A jornalista paraibana Rachel Sheherazade, que move na Justiça uma ação de indenização contra o Sistema Brasileiro de Televisão-SBT, pedindo indenização no valor de R 20 milhões, afirma, no processo, que nunca recebeu nenhum direito trabalhista, como férias remuneradas e décimo terceiro salário, além de acusar Silvio Santos de assédio moral e humilhação em rede nacional e alegar que foi vítima de censura e boicote por parte da chefia de Jornalismo da emissora. É o que revela o site “Notícias da TV”, que teve acesso ao processo de 522 páginas movido em São Paulo pela ex-apresentadora do SBT Brasil, que foi demitida em agosto de 2020.
A ação foi protocolada em 11 de março na Terceira Vara dp Trabalho de Osasco (SP), cidade em que a sede do SBT está instalada, e os advogados de Rachel Sheherazade detalham os motivos de pedirem uma indenização milionária pelos nove anos e sete meses em que ela trabalhou na empresa. Um dos episódios destacados na ação foi a cerimônia do Troféu Imprensa realizada em 9 de abril de 2017, quando Sheherazade subiu ao palco para receber o Troféu Internet de melhor apresentadora de telejornal, que ela havia conquistado em 2016. A jornalista diz ter sido humilhada por Silvio Santos em rede nacional na ocasião. O processo destaca a seguinte fala do dono da emissora: “Eu te chamei para você continuar com a sua beleza, com a sua voz, foi para ler as notícias e não dar a sua opinião. Se quiser falar sobre política, compre uma estação de TV e faça por sua própria conta”.
A defesa da apresentadora diz que Silvio Santos teve um comportamento depreciativo, preconceituoso, vexatório, humilhante e constrangedor, além de ter “uma atitude nitidamente machista, (que) colocou a figura feminina numa posição em que a beleza física é supervalorizada em detrimento dos atributos intelectuais”. Por conta dessa exposição negativa e da alta repercussão midiática, os advogados pediram uma indenização de R$ 500 mil por danos morais. Na lista de constrangimentos públicos que Rachel Sheherazade alega ter sofrido está a suspensão do SBT Brasil em agosto de 2019, após um pedido de Luciano Hang, dono da rede varejista Havan, um dos principais patrocinadores dos programas da emissora de Silvio Santos. A jornalista, por represália a suas publicações em redes sociais, foi proibida de comandar o telejornal nas edições de sexta-feira.
– Silvio Santos a afastou da apresentação do telejornal SBT Brasil, como nítida forma de punição em razão de seus comentários e opiniões, bem como reduziu seu espaço no ar – diz a defesa da apresentadora. Outros fatos apontados foram os boicotes que sofreu de colegas de trabalho. Nos anexos da ação, Sheherazade colocou prints das mensagens que trocou com José Occhiuso, diretor de jornalismo do SBT, em que ela reclamava do desequilíbrio de distribuição de tarefas importantes, como gravações de chamadas e offs do telejornal. Por muitas vezes, seu nome era “esquecido” e somente Carlos Nascimento, também demitido da emissora, acabava privilegiado. A jornalista começou a dar expediente no SBT em março de 2011 na condição de prestadora de serviços, como pessoa jurídica, sem ter sua carteira de trabalho assinada. Seu salário inicial foi estipulado em R$ 30 mil, e ela recebia mais um bônus de R$ 7 mil para custos com moradia – uma maneira de a emissora ajudá-la a se estabelecer na região metropolitana de São Paulo, já que ela morava em João Pessoa (PB) antes de ter sido contratada.
Por conta das renovações de seu contrato, Rachel teve um crescimento salarial exponencial. Seu último vencimento na emissora, pago em outubro de 2020, foi de R$ 241.108,47, quase 614% maior do que o inicia, conforme mostram as notas fiscais anexadas ao processo. Mas a defesa de Sheherazade alega que a “pejotização” do acordo foi imposta pelo SBT com o objetivo de fraudar a lefislação trabalhista, previdenciária e fiscal, e de não pagar os direitos que a ex-funcionária teria caso sua carteira de trabalho tivesse sido assinado. “Procedimento ilegítimo que o SBT utiliza com a maioria de seu corpo de jornalismo e apresentadores”, diz o advogado André Gustavo Souza Froez de Aguilar na ação. Para chegar aos quase R$ 20 milhões de indenização, a defesa de Rachel Sheherazade foi minuciosa no detalhamento de itens que foram suprimidos de seus ganhos nos quase dez anos em que trabalhou no SBT como PJ. Os cálculos do advogado de Sheherazade mostram que o SBT não pagou seu décimo terceiro salário em nenhum dos anos em que ela trabalhou na emissora. O valor acumulado é de R$ 1.433.065,76. Também houve perdas em relação a férias integrais que não lhe foram remuneradas. A Justiça marcou para 3 de agosto, às 10h10, a primeira audiência do caso, em que as testemunhas de Rachel e do SBT serão ouvidas pelo juiz. Hermano Henning, que também processou a emissora de Silvio Santos, falará a favor da ex-colega de trabalho.