Nonato Guedes, com BBC Brasil
Uma reportagem de Laís Alegretti, publicada pela BBC News Brasil, alerta para o machismo predominante na Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19, criada no Senado Federal por determinação do Supremo Tribunal Federal: as investigações serão conduzidas exclusivamente por senadores homens. São 18 integrantes do sexo masculino e nenhuma mulher na composição da CPI. Na bancada paraibana, por exemplo, há duas senadoras – Daniella Ribeiro (PP) e Nilda Gondim (MDB) e nenhuma delas foi indicada para titular ou suplente. O terceiro representante da Paraíba no Senado, Veneziano Vital (MDB), filho de Nilda Gondim, também não faz parte da Comissão. Nilda ocupa a vaga aberta com a morte do senador José Maranhão, vítima de complicações da Covid.
Cientistas políticas ouvidas pela BBC News Brasil consideram que a ausência de mulheres resulta em dois principais efeitos. O primeiro é reduzir as chances de a CPI discutir os efeitos da pandemia e da atuação do governo federal diante dela para as mulheres, que foram atingidas de forma específica nas mais diversas esferas. O segundo é retroalimentar a baixa participação de mulheres em espaços de poder, já que parlamentares mulheres estarão de fora do que deve ser o principal palco político do país nos próximos meses. A reportagem informa que a falta de mulheres na comissão é marcante mesmo se comparada à baixa proporção de senadoras na Casa.
Dos 81 parlamentares em exercício no Senado, apenas 12 são mulheres (menos de 15%). A proporção é muito diferente das ruas: o número de mulheres (51,8%) na população brasileira supera o de homens (48,2%), segundo o IBGE. Se a representação das mulheres no Congresso já é baixa, o acesso a posições de mais destaque lá dentro é ainda mais difícil, diz Flávia Biroli, professora de Ciência Política na Universidade de Brasília. “O acesso das mulheres a comissões e cargos dentro do Congresso, que são importantes tanto pela influência que elas podem ter ocupando esses cargos, tanto quanto pelo fato de que gera visibilidade, é um acesso ainda mais reduzido do que o acesso delas à própria Casa”, diz. “Esse grupo completamente masculino na CPI só confirma como tem sido esse processo, historicamente, de exclusão”, acentua.
A cientista Letícia Medeiros, co-fundadora da ONG Elas no Poder, que atua para ampliar a participação das mulheres na política, diz que a busca por diversidade nos espaços de poder vai muito além dos números. “Essa composição diz muito sobre o quanto as instituições e os parlamentares eleitos ainda não entendem que diversidade no processo de diagnóstico, de análise, de produção de política pública, é essencial para ter mais qualidade na tomada de decisão”. Para defender a importância da diversidade, Medeiros destaca a influência das trajetórias e vivências pessoais de políticos nos processos de decisão. Biroli acrescenta que a falta de mulheres na CPI da Covid é especialmente preocupante devido ao efeito específico desta crise nas mulheres brasileiras que deveria ser abordado no debate. “Neste caso, tem um agravante: estamos vivendo uma situação de catástrofe humanitária que incide de forma específica sobre as mulheres”.
Biroli e outras pesquisadoras brasileiras em diversas áreas formaram a Rede Brasileira de Mulheres Cientistas para defender a implementação de políticas dirigidas às mulheres nos campos da saúde, violência, educação, segurança alimentar, trabalho e geração de renda e moradia. Uma carta do grupo, ainda a ser divulgada, aponta que a crise pela qual o Brasil passa atinge principalmente as mulheres pobres, negras e moradoras de periferias. O texto enumera os efeitos nas vidas das mulheres e diz que há uma ausência completa de pesquisas públicas voltadas a apoiar as mulheres e meninas neste momento de crise humanitária”.