Nonato Guedes
Em março deste ano, em declarações ao jornal “O Globo”, o deputado federal paraibano Pedro Cunha Lima, presidente estadual do PSDB e filho do ex-governador Cássio Cunha Lima, fez uma espécie de ‘profecia’ a propósito da anulação, pelo ministro Eduardo Fachin, e, depois, pelo Supremo, de condenações impostas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT): “Esse fato terá grande repercussão nas eleições de 2022. Ele (Lula) é muito forte e o fim do auxílio emergencial (benefício concedido pelo governo Jair Bolsonaro na pandemia de coronavírus) favorece o ex-presidente. Praticamente não teremos espaço para tentar construir uma terceira via no quadro político-institucional brasileiro”, obtemperou o parlamentar.
Aparentemente levando em consideração o fato novo representado pela elegibilidade de Lula no pleito do próximo ano, bem como a influência avassaladora que o líder petista ainda exerce junto a parcelas expressivas da sociedade, o filho de Cássio convocou a imprensa local, há poucos dias, para anunciar que não cogita mais lutar para ser candidato ao governo da Paraíba, como vinha proclamando aos quatro cantos. Oficialmente, o pretexto invocado foi o de contribuir para fortalecer a candidatura do ex-prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues (PSD), que os tucanos paraibanos decidiram encampar, dentro da estratégia de derrotar o governador João Azevêdo (Cidadania), candidato à reeleição. Mas, para analistas políticos, o fator determinante da desistência de Pedro foi o receio quanto a um “moedor de carne” na disputa vindoura, por causa da frente ampla que, com seu carisma, Lula poderia agregar em torno de si.
O prognóstico, pelo visto, está se confirmando. Com a perspectiva de polarizar a disputa presidencial com o presidente Jair Bolsonaro, sem dar chance a qualquer outro nome de oposição que tente se viabilizar, Lula começa a avançar eleitoralmente por bolsões políticos do Nordeste, região onde tem origens e lançou as bases do ousado projeto de transposição das águas do rio São Francisco, que chegou a ser saudado como “a redenção do povo nordestino”, por causa das calamidades cíclicas em meio a estiagens. Aqui mesmo, na Paraíba, nos últimos dias, articulou-se uma romaria de políticos de diferentes partidos rumo à Meca Lulista, dividindo-se em contatos com ele e com emissários autorizados em Brasília e São Paulo. A desculpa usada é a de se somar a Lula na liderança do “Fora Bolsonaro” nas urnas, mas o que move esses “romeiros da política” é a perspectiva de poder que o ex-presidente voltou a encarnar, livre da prisão em Curitiba e com passaporte para pleitear a volta triunfal ao Planalto.
O deputado Pedro Cunha Lima expôs a situação com clareza no desabafo a “O Globo”, ao especular que, mesmo na hipótese de não vir a se eleger em 2022, o apoio do ex-presidente Lula da Silva será definidor nas eleições ao Congresso Nacional, contribuindo para a formação de uma expressiva bancada de oposição a Bolsonaro, quer na Câmara dos Deputados, quer no Senado Federal. Depois de ter conversado com prefeitos do Sertão paraibano, bem informados sobre as oscilações da connuntura política brasileira, o filho do ex-governador Cássio Cunha Lima revelou a “O Globo”, comentando a anulação das condenações: “Não tem nem graça…Lula tem muita força”. E acrescentou que, pessoalmente, ficou tão atordoado que deixou de vislumbrar alternativa capaz de empalmar uma terceira via no processo antecipadamente radicalizado que se prenuncia. Embora seja anti-PT, Pedro Cunha Lima não é bolsonarista incondicional, e em matérias até relevantes para o governo federal tem votado de forma independente, conforme suas convicções, no plenário da Câmara.
O “Raio X” traçado pelo parlamentar tucano da Paraíba no dia 13 de março deste ano bateu com o diagnóstico repassado a jornalistas por outros deputados federais da região Nordeste, principalmente integrantes do chamado “baixo clero político”, que avaliaram que ficar contra a candidatura de Lula equivale, praticamente, a um “suicídio eleitoral”. Entre esses políticos, a lembrança de pleitos anteriores, em que Lula empenhou-se para derrotar, sobretudo, senadores que tentavam a reeleição e candidatos a senador que lhe faziam oposição em alguns Estados – inclusive a Paraíba – e logrou êxito nessa empreitada. Tudo isto em consequência do prestígio alcançado pelo líder petista ao longo de sua trajetória, em que se elegeu duas vezes à presidência da República e ainda elegeu Dilma Rousseff em 2010, reeleita em 2014, mas alvo de impeachment no Congresso.
A liderança de Lula na campanha eleitoral do próximo ano, se não houver fato excepcionalíssimo, estará mais firme e mais sólida ainda graças à reabilitação que o ex-presidente vem conquistando na Justiça, em meio ao revisionismo de processos que antes revestiam-se de extrema gravidade e que lhe custaram a prisão determinada pelo ex-juiz Sergio Moro, um dos ministros decaídos do governo de Jair Bolsonaro. Lula retorna no papel de “justiceiro” para se vingar dos que o desgastaram e o retiraram de cena de forma traumática – embora, por habilidade política, evite assumir o papel de vítima. Na verdade, encarna o perfil do governante talhado para enfrentar a crise sanitária, econômica e social e livrar o País da ameaça constante à democracia perpetrada em meio aos surtos autoritários do presidente Jair Bolsonaro. Lula quer voltar como “exorcista” dos males que se agravaram no Brasil – e parece próximo de ganhar o perfil. Já a dados de hoje, Lula é uma assombração para quem não reza na sua cartilha ou não idolatra sua biografia.