadas do desuso de máscaras e abandono de medidas protetivas.
Percebe-se que é um problema de natureza essencialmente cultural, que está enraizado no âmago de segmentos da sociedade que não foram treinados para o convívio social civilizado, para o respeito a princípios de urbanidade. A ignorância é tanta que as pessoas transgressoras de recomendações feitas por especialistas e autoridades de Saúde Pública sobre a imperiosidade da prevenção não se dão conta de que estão sendo, elas próprias, prejudicadas, na condição de alvos mais fáceis, de grupos decididamente prioritários em termos de vulnerabilidade ao contágio, à disseminação da doença. Os médicos insistem: “fiquem em casa”, “usem máscaras”, “mantenham o distanciamento social”. As pessoas fazem ouvidos de mercador a esses apelos, sem noção de que, assim, estão na linha de frente como vítimas potenciais do coronavírus.
Ainda ontem, em redes sociais, tivemos depoimentos candentes, lancinantes, de profissionais da medicina e de diretores de hospitais privados que estão lidando com o caos em meio a uma estrutura que nunca foi eficiente nos últimos anos no Brasil porque os governos não investiram maciçamente na Saúde. Em alguns casos, o que ocorreram foram desvios de recursos por parte de governadores, prefeitos e líderes políticos, ensejando operações policiais que já custaram a inelegibilidade de alguns mas não funcionaram como medidas exemplares para outros candidatos à corrupção, à propina, à lavagem de dinheiro em cima da desgraça da população. Essa politicagem é que tem atrapalhado a vida do brasileiro que paga impostos, convive com reajustes de tarifas e com uma conjuntura alarmante de desemprego. Nos casos de desobediência civil a medidas sanitárias imprescindíveis para garantir a saúde de todos, não há outro caminho senão endurecer regras e punições. Afinal, a sociedade como um todo não pode ser colocada em risco devido à incúria, insensibilidade, falta de noção, ou seja lá o que for, de grupos sociais cada vez mais mal vistos pela população consciente.
A deflagração da campanha de vacinação, depois de muita luta e de muitas dificuldades ocasionadas pela postura negacionista do próprio presidente da República, Sr. Jair Bolsonaro, acendeu uma luz, criou focos de esperança, mesmo com as advertências de que imunizantes não são milagrosos, diante da própria complexidade qud reveste o coronavírus, doença que ainda é uma incógnita para cientistas e pesquisadores de renome e que continua a demandar a intensificação de estudos, de exames em laboratórios, para que se tenha um diagnóstico minimamente aproximado da verdadeira origem de cepas transmissíveis que estão infelicitando populações no mundo inteiro. Desvendar o universo do coronavírus continua sendo um desafio diuturno para os “experts” em matéria tão instigante.
Quando o governador João Azevêdo enfatiza que de nada valerá o mutirão de autoridades da Saúde Pública para manter a situação sob controle possível sem a colaboração maciça da população, ele não está transferindo responsabilidades mas deixando claro que o problema pertence a todos, que a calamidade afeta criaturas indistintamente, independente de condição social, sexo, faixa etária. E, no bojo dessa constatação solar, repica a análise de que a população é responsável por tentar garantir a sua própria sobrevivência. Para que isto aconteça, é preciso que haja simultaneamente uma revolução cultural, no modo de pensar e agir em convívio social. Porque o poder pode muito mas não pode tudo. E qualquer sinal de desajuste em agrupamentos sociais pode ser a porta de entrada para o descontrole total.
Mercê das medidas rápidas e eficazes de autoridades, o Estado da Paraíba vinha logrando até então manter-se em panorama estável no cenário nacional, como se verificava no levantamento que é feito a cada dia por órgãos de imprensa e por secretarias estaduais e municipais de Saúde. Nesse ínterim, houve o relaxamento em meio à perspectiva de festejos, mesmo os que foram cancelados, e tivemos, também, o vergonhoso espetáculo dos “fura-filas” na vacinação, devassando políticos e seus familiares, autoridades e funcionários públicos em posição hierárquica superior, que desviaram o curso do Plano de Imunização. Como não poderia faltar neste Brasil, deu-se até o episódio da “vacina de vento”, aplicada por profissionais de Saúde irresponsáveis, situados na franja marginal da cadeia do sistema que se empenha em salvar vidas. A conta de chegar, por tudo isso, chegou, infelizmente. A vez, então, é do “choque de realidade”, que precisa enquadrar os criminosos da pandemia para salvar pessoas que cumprem dolorosas medidas de isolamento social e são passadas para trás por oportunistas de plantão, essas figuras execráveis ainda incorporados à jequice política e social brasileira.