Nonato Guedes
Governador do Piauí e presidente do Consórcio Nordeste, que reúne demais gestores de Estados da região, Wellington Dias, filiado ao PT, desfez, numa entrevista ao “Congresso em Foco”, as versões sobre resistência dos governantes nordestinos à investigação acerca da aplicação dos recursos liberados para o enfrentamento à pandemia de coronavírus, no âmbito da CPI da Covid instalada no Senado Federal. “Da nossa parte, nós queremos colocar as informações necessárias e sempre com cuidado para que a CPI não ultrapasse os limites estabelecidos pelas próprias regras do Senado Federal e haja uma dispersão”, asseverou.
O governo do presidente Jair Bolsonaro, como se sabe, tenta transformar a CPI num cabo de guerra com adversários políticos, mirando, sobretudo, governadores do Nordeste, que têm demonstrado certa autonomia em relação ao Planalto quanto a medidas relacionadas ao próprio combate à pandemia. Dias ressalta, entretanto, que a formatação da Comissão com parlamentares que são detentores de vasta experiência tranquiliza a sociedade quanto aos objetivos a serem alcançados, o principal deles – conforme deixou claro – é a apuração do elevado número de óbitos no Brasil e, a partir daí, a definição de responsabilidades por esses óbitos, bem como sobre a aplicação dos recursos liberados pelo Congresso Nacional. Lembrou que alguns integrantes da CPI foram governadores ou exerceram cargos parlamentares de destaque, possuindo preparo para encaminhar as questões que precisam ser demandadas.
– Sobre a aplicação de recursos federais pelos Estados e pelos municípios, nós temos toda a obrigação e o interesse de fornecer as informações, prestar contas e entendemos que é sim um foco da CPI. O que esperamos é que a CPI não seja utilizada como um instrumento de disputa política em qualquer dos Estados. Nós estamos falando em um instrumento extraordinário da democracia, que tem um poder de investigação judicial dado ao Parlamento e que sendo bem usada pode prestar um serviço de importante interesse público. Não pode ser focada sem razão em uma única região do Brasil. Da parte do Nordeste, e, tenho certeza, também dos municípios, nós já estamos providenciando as informações necessárias sobre a aplicação de cada centavo que recebemos e fazemos isso com muito cuidado – asseverou o governador Wellington Dias.
Indagado sobre sua expectativa diante do depoimento do ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, o presidente do Consórcio Nordeste respondeu: “O ministro Eduardo Pazuello teve um período alongado em relação a tantas mudanças que tivemos no Ministério da Saúde. Durante a fase em que foi ministro, nós tivemos uma relação federativa. Estive com ele e com outros governadores algumas vezes e sentíamos uma dificuldade muito grande, mas não era apenas dele, era já lá do ministro Luiz Henrique Mandetta, como ele mesmo relatou. O próprio ministro Marcelo Queiroga, hoje, claramente, tem a mesma dificuldade de ter liberdade para um papel e esperado do Ministério da Saúde nesse desafiador momento da pandemia. Na verdade, em alguns momentos, as decisões são tomadas sem a participação do Ministério, e agora mesmo, na organização do comitê de coordenação sobre Covid-19 deixaram de fora Estados e municípios”.
De acordo com o governador Wellington Dias, lamentavelmente, a falta de um plano que leva em conta a ciência vem desde o início da pandemia. “Eu acho que este é um foco que deve ser tratado porque é provável que se tenha a forma de encontrar a responsabilidade sobre os erros. Não seguir a ciência é um risco muito maior, basta ver o que aconteceu com o Brasil e o que aconteceu com outros países que seguiram a ciência. Em outros lugares do mundo que tiveram problemas graves, como a Itália, a Espanha, a Inglaterra, a França, os Estados Unidos, o resultado foi diferente do Brasil. Esses outros países seguiram a ciência. Seja no plano estratégico nacional, na prioridade para vacinação, na prioridade para a rede de tratamento dos doentes, na prevenção, com medidas de isolamento, quarentena individual, apoio a garantir as condições de suportar os prejuízos da população e dos empreendedores. Isso faltou no Brasil, com toda certeza”, detalhou o presidente do Consórcio Nordeste.
Acerca de dificuldade na negociação com o ministério sobre a pandemia no Nordeste, Wellington Dias deu ênfase mais à efetividade do que à relação pessoal com os ministros que passaram pela Pasta. E explicou que somente em outubro foi possível chegar-se a um plano estratégico nacional de imunização. “Ainda hoje nós não temos um cronograma de vacinação que possa nos dar segurança sobre o mês seguinte, nem falo no médio e no longo prazo. A falta de segunda dose, tendo que paralisar a primeira, a falta de respiradores, a falta de uma política preventiva que resultou no colapso na rede hospitalar, a falta de um acompanhamento com a ciência em relação ao abastecimento, tudo isso são falhas que tiveram um impacto no nível de mortalidade a que chegou o Brasil”. Ele concluiu chamando a atenção para o fato de que o Brasil enfrenta uma guerra diferenciada, que tem um nível de mortalidade dos mais elevados. “Nós estamos ultrapassando 1,5 milhão de óbitos no mundo. Estamos nos aproximando de 430 mil óbitos no Brasil. Olhando para frente, ainda não há uma luz no final do túnel”.