Nonato Guedes
O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, abriu uma frente de crise com o Senado ao acusar a senadora Kátia Abreu (PP-TO) de ter defendido interesses da China durante um almoço entre os dois. A mídia sulista informa que o ministro enfrenta um doloroso processo de “fritura” e que as pressões se avolumam junto ao presidente Jair Bolsonaro para a sua demissão. Kátia Abreu respondeu duramente às insinuações, ressaltando que Araújo “insiste em viver à margem da boa diplomacia e à margem da verdade dos fatos” e cobrou a sua exoneração. A senadora paraibana Daniella Ribeiro, do PP, solidarizou-se com Kátia Abreu e qualificou como “lamentáveis” as declarações feitas pelo ministro das Relações Exteriores.
Em nota distribuída à imprensa, ontem, Kátia Abreu escreveu: “O Brasil não pode mais continuar tendo, perante o mundo, a face de um marginal. Alguém que insiste em viver à margem da boa diplomacia, à margem da verdade dos fatos, à margem do equilíbrio e à margem do respeito às instituições. Alguém que agride gratuitamente e desnecessariamente a Comissão de Relações Exteriores e o Senado Federal”. De acordo com a versão de Ernesto Araújo, no almoço com Kátia Abreu, ela teria defendido interesses chineses especificamente na questão do mercado de 5G da telefonia. Narrou que a recebeu para um almoço no ministério e que Kátia pouco ou quase nada falou de vacinas. No final, à mesa, teria dito: “Ministro, se o senhor fizer um gesto em relação ao 5G será o rei do Senado”. E acrescentou: “Não fiz gesto algum. Desconsiderei a sugestão, inclusive porque o tema 5G depende do Ministério das Comunicações e do próprio presidente da República, a quem compete a decisão última na matéria”.
Kátia considerou uma “violência” resumir o conteúdo da conversa em um tuíte. “É uma violência resumir três horas de um encontro institucional a um tuíte que falta com a verdade. Em um encontro institucional, todo o conteúdo é público. Defendi que os certames licitatórios não podem comportar vetos ou restrições políticas”, acentuou. A parlamentar disse ter alertado “esse senhor” dos prejuízos que um veto à China na questão 5G poderia dar às exportações brasileiras, especialmente para o setor de agronegócio. “Defendi também que a questão do desmatamento na Amazônia deve ser profundamente explicada ao mundo no contexto da negociação para evitar mais danos comerciais ao Brasil”. E concluiu Kátia: “Se um Chanceler age dessa forma marginal com a presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado da República de seu próprio país, com explícita compulsão belicosa, isso prova definitivamente que ele está à margem de qualquer possibilidade de liderar a diplomacia brasileira. Temos de livrar a diplomacia do Brasil do seu desvio marginal”.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e pelo menos outros sete colegas se manifestaram a favor de Kátia Abreu contra Ernesto Araújo, ontem. Rodrigo disse que a fala do ministro “foi um grande desserviço ao país”. Araújo sugeriu que senadores o poupariam de críticas se ele declarasse apoio à adoção de tecnologia chinesa para a rede 5G no Brasil. “Justamente em um momento que estamos buscando unir, somar, pacificar as relações entre os Poderes. Essa constante desagregação é um grande desserviço ao País”, disse Pacheco sobre o ministro. Para Pacheco, a tentativa do ministro Ernesto Araújo de desqualificar a senadora Kátia Abreu atinge todo o Senado Federal.