Nonato Guedes
Em paralelo com o enfrentamento à pandemia do coronavírus, o prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena, está às voltas com o estrago causado por fortes chuvas que caíram nos últimos dias e que recolocaram em pauta antigos problemas na estrutura urbanística e na mobilidade como um todo. Mesmo com a experiência de dois mandatos à frente da edilidade, a terceira gestão de Cícero não tem oferecido respostas eficientes aos problemas ocasionados por alagamentos, saturação de galerias pluviais, precariedade de calçamento ou pavimentação. Era a hora para anunciar-se, de vez, um novo Mercado Central para João Pessoa, à altura do crescimento territorial da Capital paraibana, livrando-a de impasses recorrentes que só acarretam transtornos e intranquilidade para a população. Em vez disso, optou-se pelo remendo, pela improvisação.
A radiografia alarmante de problemas, que chegou com intensidade proporcional ao temporal, não isenta de responsabilidade a gestão de oito anos empalmada por Luciano Cartaxo (PV), que encerrou em dezembro sua passagem pelo comando do Paço Municipal. Pelo contrário, amplifica as inúmeras falhas e omissões que foram cometidas nesse período administrativo, o que significa que a gestão anterior não investiu de forma planejada na preparação de João Pessoa para superar os verdadeiros dilemas que emperram o seu desenvolvimento. Já se tinha uma visão periférica de que o investimento maciço da Era Cartaxo havia sido feito no “varejo”, nas pequenas intervenções, deixando de dotar João Pessoa de grandes marcos, estruturantes, e de corredores para escoamento pleno da mobilidade urbana. Agora, comprova-se o prognóstico. Mas o passado é o passado e cabe a Cícero, de volta à cadeira de gestor, oferecer soluções.
Evidente que não se pode cobrar muito de uma administração que ontem completou dois meses, mas pode-se cobrar, sim, medidas eficazes, alternativas inovadoras, equacionamento dos desafios que estão congelados à espera da iniciativa do Poder Público. Afinal, Cícero fez promessas, criou expectativas, atraiu apoiadores para um voto de confiança quanto ao seu retorno à edilidade pessoense. Em seu favor contava com intervenções de repercussão no passado, como o fim do “Lixão do Róger”, que era uma nódoa, uma chaga na paisagem urbanística de João Pessoa e que foi extirpado em definitivo. Havia a expectativa de que, mercê do histórico favorável ao seu currículo, voltasse com mais vigor, pleno de poderes para resolver abacaxis, até por se beneficiar da parceria com o governo do Estado, feito que voltou a ocorrer em João Pessoa depois de hiatos prejudiciais à sua população.
O que se nota, como vai ficando claro para alguns setores da opinião pública, é que a terceira administração de Cícero Lucena como prefeito de João Pessoa ainda marca passo diante do contencioso enorme que há pela frente. Constata-se a absoluta inutilidade de algumas secretarias, titulares ou executivas, que não conseguem ser operacionais, proativas, para reforçar o planejamento macro que foi concebido por Cícero para esta terceira gestão. Isto vale para situações emergenciais, como a ocorrência de chuvas, e para situações comuns, do dia a dia. Não há um acompanhamento do ritmo que o prefeito procura passar desde as primeiras horas da investidura no cargo nem há propostas criativas que sinalizem luzes no fim do túnel para gargalos inerentes à geografia da Capital da Paraíba.
Alguns secretários, mesmo titulares de pastas estratégicas, eclipsaram-se do noticiário nos últimos dias, como se já estivessem de folga em tão pouco tempo de atuação. Tal se deu com o próprio secretário de Saúde, Fábio Rocha, que demonstra não estar suportando o peso de cobranças da sociedade para um enfrentamento mais adequado à pandemia do novo coronavírus, bem como em relação ao cronograma de vacinação em massa que chegou a ser ensaiado para proteger a população vulnerável diante de tamanha calamidade. O secretário, que cogitou pedir o boné em meio à tempestade, aceitou ponderações e permaneceu. Mas é uma figura acomodada, sem maior entusiasmo, com agravante de ocupar uma Pasta estratégica em uma conjuntura francamente trágica ou preocupante. Há outros casos, de secretários que foram escolhidos por mera acomodação política, mas de cuja ação não se tem conhecimento de nada. São os anônimos ilustres da gestão pilotada pelo pepista.
Mesmo com o carro em movimento, impõe-se ao prefeito Cícero Lucena uma reavaliação do desenho que montou para começar o terceiro governo no município de João Pessoa. Essa reavaliação pode levar a mudanças de peças ou até mesmo ao descarte de algumas delas por terem se revelado inadequadas ao estilo de ação do alcaide e mesmo ao ritmo que ele precisa imprimir para justificar o crédito de confiança obtido nas urnas em segundo turno, em pleito renhido. Cícero, que foi uma revelação como vice-governador do Estado e mesmo como governador por dez meses, tendo se projetado em aspectos cruciais das duas gestões na prefeitura de João Pessoa, passa a impressão de estar sem rumo ou de mãos atadas nesta terceira oportunidade. E isto vai pô-lo, daqui a pouco, em xeque, perante a própria parcela da população que apostou fichas no retorno da “experiência” ao comando da prefeitura pessoense.