Nonato Guedes, com agências
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) agravou, sensivelmente, ontem, a crise política-institucional brasileira, ao protocolar, pessoalmente, no Senado Federal, pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, como represália ao fato deste ter ordenado a prisão de apoiadores do mandatário que estão envolvidos em atos contra o regime democrático e outras manifestações consideradas ilegais. O gesto do presidente da República foi repudiado em meios políticos e na noite de ontem o Supremo Tribunal emitiu nota repudiando o pedido de impeachment contra um seu integrante.
– O Supremo Tribunal Federal, neste momento em que as instituições brasileiras buscam meios para manter a higidez da democracia, repudia o ato do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, de oferecer denúncia contra um de seus integrantes por conta de decisões em inquérito chancelado pelo Plenário da Corte. O Estado Democrático de Direito não tolera que um magistrado seja acusado por suas decisões, uma vez que devem ser questionadas nas vias recursais próprias, obedecido o devido processo legal. O STF, ao mesmo tempo em que manifesta total confiança na independência e imparcialidade do Ministro Alexandre de Moraes, aguardará de forma republicana a deliberação do Senado Federal – ressalta a nota oficial da instituição. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já opinou que antevém a ausência de fundamentos no impeachment de Moraes.
Bolsonaro cumpriu em parte o que anunciou na semana passada ao apresentar o pedido de impeachment de Moraes. Essa é a primeira vez que um presidente da República pede o impeachment de um ministro da Corte. Bolsonaro não incluiu no pedido que foi protocolado o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral e alvo frequente de suas críticas. No documento encaminhado a Rodrigo Pacheco, Bolsonaro argumenta que o “Judiciário brasileiro, com fundamento nos princípios constitucionais, tem ocupado um verdadeiro espaço político no cotidiano do País”. Na sequência, o presidente classifica o Judiciário como “verdadeiro ator político” e afirma que “justamente por isso, deve estar pronto para tolerar o escrutínio público e a crítica política, ainda que severa e dura”.
O presidente da República questiona Alexandre de Moraes pela condução do inquérito das fake news – em 4 de agosto, o ministro do STF acolheu o pedido feito pelo TSE e incluiu o presidente da República na investigação para apurar a disseminação de notícias falsas. As decisões do TSE e do STF foram motivadas pelos repetidos ataques do chefe do Executivo às instituições. “Configura-se na espécie crime de responsabilidade pelo Excelentíssimo Senhor Ministro Alexandre de Moraes ao impulsionar os feitos inquisitoriais com parcialidade, direcionamento, viés antidemocrático e partidário, sendo, ao mesmo tempo, investigador, acusador e julgador”, pontua um trecho do documento entregue pelo Planalto ao Senado.
A crise entre Bolsonaro e o Judiciário, como recapitulou o portal UOL, vinha em alta desde que o presidente começou, ainda no ano passado, a intensificar os ataques contra o sistema eleitoral. Ao lado disso, o STF vinha tomando decisões que desagradavam os bolsonaristas como a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), que havia divulgado um vídeo com ameaças e incitações de violência física aos ministros. Por estar à frente de decisões como essa, Moraes já vinha sendo repudiado por apoiadores de Bolsonaro há mais de um ano. Barroso, por sua vez, entrou no radar do presidente nos últimos meses quando tomou, na condição de presidente do Tribunal Superior Eleitoral, a dianteira da defesa às acusações sem provas que o bolsonarismo começou a propagar entre os seguidores.
As tensões explodiram há uma semana, no último dia 13, com a prisão do ex-deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB. A medida foi uma iniciativa da PF, autorizada por Moraes, mas os apoiadores do presidente concentraram suas críticas no Supremo. No dia seguinte, Bolsonaro anunciou no Twitter que abriria processos contra Moraes e Barroso. O senador Renan Calheiros, do MDB-AL, relator da CPI da Covid, reagiu, no Twitter, ao pedido de Bolsonaro: “Nunca se viu nas democracias um desvario igual ao de Bolsonaro ao propor o impeachment do ministro Alexandre de Moraes. Não há diálogo com quem só ambiciona o confronto. Obviamente o pedido não prosperará e tem meu voto antecipado: não”, escreveu Renan. Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI, foi outro que usou as redes para se posicionar: “Bolsonaro, vá procurar o que fazer! Nós estamos com mais de 14 milhões de desempregados, 19 milhões de famintos, inflação descontrolada! Cuide dos problemas reais do país e não fique arranjando mais problemas do que nosso povo já tem”, tuitou o líder da Oposição no Senado.