Nonato Guedes
O governador da Paraíba, João Azevêdo (Cidadania) está entre os 16 gestores estaduais que enviaram carta ao Congresso Nacional, ontem, solicitando que o auxílio emergencial seja pago em parcelas de R$ 600, uma sugestão superior à do governo federal que planeja o retorno do benefício em abril com parcelas de R$ 150, R$ 250 ou R$ 375, dependendo da família. A alegação dos signatários da carta é que o Brasil está enfrentando o pior momento da pandemia do coronavírus, com recordes diários de casos e mortes, e que frear essas curvas crescentes têm exigido medidas restritivas, impactando diretamente a economia e a vida de milhares de pessoas, no dizer do governador de Pernambuco, Paulo Câmara.
O valor de R$ 600 foi pago no ano passado, também por conta da crise sanitária. Desde então, a situação só tem se agravado e o Palácio do Planalto cogitou a redução do valor para não inflacionar o Tesouro Nacional nem desrespeitar o teto de gastos, o que poderia ocasionar até mesmo processos contra o presidente da República por crime de responsabilidade. Pressentindo as dificuldades no horizonte, governadores como o da Paraíba apelaram para a criatividade, acenando com distribuição de cestas básicas a famílias mais vulneráveis por período determinado, mas esse mecanismo assistencialista é insuficiente para corresponder à expectativa e às necessidades palpáveis dos que estão sentindo na pele os duros efeitos da crise paralela, de proporções igualmente dramáticas – a crise econômica e social, com a mistura de desemprego e interrupção de atividades essenciais.
A carta dos governadores argumenta, ainda, neste sentido: “Entendemos que a redução dos valores do auxílio emergencial é inadequada para a eficácia da proteção da população. Enquanto a vacinação não acontecer em massa, precisamos garantir renda para a população mais vulnerável”, diz o texto, assinado, também, por nomes como o governador de São Paulo, João Doria (PSDB e o governador do Maranhão, Flávio Dino, do PCdoB. A nota deixa claro que os governadores apoiam a iniciativa das 300 organizações que compõem a Campanha “Renda Básica que Queremos” e ressalta que o calendário nacional de vacinação, bem como a obtenção de novas doses de imunizantes contra a Covid-19 estão mais lentas do que as respostas que são necessárias para a reversão de um quadro francamente hostil, negativo, para a população.
Os governadores relembraram que há um ano, exatamente, no início da pandemia, eles se manifestaram favoráveis à implantação de uma renda básica no País. “Hoje, mais do que nunca, é comprovada a sua necessidade, urgência e o impacto que se pode alcançar. Por isso, neste momento, defendemos auxílio emergencial de R$ 600, com os mesmos critérios de acesso de 2020”. Não obstante a exposição do quadro de dificuldades, os governantes alertam que entendem a importância de o País não se desviar de seu compromisso com a responsabilidade fiscal. “É importante entender o esforço de mitigação da crise atual para os mais vulneráveis como extraordinário e temporário. Logo à frente precisaremos voltar a uma trajetória de ajustamento fiscal que compatibilize os necessários programas sociais com um financiamento responsável dos mesmos”.
Enquanto transcorria esse posicionamento dos governadores, em Brasília o presidente Jair Bolsonaro fez acenos de mudança de postura no enfrentamento à pandemia de Covid-19, promovendo reunião de representantes de Poderes constituídos e outras autoridades que redundou na criação de um denominado “Comitê de Crise”. Não faltaram críticas, na mídia, à demora de um ano para que o governo federal assumisse posição de liderança – e isto ocorreu quando mais calamitosa se tornou a conjuntura epidêmica no Brasil, com repercussão mundial. A reação do Palácio do Planalto foi quase acompanhada da posse do quarto ministro da Saúde, o cardiologista paraibano Marcelo Queiroga, que dentro da estrutura de poder já começou a se debater com desafios remanescentes da postura negacionista que marcou profundamente a gestão de Bolsonaro até agora.
O roteiro ensaiado ontem em Brasília prevê reuniões constantes entre o Planalto e representantes dos Poderes constituídos, além de interlocução do presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) com governadores de Estados para ações conjuntas de enfrentamento à pandemia e aceleração da vacinação contra a Covid-19 em todo o território nacional. O Tribunal de Contas da União, através do ministro Luiz Fux, fez-se presente à reunião inaugural, mas não pode participar concretamente do tal Comitê de Crise já que terá a missão, lá na frente, de fiscalizar a transparência dos recursos públicos investidos em medidas de urgência que, mais do que nunca, precisarão ser acionadas para tranquilizar a população brasileira. Divergências políticas à parte, é fundamental que a própria sociedade apoie iniciativas de reação como as de agora, até para poder cobrar ou criticar depois. Aliás, foi o próprio ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), principal opositor de Bolsonaro, quem levantou a lebre da criação de um Comitê que, em países civilizados, já existe e possibilita ações rápidas e intervenções eficientes do Poder Público no combate à tragédia do coronavírus.