Nonato Guedes
A montagem do “xadrez” para a campanha de sua reeleição ao governo da Paraíba exigirá muita habilidade política por parte de João Azevêdo (Cidadania) para acomodação de aliados que gravitam atualmente na sua órbita e de apoiadores que podem ser atraídos ou conquistados dentro da estratégia de engrossar forças para o embate contra a oposição. Embora o chefe do Executivo não precipite movimentos de bastidores focados na disputa eleitoral, diante da prioridade a que se entregou de cumprir metas administrativas em caráter de urgência urgentíssima, nada impede que esses movimentos comecem a dar sinais. Já há cobranças, inclusive, quanto ao figurino ideológico que Azevêdo pretende usar na campanha de 2022, dentro da análise que é feita de que ele governa sustentado por grupos políticos de direita mas insiste em fazer acenos de aliança com segmentos de esquerda.
A visão dominante, a dados de hoje, entre aliados declarados do governador, é a de que ele adota uma postura equilibrista que não sobreviverá por muito tempo, até em virtude do ensaio de polarização que volta a se desenhar entre forças de direita e de esquerda no cenário nacional, envolvendo a própria disputa à presidência da República, com a reprodução do maniqueísmo que em 2018 opôs o PT e alguns congêneres ideológicos, representados pela candidatura do ex-ministro Fernando Haddad, à aliança de centro-direita que acabou fortalecendo a candidatura de Jair Bolsonaro, vitorioso nas urnas. A perspectiva de candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Planalto, liberada até agora pelo Supremo Tribunal Federal, em manifestação ocorrida nos autos de processos de condenação que foram anulados, já produz realinhamentos até então inimagináveis em diferentes Estados, com registro de inversão de candidaturas teoricamente postas para cargos majoritários, convertidas em candidaturas a mandatos proporcionais. O cenário tende a virar de cabeça para baixo, é o que se ouve com frequência entre atores políticos de extração variada no Estado.
Em 2018, Azevêdo se elegeu sob o pálio do PSB chefiado pelo ex-governador Ricardo Coutinho, em coligação com o PT e PDT, por exemplo, mas abrindo espaço de composição com legendas à direita, como o Democratas, entre outras. De lá para cá, o governador rompeu com o PSB e com a liderança de Ricardo, passando a organizar novo partido, mas aparentemente acendendo velas a Deus e ao diabo. Na sua base há uma barafunda de tendências, já que setores de esquerda apoiam o governo e ocupam até mesmo espaços nele, dividindo o metro quadrado com agrupamentos de direita e centro-direita, que fornecem a João Azevêdo a governabilidade de que ele precisa. A convivência entre polos ideológicos opostos é, naturalmente, insuportável, e o governador vem logrando mantê-la fazendo o papel de algodão entre cristais e conciliando interesses. Já se começa a dizer, porém, que a corda está esticando e que não vai demorar a se tornarem públicas insatisfações nas hostes oficiais.
Mesmo os aliados de centro-direita que apoiam João Azevêdo sabem que ele tem dificuldade concreta de se posicionar, na disputa presidencial, ao lado do capitão Jair Bolsonaro. Não há afinidade entre o presidente e o governador, e a relação que eles mantêm é estritamente do ponto de vista institucional, em obediência a mandamentos republicanos, que são estimulados por apoiadores do governador que apoiam o presidente porque são incompatibilizados com o PT e com as esquerdas em geral. Ocorre que Azevêdo, embora não tenha sido retaliado gravemente por Bolsonaro até agora, já fez acenos na direção do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, regozijando-se com a anulação de condenações a ele imputadas e considerando que a devolução da elegibilidade do líder petista foi um ato de justiça. Isto eriçou ânimos entre os xiitas de centro-direita que integram o bloco do governador, e cada vez mais haverá pressão para que Azevêdo, como é insinuado “em off”, “saia de cima do muro” na equação política que está posta no país.
Dá-se, também, conforme versões repassadas ao colunista, que estão pipocando, ainda sem muito alarde, entre aliados políticos do chefe do Executivo paraibano, sintomas de descontentamento por alegado desprestígio da parte dele no encaminhamento e solução de pleitos ou demandas que têm sido patrocinados por deputados federais, estaduais e lideranças municipais. A impressão que vai se formando, nesses círculos, é a de que Azevêdo não tem perfil conciliador ou de gestor de diálogo, como apostavam muitos que se envolveram com sua liderança. Pelo contrário, agiria, em certas situações, de forma até impositiva, o que lhe daria uma aura de arrogância no trato com políticos que costumam ser muito sensíveis na relação com o poder. Por ora, as queixas estão represadas no nível do desabafo informal, todavia, prevê-se que poderão tomar proporção mais séria daqui para a frente, com o risco de desaguarem em ruptura ou desalinhamento se não houver correção de rotas ou de tratamento.
A tendência, se a situação evoluir para gravidade ou para caso extremo, é a debandada, sem dó nem piedade, de líderes que não estariam sendo correspondidos à altura do peso político e, também, da mensuração de seu grau de lealdade demonstrada até agora para com a liderança do governador João Azevêdo. É comum ouvir-se, em rodas políticas, também, menção sobre inexistência de articulação política sólida e eficiente por parte da “entourage” mais ligada ao comando do chefe do Executivo, verificando-se como resultado lógico a dinamitação de pontes de entendimento. O risco que o governo corre é o de partir para reações tardias, quando já não houver mais espaços de convivência ou de recomposição política. O mantra do governador retardando o mais possível as discussões políticas sobre o palanque de 2022 pode acabar gerando defecções, ao invés de atrair ou somar apoios importantes.
Líderes insatisfeitos deixam escapar que concordam com a estratégia do governador do “Cidadania” em priorizar o enfrentamento à pandemia de coronavírus, agora focando na campanha de vacinação em massa, bem como no deslanche de obras e serviços que integram pacotes recentemente anunciados por ele para fazer avançar a administração estadual. Mas opinam que, em paralelo, o governador precisa estar atento à sua articulação política, pelo avizinhamento com o ano eleitoral propriamente dito. “Não são coisas excludentes”, ressalta um graduado líder político, complementando com a observação de que resta o governador João Azevêdo demonstrar sensibilidade para com reivindicações que são consideradas legítimas. Ou, então, munir-se de habilidade especial para contornar impasses a tempo de prevenir “surpresas desagradabilíssimas” que possam vir a ser desencadeadas quando menos o Palácio da Redenção calcular.
De fato, o governador João Azevêdo tem mostrado até aqui uma “postura equilibrista”, ressalte-se, equilibrista em uma corda política bamba que tende a se arrebentar na medida em que se avizinha o pleito e 2022.
Se Azevêdo almeja ter alguma chance de reeleição, deveria começar a coordenar desde logo as articulações entre os diversos partidos que – em tese -, compõem o seu bloco político, buscando a consolidação das alianças já firmadas e procurando granjear novos apoios para construção de uma aliança partidária ampla, coesa e plural, pois só assim poderá ter chance de vitória.
Mas se continuar nessa toada de neutralidade em relação às divergências e insatisfações que efluem de sua base aliada, mais dia menos dia – repita-se -, a corda pode arrebentar, e aí qualquer reação poderá ser tarde demais.
A Política é um processo dinâmico, marcado por avanços e recuos e pela ação do tempo. Assim, periodicamente, a depender das circunstâncias e tendo em conta o cenário, alteram-se as estratégias, reagrupam-se os partidos, reacomodam-se os agentes, de modo que o aliado político de ontem pode se tornar o adversário político de hoje e vice-versa. Acorda, João!