Nonato Guedes
Confirmando sua fama de “desagregador”, o ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) provoca rebuliço nas hostes do Partido dos Trabalhadores na Paraíba com sua pretensão de voltar à legenda e, possivelmente, tentar disputar mandato nas eleições de 2022, provavelmente o de senador, embora haja dúvidas sobre elegibilidade dele diante de pendências judiciais recorrentes e da sua citação no âmbito da Operação Calvário, que versa sobre desvio de verbas públicos na Educação e Saúde no governo do Estado. Ontem, líderes petistas reuniram-se em João Pessoa para avaliar o provável retorno de Coutinho e decidiram que, caso o assunto da refiliação dele ao PT seja pautado oficialmente na instância partidária, esses líderes se posicionarão de forma unificada e contrária a tal perspectiva.
Participaram da reunião de ontem representantes do “Coletivo Reviravolta”, “Articulação de Esquerda”, “Militância Socialista”, “Avante” e “PT pela Base”. Uma das vozes contrárias ao reingresso de Ricardo Coutinho é o deputado estadual Anísio Maia, que, inclusive, na campanha eleitoral de 2020 a prefeito de João Pessoa, foi prejudicado pelo PT nacional e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quando levou avante a tese da candidatura própria até o fim, obtendo votação irrisória. Lula gravou vídeo com mensagem a eleitores pessoenses pedindo voto para Ricardo Coutinho, que não logrou ir, sequer, para o segundo turno, resultado que foi atribuído ao desgaste enfrentado em meio a acusações graves desde que deixou o Palácio da Redenção em dezembro de 2018. A reunião de ontem contou, ainda, com a participação do deputado federal Frei Anastácio Ribeiro e do prefeito de Picuí, Olivânio Dantas. Foi reiterado o compromisso de engajamento no fortalecimento da campanha de Lula na Paraíba com as forças progressistas, mas no reverso da medalha houve inflexibilidade na rejeição à volta de Ricardo.
Na última terça-feira, 27, Ricardo Coutinho publicou no Instagram uma foto de encontro seu com o ex-presidente Lula da Silva, em São Paulo, postando a legenda: “Seguimos juntos por Democracia, Trabalho e Saúde para o nosso povo, no Brasil e na Paraíba. Venceremos”. Ricardo tem estado, também, por várias vezes, com a presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), que não esconde a receptividade da cúpula e do próprio ex-presidente Lula a uma iminente volta de Coutinho ao “status quo ante”. O ex-governador deixou os quadros do PT em 2003 em meio uma grande controvérsia, com insinuações de infidelidade partidária e prática de personalismo. Ingressou no PSB, tornando-se presidente estadual, pelo qual foi eleito prefeito de João Pessoa em 2004, sendo reeleito em 2008 e daí consagrando-se como governador em 2010 e 2014. Caiu ultimamente em desgraça no PSB com as acusações de envolvimento na “Operação Calvário”, mas, numa articulação surpreendente, reaproximou-se de Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff em alto estilo, na mesma proporção em que perdeu espaços e prestígio no bloco socialista, que passou ao comando do deputado federal Gervásio Maia.
Afirma-se nos meios políticos que apesar de resistências dentro do PT local, Ricardo Coutinho poderá vir a ser favorecido com o “placet” do ex-presidente Lula para seu reingresso, como gratidão ou retribuição a manifestações de solidariedade que Ricardo ofereceu, a Dilma, ainda quando governador, durante o processo de impeachment dela, e a Lula, quando este foi recolhido à Superintendência da Polícia Federal em Curitiba por ordem do ex-juiz Sergio Moro, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro – o que tem sido desmontado em meio ao revisionismo da Justiça, que soltou Lula e devolveu-lhe os direitos políticos, possibilitando-lhe concorrer novamente à presidência da República em 2022. O presidente estadual do PT, Jackson Macêdo, admitiu há poucos dias o prosseguimento de conversas sobre a refiliação de Ricardo e até se mostrou receptivo a tanto. Houve rumores de que, além de Ricardo, socialistas como os deputados estaduais Jeová Campos, Estelizabel Bezerra e Cida Ramos poderiam ser atraídos na “operação retorno”.
A dificuldade em torno dos passos do ex-governador rumo à “estação PT 2022” tem a ver com o fato de que alguns líderes petistas estão na base de apoio do governador João Azevêdo (Cidadania), que já fez declaração de voto antecipada em Lula para presidente no próximo ano, descartando qualquer movimento para se compor com candidaturas de centro ou de direita. Uma visita de Lula à Paraíba está agendada para este mês de agosto, dentro da peregrinação que ele encetará por Estados do Nordeste a fim de conversar com forças políticas que possam reforçar o seu projeto de candidatura ao Palácio do Planalto contra Jair Bolsonaro. Desta feita, o arco de conversas que Lula pretende manter se ampliará consideravelmente, incluindo o próprio Ricardo, o governador João Azevêdo, o senador Veneziano Vital, do MDB, e o ex-prefeito Luciano Cartaxo, do PV. O roteiro está sendo coordenado com prioridade absoluta pela direção nacional do PT e pelos interlocutores de confiança de Lula.
Ricardo Coutinho, aparentemente, ensaia um movimento espetacular para voltar à cena e ocupar, novamente, mandatos políticos. Há dúvidas sobre o grau de prestígio que ele ainda detém junto à opinião pública, embora pesquisas informais para o Senado projetem cotação razoável do seu nome. Em termos concretos, o ex-governador luta para se desvencilhar da série de denúncias de corrupção formuladas pelo Ministério Público em alentados dossiês que já foram publicizados. Além de alvo da Operação Calvário, que foi desencadeada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado), Coutinho foi considerado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral e teve contas relacionadas ao exercício de 2017 rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado. estando na dependência de efeito suspensivo de decisões judiciais. Ele é otimista incorrigível, desdenha das acusações e assegura que estará no páreo, com chances de sair consagrado. Fia-se, para tanto, no prestígio que o ex-presidente Lula readquiriu no cenário político brasileiro. Mas essa é uma aposta que meios políticos paraibanos consideram aberta, diante de novidades que estão acontecendo no radar político-eleitoral do Estado para o próximo ano.