O Partido dos Trabalhadores prefere deixar em segundo plano a discussão sobre corrupção na eleição presidencial de 2022, em que provavelmente terá Luiz Inácio Lula da Silva como candidato. Foi o que admitiu a própria presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR). Uma reportagem da “Folhapress” mostra que o partido se sente mais confiante em tratar do tema após a série de vitórias sobre a Lava Jato, mas sabe que ele é sensível e deve ser muito explorado por adversários. Na campanha, a tendência do PT é confinar a corrupção ao papel de coadjuvante no arsenal de Lula contra o presidente Jair Bolsonaro, bem atrás das discussões sobre pandemia, economia e ataques às instituições.
Atingido nos últimos anos por escândalos como o mensalão e o petrolão, o PT deverá ter uma atitude mais reativa, respondendo se for provocado. Gleisi Hoffmann sintetizou: “Esse tema certamente será explorado pelos nossos adversários. Queremos fazer um debate sobre a verdade. Já vencemos na Justiça e estamos vencendo na política”. Além da anulação da condenação de Lula no caso do triplex de Guarujá e da parcialidade do ex-juiz Sergio Moro, o partido conta a seu favor com a absolvição no chamado “quadrilhão do PT”. Gleisi adianta: “Nossa proposição maior é discutir a vida do povo, como tirar o país dessa crise, melhorar a renda, retomar a soberania nacional. Não nos furtaremos a fazer o debate da corrupção, mas queremos mostrar como esse tema foi utilizado numa estratégia de perseguição política”.
Segundo dirigentes do partido, acusações contra Bolsonaro, como as “rachadinhas” e as suspeitas sobre compra de vacinas devem ser abordadas de forma cautelosa na campanha. Petistas dizem também que é urgente uma autocrítica sobre corrupção – não a cobrada pelos adversários, reconhecendo envolvimento com desvios, mas um mea culpa do partido por ter explorado muito agressivamente o tema no passado. “Essa é uma autocrítica que o PT poderia fazer, de ter utilizado a corrupção como arma para desqualificar o oponente. Temos de desqualificar no confronto de ideias, não em práticas udenistas, lacerdistas, porque isso leva a golpe de Estado”, diz o ex-deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), um dos formuladores do partido sobre o tema, fazendo referência aos ataques de Carlos Lacerda (UDN) contra Getúlio Vargas, nos anos 1950.
Há diversos exemplos desse moralismo exacerbado na história do PT. Em 2001, o então publicitário do partido, Duda Mendonça, produziu um famoso comercial denunciando a corrupção no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em que ratos roíam a bandeira do Brasil. Outra peça da mesma época tinha líderes do partido repetindo em sequência a frase “lutar contra a corrupção e melhorar a vida do povo”. Para o ex-ministro da Justiça, Tarso Genro, o partido não deveria polarizar demais sobre corrupção em 2022, “pois isso degrada o debate político”. Explica: “Corrupção é um tema importante mas não o principal. Pandemia, milícias e deterioração das políticas sociais são mais relevantes hoje”. Segundo Tarso, o debate interno no partido sobre corrupção mudou muito. “Mudou por uma questão estrutural no centro da discussão democrática. Há uma campanha da direita no mundo de que os políticos são essencialmente corruptos, de que o Estado é corrupto”.
Apesar das vitórias na Justiça, o PT ainda tem flancos abertos que adversários pretendem explorar. Não desapareceram, por exemplo, a delação do ex-ministro Antônio Palocci, da Fazenda, a relação promíscua com empreiteiras e o dinheiro desviado da Petrobras para o exterior. Contra isso já há um discurso montado para rebater os ataques que devem vir dos adversários. O roteiro inclui, além de críticas à Lava Jato, o argumento de que os governos Lula e Dilma Rousseff deram independência e condições materiais para a Polícia Federal e o Ministério Público trabalharem sem pressões. O PT também deve enfatizar medidas como a criação da Controladoria Geral da União, a aprovação da Lei de Acesso à Informação e o fortalecimento da legislação contra a corrupção. “Nos nossos governos, as instituições de fiscalização e controle foram fortalecidas e ganharam independência e autonomia. A Polícia Federal era uma polícia de Estado, e não de governo ou de um ou outro grupo político”, afirma o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Prerrogativas, grupo que reúne profissionais do Direito.