Nonato Guedes
O advogado Márlon Reis, ex-juiz e um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, repudiou a aprovação, pela Câmara dos Deputados, de Projeto de Lei Complementar número 9/2021, flexibilizando a Lei da Inelegibilidade e Ficha Limpa para que não sejam inelegíveis os gestores e políticos que tiverem suas contas rejeitadas, em casos cuja punição seja apenas de multa. Hoje, a punição para esse tipo de caso é o de inelegibilidade por oito anos. Porém, para Márlon Reis, as mudanças aprovadas são desnecessárias e “têm vistas em 2022”.
A proposta foi aprovada por 345 votos a 98 e 4 abstenções, inclusive com o apoio da maioria da bancada federal paraibana na Câmara. De 12 deputados federais paraibanos, nove votaram favoravelmente ao Projeto de Lei Complementar. Foram eles: Aguinaldo Ribeiro, do PP, Damião Feliciano (PDT), Efraim Filho (DEM), Frei Anastácio Ribeiro (PT), Hugo Motta (Republicanos), Julian Lemos (PSL), Wellington Roberto (PL), Wilson Santiago (PTB), Rafael Pereira (Rafafá), do PSDB. Gervásio Maia, do PSB, foi contrário à matéria, enquanto Edna Henriques (PSDB estava ausente e Leonardo Gadelha (PSC) idem. O texto precisa, agora, passar pelo Senado, e pela sanção presidencial, para valer para as próximas eleições.
– Esse projeto representa um grande retrocesso para a Justiça Eleitoral, além de ser desnecessário e facilitar a corrupção por não exigir a prestação de contas da forma correta e legal – disse Márlon Reis ao site “Congresso em Foco”. E acrescentou, indignado: “Em nenhuma jurisprudência eleitoral existe algo assim”. O advogado revelou também que não há nada no projeto que “realmente acrescente à Lei da Ficha Limpa” e que tudo se trataria de uma “desculpa” dos parlamentares com vistas às eleições de 2022. Márlon também criticou o fato de a discussão sobre o texto ter acontecido de forma “apressada” e sem nenhuma participação suficiente da sociedade e dos juristas”.
– Se aprovado, o projeto vai servir somente para trazer ainda mais impunidade e afrouxar punições, como também é o caso do Projeto de Lei que altera a Lei de Improbidade, aprovado em 15 de junho – afirmou o ex-juiz, que também é co-fundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. Originalmente, a Lei da Ficha Limpa determina que são inelegíveis os políticos que “tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa”. O deputado federal Gervásio Maia, do PSB, declarou que a aprovação da Lei foi apenas uma “adaptação à jurisprudência”, não se constituindo manobra para favorecer quem quer que seja. Atualmente, a prestação de contas de campanha é exigida de todos os candidatos que participarem de eleições e deve ser apresentada até um mês depois dos pleitos. Com a prestação, é possível verificar a regularidade na arrecadação e aplicação dos recursos de campanha feitas ao longo do período eleitoral. A partir disso, a Justiça pode decidir pela aprovação, pela aprovação com ressalvas, pela desaprovação ou pela não prestação das contas.
O relator do projeto na Câmara foi Enrico Misasi (PV-SP). Em seu relatório, o parlamentar escreveu que “em matéria de inelegibilidade, a lei deve, necessariamente, levar em conta a gravidade dos atos praticados”. O texto ainda defende que as mudanças previstas acrescentam “segurança jurídica face ao critério objetivo a ser aplicado no exame dos pedidos de registro de candidatura”. Representantes do Ministério Público, entretanto, se posicionaram criticando o Projeto de Lei que afrouxa a Lei da Improbidade, opinando que estão receosos de uma nova onda de impunidade no país.