Nonato Guedes
Candidato declarado à reeleição em 2022, o governador João Azevêdo (Cidadania) será o quinto gestor da Paraíba a concorrer a um novo mandato consecutivo, desde que há pouco mais de duas décadas esse instituto foi introduzido na Constituição Federal, permeando, de forma correlata, a legislação eleitoral brasileira. A reeleição despontou no horizonte em 25 de janeiro de 1997, quando a Câmara dos Deputados aprovou, por 336 votos, 28 a mais do que o mínimo exigido, emenda instituindo o dispositivo, que também passou pelo crivo do Senado e foi promulgada em 4 de junho de 1997. O tema causou controvérsias com insinuação de manobra para favorecer o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e acusação de compra de votos de parlamentares para apoiar a proposta. FHC, em artigo publicado pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, em setembro de 2020, fez um mea-culpa em relação ao episódio, assumindo ter sido um erro a aprovação da reeleição.
A possibilidade de recondução de ocupantes de cargos executivos é encarada na classe política como espécie de julgamento ou plebiscito de administrações e administradores, seja no plano federal, estadual ou municipal, uma vez que podem pleiteá-la tanto o presidente da República como governadores de Estados e do Distrito Federal e prefeitos de cidades e capitais. No reverso da medalha, há restrições a pretexto de que a reeleição foi concebida sob medida para privilegiar os que estão nos cargos executivos e podem se beneficiar, colateralmente, da força de máquinas de governo, enquanto adversários lutariam em situação de desigualdade. Mas nem todo gestor no exercício do mandato sai vitorioso. Em 2002 na Paraíba, por exemplo, Roberto Paulino, que era o titular do Executivo, perdeu a disputa em segundo turno para Cássio Cunha Lima (PSDB). Paulino era vice de José Maranhão, que renunciou para disputar uma vaga no Senado. Maranhão (que faleceu vítima de complicações da Covid) foi eleito mas Paulino perdeu.
De quatro chefes de Executivo que concorreram à reeleição no Estado, três foram bem-sucedidos. José Maranhão, que era vice de Antônio Mariz e assumiu a titularidade com a morte deste, em setembro de 1995, foi o primeiro bafejado pela reeleição, em 1998. Ele se fortalecera dentro do PMDB ao vencer quedas-de-braço com o grupo Cunha Lima em convenções internas e passou a exercer o controle da agremiação até sua morte, recentemente. Maranhão teve como adversário nas urnas em 98 o então deputado Gilvan Freire, que concorreu pelo PSB, sem maior estrutura nem densidade política-eleitoral. O político de Araruna obteve, proporcionalmente, a maior vitória nas eleições para governadores no País e tentou voltar mais duas vezes ao Palácio da Redenção pelo voto, sem êxito. Quando morreu, estava no exercício do segundo mandato de senador.
O segundo governante beneficiado com a reeleição na Paraíba foi Cássio Cunha Lima. Eleito em 2002 derrotando Roberto Paulino, ele foi reeleito em 2006 derrotando o próprio José Maranhão. O clima foi de radicalização intensa durante toda a campanha e se estendeu até depois do resultado, com ações impetradas na Justiça por adversários de Cunha Lima, liderados por José Maranhão, pugnando a cassação do mandato do vitorioso, sob alegações de conduta vedada e suposta improbidade administrativa. Somente em 2009, faltando menos de um ano para o término do segundo mandato de Cássio, o TSE acolheu as petições apresentadas, afastou Cássio e o vice José Lacerda Neto (DEM) do exercício dos cargos e convocou José Maranhão e Luciano Cartaxo (então PT) para serem investidos de forma respectiva. Cássio passou recibo de irresignação com a sentença, por ele definida como “o maior erro do Judiciário brasileiro”, tendo se reabilitado em 2010 ao ser consagrado para o mandato de senador.
Ricardo Vieira Coutinho, pelejando pelo PSB depois de ter deixado as hostes do Partido dos Trabalhadores em atmosfera de rompimento, foi o terceiro governador reeleito na história da Paraíba. Ele ganhou em 2010 derrotando o senador José Maranhão como principal adversário e contando com o apoio do ex-governador Cássio Cunha Lima. Em 2014, logrou ser reconduzido ao Palácio da Redenção, desta feita derrotando o próprio Cássio Cunha Lima e o ex-senador Vital do Rêgo Filho (PMDB), entre outros menos votados. Seis anos após aquele embate memorável, manifestações da Justiça Eleitoral acolheram alegações da defesa de Cássio sobre irregularidades que interferiram na legitimidade do resultado. “Foi feita justiça, infelizmente em período bastante tardio”, obtemperou Cássio, às voltas com nova irresignação diante de desfecho eleitoral que o prejudicou na sua carreira.
O governador João Azevêdo foi eleito em 2018 ao governo do Estado pela legenda do PSB, revelando-se fenômeno político, uma vez que venceu em primeiro turno, derrotando candidatos como Lucélio Cartaxo (PV), apoiado pelos Cunha Lima, e novamente José Maranhão (MDB). O grande cabo eleitoral de Azevêdo foi o então governador Ricardo Coutinho, que, inclusive, permaneceu no mandato até o último dia a pretexto de assegurar a vitória do sucessor e, por via de consequência, a chamada continuidade administrativa. Azevêdo não tinha, então, disputado nenhum cargo político, embora estivesse enfronhado nas coisas de governo por ter integrado a equipe administrativa de Coutinho. Os dois romperam em pouco tempo e já estiveram em campos opostos na eleição municipal de 2020 em João Pessoa. O governador, que saiu do PSB e passou a formar um novo partido, o Cidadania, tem cacife para a campanha à reeleição e é respeitado por adversários, que dizem não ignorar o potencial da máquina do poder. A oposição, por enquanto, quebra cabeça para entrar no jogo com fichas, dividindo-se entre nomes e alternativas, mas sem avançar tendências de definição. Quanto ao instituto da reeleição, embora periodicamente contestado, parece irreversivelmente fixado no cenário político-eleitoral brasileiro para cargos executivos.