Nonato Guedes
João Pessoa, a capital da Paraíba, está sem vacinas contra a Covid-19 e, também, sem vacinação. Após a bagunça explícita verificada, ontem, no Espaço Cultural, com uma fila imensa para receber a segunda dose da vacina e cenas de aglomeração descontrolada e desespero, a prefeitura suspendeu temporariamente o calendário de imunização, que será retomado após o envio de novas doses pelo ministério da Saúde, a ocorrer no final de semana. Sem dúvida, um retrocesso, para uma Capital que se orgulhava de estar, até então, entre as primeiras do Nordeste a avançar na vacinação. Na terra do ministro da Saúde, o cardiologista Marcelo Queiroga, a vacinação desandou e aumentou o pânico da população. Uma culpa que deve ser distribuída entre o ministério, o governo do Estado e a prefeitura municipal.
Houve problemas, também, em Campina Grande, em meio a insistentes acusações do prefeito Bruno Cunha Lima (PSD) sobre suposta discriminação por parte do governo do Estado para com a cidade, o que carece de confirmação. O prefeito de Campina é inimigo político declarado do governador João Azevêdo e rivaliza com o prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena, na ocupação de espaços políticos. Aproveita-se da “linha direta” que tem com o presidente Jair Bolsonaro, mercê da influência do ex-prefeito Romero Rodrigues, para tentar “furar a fila” nacionalmente e conseguir privilégios para o município que administra, como alegada compensação por dificuldades junto ao governo estadual. O bom senso indica que a estratégia correta seria o prefeito sair do palanque em que continua e dialogar, sem prevenção, com o governo do Estado, para fazer valer o compromisso assumido com os campinenses. Como isso não ocorre, a população é quem perde.
Sinceridade? Infelizmente, a politicagem contaminou a execução, na Paraíba, do Plano Nacional de Imunização, gerando como sub-produtos a falta de espírito público, a demonstração de falta de empatia para com categorias como os idosos e portadores de comorbidades e o fracasso dos gestores públicos na definição de estratégias acertadas para atendimento ao público que é forçado a conviver com medidas alternadas de isolamento social, dificuldades financeiras por conta da crise econômica e social e, agora, falta de vacinas e suspensão de vacinação. Até parece que está funcionando para valer a Lei de Murphy, segundo a qual o que tem que dar errado, dá errado mesmo. Houve falhas, admitidas pelas autoridades, até na ativação de um aplicativo para cadastro e vacinação das pessoas. Por outro lado, a vacinação chegou a ser interrompida em fim de semana a pretexto de dar descanso às equipes, como se fosse permitido aos governos, numa calamidade atribuir-se uma trégua em pleno fogo cruzado.
A falta de planejamento eficiente é visível e os poderes públicos não estão, como dizem, oferecendo toda a estrutura necessária para atender à população. A única coisa certa, para a opinião pública, é o repasse de recursos públicos, de diferentes fontes, para que governos estaduais e municipais efetivem, com resultados, o programa de imunizações, no esforço para evitar alastramento do contágio da doença. Sabe-se que obras públicas e investimentos de monta estão paralisados em outros setores porque a alegação corrente é de que a prioridade máxima está sendo dada ao enfrentamento à pandemia de coronavírus e, ultimamente, à campanha de vacinação. Mas o que se nota, em termos concretos, é que essa prioridade não é absoluta, o planejamento é falho, cheio de furos, e os poderes públicos não estão fazendo, como deveriam, a sua parte para atender à população neste período emergencial.
Mostradas pela televisão, em tela grande, as cenas ocorridas no Espaço Cultural, em João Pessoa, chocaram profundamente a opinião pública e amplificaram a revolta e as reclamações pelos desencontros de informação e pela carência de atendimento e de vacinas. Pode ser que venham a servir de lição para governantes corrigirem erros, mudarem a rota e serem mais eficazes no cumprimento de obrigações e responsabilidades que lhes cabe. Mas pode ser, também, que não produzam maiores reflexos com vistas à superação de obstáculos e à prestação, à sociedade, de serviços de qualidade que ela tem o direito de exigir, especialmente nesta hora difícil de agravamento da pandemia em diferentes partes do mundo.
Tristes e lamentáveis os episódios do “Espaço Cultural”, que foram uma espécie de marco-símbolo da irresponsabilidade e incompetência de gestores públicos no enfrentamento à pandemia de Covid-19. Foram fatos que mancharam a imagem da Paraíba, até então relativamente boa, pela situação de estabilidade aparente que vinha conseguindo manter no ranking da disseminação da Covid-19 por Estados brasileiros. Não há desmerecimento de esforços que foram empreendidos e que surtiram efeitos positivos em etapas da cruzada de enfrentamento à epidemia na Paraíba. Mas é fora de contestação que a situação “degringolou” e que as autoridades perderam pontos junto à sociedade em momentos dramáticos que ela enfrenta. Fazer “mea culpa” pelos erros graves cometidos é o mínimo que elas (autoridades) podem fazer. Quanto a recuperar a credibilidade, isto vai depender mais de ações concretas, proativas, do que de discursos vazios que não sensibilizam quem está apavorado com a pandemia.