Nonato Guedes
Uma das mais frequentes indagações que políticos e jornalistas fazem na Paraíba, antevendo a disputa eleitoral de 2022, é sobre a perspectiva que o Partido Socialista Brasileiro tem, especialmente na conjuntura local. A razão é simples: o partido ainda abriga o ex-governador Ricardo Coutinho, que perdeu a eleição para prefeito de João Pessoa no ano passado e possivelmente cogite um retorno ao Partido dos Trabalhadores, onde iniciou trajetória, como foi aventado pelo ex-deputado federal petista Luiz Couto a Cláudia Carvalho, do “ParlamentoPB”. Militam também nas hostes do PSB o deputado federal Gervásio Maia, que não dá sinais de querer deixar a legenda, e deputados estaduais que estão na base do governador João Azevêdo (Cidadania) e aguardam apenas a janela partidária para migrar rumo a outras siglas. Ontem, entrevistado por uma emissora da Capital, Gervásio admitiu que o PSB está indefinido para as eleições estaduais do próximo ano e nem tão cedo deverá fechar alguma posição.
O definhamento dos quadros do PSB na Paraíba é expressivo e chega a constituir fenômeno, se comparado com o crescimento que vinha alcançando quando Ricardo Coutinho era governador do Estado e exercia influência avassaladora não apenas nas hostes socialistas, mas, também, na esquerda paraibana. Ricardo, não custa lembrar, é referência constantemente citada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que está de volta ao jogo político, com chances para o confronto com Jair Bolsonaro em 2022. Na própria campanha municipal do ano passado, em João Pessoa, Lula apareceu no guia eleitoral de Ricardo (que não foi sequer para o segundo turno) e desprezou, olimpicamente, a candidatura própria do PT a prefeito, encarnada pelo deputado estadual Anísio Maia, detentor de um dos mais pífios desempenhos do histórico petista na Capital. O que aconteceu para a metamorfose no PSB todos já sabem: o envolvimento de Ricardo em processos da Operação Calvário, além do rompimento do Partido Socialista com o governador João Azevêdo.
Os liderados de Coutinho haviam se preparado para uma permanência mais longa no poder estadual, simbolizada pela eleição de João Azevêdo, que se deu em primeiro turno. Previam, de algum modo, ruídos de comunicação, até mesmo fogueira de vaidades da parte do ex-governador para com o sucessor, mas não avaliavam que o estremecimento fosse tão profundo como acabou se revelando. Afinal, Ricardo, como consta nos anais, empenhou-se decisivamente pela vitória de Azevêdo, massificando o discurso da continuidade do projeto socialista de poder no Estado. A partilha de cargos pelo grupo vitorioso nas urnas em 2018 chegou a ser ensaiada, envolvendo o aproveitamento de quadros de outros partidos à esquerda, chancelados pelo “placet” do líder socialista paraibano. Mas as divergências não demoraram muito e se avolumaram com tal intensidade que João Azevêdo teve que buscar espaços de sobrevivência política-administrativa em outra legenda, daí escolhendo o “Cidadania” para acomodar seu esquema.
Em termos simbólicos, o divisor de águas entre os dois líderes – Ricardo Coutinho e João Azevêdo, foi mesmo a eleição municipal para prefeito, sobretudo em cidades estratégicas da Paraíba, como João Pessoa e Campina Grande, onde os dois esquemas se confrontaram abertamente, com vantagem para Azevêdo, que levantou a taça na Capital, numa aliança de conveniência com o Partido Progressista (PP), do “clã” Ribeiro, de Campina Grande. Mas o PSB amargou a defecção do senador que havia sido eleito pela sua bandeira em 2018 – Veneziano Vital do Rêgo, restituído, “motu próprio”, às fileiras do MDB, agora entronizado no papel de dirigente maior da sigla, no vácuo da morte do senador José Maranhão, que foi traumática para o Estado. Na contagem final dos votos do pleito de 2020, João Azevêdo dividiu espaços com aliados e com adversários históricos, como os Cunha Lima, que asseguraram a continuidade da hegemonia na prefeitura de Campina Grande, segundo colégio eleitoral paraibano.
Com Ricardo Coutinho fora de combate no noticiário político, mas ainda formalmente filiado aos quadros do PSB, já se desenham nos bastidores articulações e costuras informais dentro da perspectiva de confrontos no próximo ano, por mais que novas disputas ainda estejam bem distantes no calendário. Mas o Cidadania, por exemplo, atua ostensivamente para se expandir em regiões diferentes e para viabilizar ensaios de alianças que possam respaldar a candidatura do governador João Azevêdo à reeleição. Fora daí, começam a aparecer candidatos ao Senado em partidos que são da base do atual chefe do Executivo, que a tudo acompanha sem nada desautorizar e, também, sem assumir compromisso explícito. Da parte da oposição a Azevêdo, no que concerne a partidos não vinculados diretamente a Ricardo, há um bate-cabeça para decidir candidaturas e prospectar sinais de entendimento. Isto é visível, por exemplo, da parte dos ex-prefeitos Romero Rodrigues (Campina Grande) e Luciano Cartaxo (João Pessoa), ou seja, entre PSD e PV, com acenos para legendas disponíveis.
Na esquerda, território onde Coutinho age com desenvoltura, a indefinição é maior. O único ponto de consenso é o combate, no plano nacional, ao bolsonarismo, ou seja, à tentativa do presidente Jair Bolsonaro de conquistar mais um mandato no Palácio do Planalto. Se depender do PSB paraibano, uma aliança em torno do ex-presidente Lula será aceita com receptividade plena, mas tudo fica confuso quando petistas como Luiz Couto cogitam uma volta de Ricardo ao seu berço político, que foi o Partido dos Trabalhadores. Independente da equação nacional, a esquerda na Paraíba segue sem rumo, por exemplo, para disputar o governo do Estado em 2022. O deputado Gervásio Maia não ousou afirmar diretamente que a esquerda está desorientada e que o PSB, sobretudo, está sem rumos para a agenda rumo à reconquista do Palácio da Redenção. Mas o fato de não ter dito quase nada, localmente, sobre para onde o vento soprará no próximo ano, foi uma demonstração eloquente da desconfortável indefinição que assola as hostes socialistas e eventuais aliados em nosso Estado.