Nonato Guedes
Se fosse vivo, o ex-governador Wilson Leite Braga, natural de Conceição, no Sertão paraibano, estaria completando, hoje, 90 anos de idade. Foi um dos líderes mais populares da vida pública do Estado, com projeção no cenário nacional, e faleceu no dia 17 de maio de 2020, no Hospital Nossa Senhora das Neves, em João Pessoa, vítima de Covid, uma semana depois da morte da sua esposa e companheira de lutas, ex-deputada Lúcia Braga, também alvo de complicações da doença que ainda assola o mundo. Wilson deixou um vasto legado, forjado em sólida biografia que o premiou pelo voto em memoráveis embates travados na Paraíba. Mas, como dizia conhecido personagem da política local, o ex-deputado Manoel Gaudêncio, o Senado não estava no seu ‘horóscopo’.
Por duas vezes, em 1986, e em 2002, Wilson Braga disputou cadeira naquela Casa do Congresso, sem lograr êxito. Em 86, concorrendo pelo PFL como parte de uma denominada Aliança Trabalhista Liberal, sofreu a derrota mais fulminante, obtendo 388.878 votos, num páreo em que parecia favorito. Foi defenestrado pelo empresário Raimundo Lira, “azarão” no prélio, que fez dobradinha com Humberto Lucena, ambos disputando pelo PMDB. Lira chegou a ser mais votado do que o próprio Humberto, com 615.533 sufrágios contra 607.266 do companheiro de chapa. Braga fez parceria com Maurício Brasilino Leite. A chapa Humberto-Lira ganhou juntamente com o candidato a governador pelo PMDB, Tarcísio Burity, que bateu Marcondes Gadelha nas urnas por quase 300 mil votos de maioria. Em 2002, aliado a Cássio Cunha Lima, eleito governador, Wilson perdeu por margem estreita para Efraim Morais, do PFL, que com ele fazia dobradinha. Foram eleitos naquele ano Efraim, pela oposição estadual, e José Maranhão, que havia renunciado ao governo, sendo substituído pelo vice Roberto Paulino.
Com exceção do Senado, Wilson ocupou os mais diferentes cargos da hierarquia política no Estado e na Capital. Foi governador, eleito em 1982 derrotando Antônio Mariz por cerca de 151 mil votos de diferença, depois de ter tido atuação destacada como deputado federal, em que ocupou cargo na Mesa Diretora, e de profícuo desempenho como deputado estadual. Foi eleito, em 1988, prefeito de João Pessoa, onde também exerceu mandato de vereador, ascendendo à presidência da Câmara Municipal. Já vivia o ostracismo político quando faleceu – o último mandato que exerceu até o fim foi o de deputado estadual, curiosamente o primeiro que ocupou quando deu partida à sua carreira política em 1954. Wilson “flertou” com partidos de esquerda e chegou a militar em agremiações como o PSB, mas era remanescente, mesmo, da antiga UDN, que empalmou bandeiras reformistas no espectro à direita. Apoiou o movimento militar de 1964 e ingressou no partido de sustentação do regime daí derivado, a Arena, o que não o impediu de atuar no campo social e de discordar frontalmente de algumas medidas adotadas pelo governo. Quando tentou voltar ao governo do Estado, em 1990, pelo voto, não deu sorte. Perdeu para o poeta Ronaldo Cunha Lima em segundo turno, por causa do desgaste que ocmeçava a colecionar no ciclo político local.
Wilson foi um político de linhagem populista não por efeito de marketing, mas como reflexo das suas origens humildes, com passagem pela Casa do Estudante em João Pessoa, e da sua reconhecida sensibilidade em relação às camadas mais carentes da população, que tiveram atenção da parte dos seus governos e dos mandatos parlamentares que exerceu. Historiadores da conjuntura local chegaram a definir o estilo de atuação de Wilson como “clientelista” ou “assistencialista”, mas tinham dificuldade nesse tipo de apreciação em face da autenticidade de posições do político sertanejo. Ou da trajetória cambiante que assinalava o seu perfil em momentos distintos da realidade paraibana. Wilson apoiou Paulo Maluf à presidência da República no colégio indireto, quando a maioria da Nação pugnava por Tancredo Neves. Mas, numa guinada espetacular, migrou para o PDT, onde foi recepcionado com o “placet” do ex-líder Leonel de Moura Brizola.
A respeito da derrota experimentada em 1986 ao Senado, Wilson atribuiu-a ao “vendaval mudancista”, avaliando que o Plano Cruzado, lançado por José Sarney, que assumiu com a morte de Tancredo, favoreceu candidatos do PMDB e moeu favoritos como ele, na Paraíba, e Roberto Magalhães, em Pernambuco. O fato de, também, ter se dedicado à campanha ao governo com afinco, enfeixando todas as decisões, desviou-o da própria meta para se eleger. E, por fim, sentiu-se traído por correligionários, detentores de mandatos, que usufruíram do seu governo mas não corresponderam quando ele precisou. “É a repetição da velha estória: quem faz noventa e nove, mas não completa os cem, não faz nada”, resumiu, num depoimento. Para ele, havia um quê de injustiça por parte de parcelas do eleitorado, “mas não fui o primeiro nem serei o último injustiçado”.
Wilson envolveu-se em polêmicas, muitas delas criadas no interior da sua própria administração à frente do governo da Paraíba. Chegou a radicalizar, de forma inglória, contra o líder Tancredo Neves, que foi governador de Minas Gerais no período em que ele administrou o nosso Estado. Braga propôs a retirada de Minas do Conselho Deliberativo da Sudene, dizendo que o Estado era “gigolô” da economia nacional e apenas “sugava” recursos dos Estados mais pobres e mais fracos. Na verdade, foi uma represália sua pelo fato de Tancredo ter chamado o PDS, pelo qual fora eleito, de “partido nordestino”, em manifestação infeliz de preconceito e xenofobia, como está na moda dizer-se. Abstraindo os incidentes políticos e os equívocos em posturas adotadas na situação política paraibana ou nacional, Wilson já pertence à História na galeria de líderes que conquistaram legitimidade. Ganhando, ou perdendo, ele sempre se mirou no voto como moeda de valor da sua infatigável carreira política. A pecha de “biônico”, que caiu bem em certos personagens da vida pública paraibana, não se ajustava ao seu figurino.