Nonato Guedes, com agências
A jornalista paraibana Rachel Sheherazade, do portal “Metrópoles”, de São Paulo, usou o Twitter, ontem, para criticar o ataque do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a mais uma jornalista em Sorocaba, no interior paulista. Ela o convidou para uma conversa, mas alertou: “Se gritar comigo, vai ouvir”. Rachel Sheherazade escreveu: “É doentia a forma como Jair Bolsonaro trata mulheres jornalistas. Isto me soa a MISOGINIA, ou seja: ódio ou aversão a mulheres”. Ela ainda fez ironia com a proposta de conversa com Bolsonaro. “E aí, presidente, topa?”.
Bolsonaro gritou com a repórter Adriana de Luca, da CNN Brasil, após ser questionado sobre o atraso da compra de vacinas e sobre o contrato com a Covaxin. O presidente se exaltou, não respondeu a pergunta e disse que a imprensa faz “perguntas idiotas” e “ridículas”. Sheherazade ganhou notoriedade no papel de apresentadora do telejornal SBT Brasil, onde chegou a atuar como comentarista, emitindo opiniões polêmicas sobre temas da atualidade na conjuntura nacional. Ela foi proibida de fazer comentários por Sílvio Santos, dono do SBT, quando passou a criticar o governo do presidente Jair Bolsonaro. Sílvio alegou que Sheherazade havia sido contratada para “ler as notícias”, não para dar opiniões. A jornalista teve o contrato rescindido em meio a uma rumorosa discussão com a direção do SBT, que foi parar nos tribunais. O empresário Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan e um dos maiores anunciantes do SBT, chegou, publicamente, a pedir a cabeça de Sheherazade a Sílvio Santos, acusando-a como “comunista”.
Por outro lado, a Justiça Federal em São Paulo determinou que o governo federal repare a população brasileira por meio do pagamento de R$ 5 milhões pelos danos morais provocados por declarações do presidente Jair Bolsonaro e seus ministros, que discriminam e reforçam o preconceito contra mulheres. Cabe recurso da decisão. A União também deve investir R$ 10 milhões em campanhas pela conscientização sobre a violência, assédio e desigualdade contr as mulheres, sobre os direitos que as vítimas de violência têm de contar com a segurança, a saúde e a assistência pública e sobre a implementação de políticas públicas que visem a igualdade de gênero. A Advocacia-Geral da União afirmou, por meio de nota, que não comenta processos judiciais em tramitação.
A decisão divulgada na quarta-feira, 23, é referente a uma ação movida pelo Ministério Público Federal em São Paulo, que apontou que mensagens e pronunciamentos de agentes públicos da gestão federal continham caráter discriminatório e preconceituoso em relação às mulheres, impactando negativamente a sociedade brasileira. “Os fatos e provas retratadas nos autos evidenciam a despreocupação e até mesmo o escárnio dos agentes do governo com a situação de marginalização social das cidadãs brasileiras, além de denotar o absoluto menosprezo em relação ao dever institucional de promoção da igualdade de gênero e ao princípio da moralidade administrativa, ambos relegados em prol de determinada cartilha política”, escreveu a juíza Ana Lúcia petri Betto, da Sexta Vara Cível Federal de São Paulo.
Entre os exemplos citados de abuso da liberdade de expressãoestão: a declaração do presidente de que cada mulher no governo “equivale por dez homens”, a declaração do presidente de que “o Brasil não pode ser o país do turismo gay, mas se alguém quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade, a declaração do presidente de que o Brasil “é uma virgem que todo tarado de fora quer”, a declaração do presidente em visita à Arábia Saudita de que “todo mundo gostaria de passar uma tarde com um príncipe, principalmente vocês, mulheres”, a ofensa do presidente a uma repórter da “Folha de S. Paulo” com insinuações sexuais por uma matéria sobre disparo em massa de mensagens, a declaração da ministra Damares Alves, da Família, de que o abuso sexual de meninas na Ilha do Marajó, no Pará, se deve à falta de calcinhas e a declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que a companheira do presidente da França “é feia mesmo”. Para o MPF, os discursos veiculam estereótipos que reforçam a discriminação e o preconceito, estigmatizando as mulheres, perpetuando a desigualdade social e impedindo a promoção da cidadania e da dignidade humana, portanto, violando a Constituição Federal.