Nonato Guedes
Obcecado pela ideia de se destacar na liderança do enfrentamento à Covid-19 no território do seu município, o prefeito de Campina Grande, Bruno Cunha Lima (PSD), tem se desgastado com a postura agressiva que adota em relação ao governador João Azevêdo quanto às medidas que precisam ser tomadas em caráter de urgência urgentíssima para conter o avanço da crise sanitária, que ocorre em proporções alarmantes e inquietantes para a população paraibana como um todo. Bruno tem feito declarações sinalizando que não cumprirá o decreto assinado pelo governo do Estado com medidas restritivas de atividades que ocasionem aglomerações. Está convencido de que Campina é uma exceção no mapa da calamidade que se abate sobre o País e tem certeza de que a prefeitura está preparada para lidar com o caos à revelia do que considera “interferência” do governo estadual.
Jovem, impetuoso e alçado pela primeira vez ao comando da administração pública, embora não seja propriamente jejuno na política, já que foi deputado estadual e, nessa condição, fez-se autor de Leis e proposituras de inegável alcance público, o prefeito Bruno Cunha Lima não está se dando conta de que o conflito com o governo do Estado é totalmente inoportuno, extemporâneo, numa hora em que a palavra de ordem é a “cooperação”, tanto mais imprescindível devido ao agravamento da pandemia, que provoca reações em todo o mundo, nas Capitais de maior projeção. O alcaide da Rainha da Borborema invoca o pretexto da “autonomia” que foi conferida a municípios e a Estados por tribunais competentes para coordenar ações de combate ao vírus. Mas é preciso lembrar que essas competências delegadas não significam um cheque em branco para governadores e prefeitos, cingindo-se aos cronogramas locais das ações que devem ser postas em prática.
Por mais que o Brasil careça de um eficiente Plano Nacional de Imunização contra o novo coronavírus – a mais grave distorção cometida pelo presidente Jair Bolsonaro, um negacionista assumido, que sempre minimizou a extensão da calamidade enquanto corpos de vítimas da Covid se amontoavam em cemitérios ou em locais a céu aberto – as ações emergenciais que estão sendo executadas e que já possibilitaram a aquisição de vacinas precisam ser desencadeadas em ritmo de compartilhamento, de articulação entre governantes. Mesmo porque o fenômeno de eclosão do coronavírus ainda é desafiador para governantes de todo o mundo e se impõe a necessidade de troca de informações, de conhecimento de experiências diferentes que estão sendo empreendidas para assegurar eficiência e velocidade ao mutirão de enfrentamento à pandemia.
Ao contrário do que parece supor, equivocadamente, o prefeito Bruno Cunha Lima, Campina Grande, apesar da sua reconhecida importância no contexto do processo de desenvolvimento não só do Estado da Paraíba mas de toda a região Nordeste, não se constitui em uma “ilha” no meio da tempestade detonada pela Covid. Os números oficiais divulgados cotidianamente pela Secretaria Estadual de Saúde e, em paralelo, as pesquisas de comprovado teor científico, produzidas por pesquisadores altamente qualificados de Universidades e de outras instituições que estão dedicadas ao exame das variantes de coronavírus – toda essa literatura atesta que a Rainha da Borborema foi profundamente afetada no bojo da pandemia e ainda por cima enfrenta as consequências derivadas do fato de que é centro de recepção de pacientes de outras localidades, inclusive da Capital, para atender a demandas urgentes. A “bandeira verde” é uma utopia em tempos de crise sanitária num Estado como a Paraíba que, ao longo dos anos, tem sofrido reflexos diretos de crises econômicas e sociais com agravamento de desigualdades detectado por estudos de economistas e autoridades versadas no assunto.
Eleito no primeiro turno da campanha municipal do ano passado, o prefeito Bruno Cunha Lima pode ter se deslumbrado com a perspectiva de uma articulação direta com o governo federal, graças à linha direta que possui com o presidente Jair Bolsonaro, mediante prestígio do ex-prefeito Romero Rodrigues, que deverá ser o candidato do capitão ao governo do Estado em 2022. Mas Bruno precisa se aperceber que mesmo Bolsonaro tem suas limitações – e, apesar de poder muito, não pode tudo. Tanto é assim que já foi flagrantemente desautorizado pelo Supremo Tribunal Federal em algumas das iniciativas que cogitou colocar em prática, desobedecendo jurisprudências e normas que valem para qualquer autoridade pública. E o presidente quedou-se a tais determinações, ainda que apelando para o “jus esperneandi”, ou seja, o direito de espernear.
O prefeito Bruno Cunha Lima tem todo o direito de dar ampla vazão aos seus sentimentos bairristas, ao justo orgulho que tem em relação à cidade de Campina Grande e, mesmo, de alardear eventuais resultados proativos que a cidade tenha assinalado, até a nível nacional, no ranking de enfrentamento da pandemia. Mas a Covid-19 é uma doença insidiosa, de origens ainda não totalmente desvendadas pelos especialistas em Saúde Pública do mundo inteiro e, por isso mesmo, vulnerável a variantes, a novas cepas que estão se desenvolvendo em escala inquietante. No jogo de informação e contra-informação em torno da pandemia, ninguém pode se julgar dono da verdade, muito menos cometer gestos de desobediência civil que apenas pioram a situação de calamidade. Que o prefeito faça uma reflexão e que seja mais republicano no diálogo para preservar vidas da população cujos destinos passaram às suas mãos a partir de primeiro de janeiro. Tudo que não se quer, neste momento difícil, é bravata. Quanto mais se for bravata misturada com interesse político…