Nonato Guedes
O Fórum Nacional de Governadores antecipou para hoje a reunião destinada a discutir formas de acalmar os ânimos entre o presidente da República, Jair Bolsonaro, e os ministros do Supremo Tribunal Federal, mas o ceticismo entre os participantes é grande e alcança até mesmo aliados do mandatário. O governador Ibaneis Rocha, do MDB do Distrito Federal, por exemplo, foi realista ao dizer que não acredita na possibilidade de os governadores ajudarem no enfrentamento da crise institucional. “Não vejo como. O presidente se alimenta da crise”, salientou Ibaneis em declarações ao site “Congresso em Foco”, acrescentando que é um defensor do diálogo e que as crises mostram um desencontro da política. Em meio ao desalento, há a expectativa de que sejam encontradas soluções de emergência para a crise nacional, que só faz se agudizar.
Ibaneis aborda um sentimento de desconfiança que preocupa a sociedade como um todo, diante da falta de rumos para o País decorrente da instabilidade permanente incentivada por Bolsonaro. O histórico dos últimos acontecimentos revela, inclusive, que os sinais de desespero da parte de Bolsonaro estão crescendo à medida que aumentam o seu isolamento e a falta de perspectivas que possa oferecer à população brasileira. Líderes políticos avaliam que Bolsonaro não governa, já que praticamente se dedica a incentivar conflitos entre Poderes, a fomentar tensões e, ultimamente, a desobedecer princípios legais e constitucionais, retroalimentando a vocação de “ditadorzinho” que lhe é inata e que já se desvelou nas seguidas orquestrações de Bolsonaro, lá atrás, para tentar reimplantar um regime autoritário, proclamando um autogolpe, que lhe daria plenos poderes de tirano e teria como corolário o fechamento do Supremo Tribunal Federal, do Congresso Nacional, a censura à imprensa e a reedição do malsinado Ato Institucional Número Cinco, de triste memória. Mais do que prioridades para Bolsonaro, essas são obsessões recorrentes na sua personalidade, decorrentes da paranóia e do despreparo para o comvívio democrático.
A relação entre o Executivo e o Judiciário, que já andava estremecida, azedou de vez após a decisão do presidente Jair Bolsonaro de encaminhar ao Senado pedido de impeachment contra o ministro Alexande de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, por ter ordenado a prisão de apoiadores bolsonaristas que estavam incitando, em redes sociais ou em outras manifestações públicas, atos atentatórios à democracia. Segundo o governador do Piauí, Wellington Dias, do PT, o Fórum Nacional de Governadores já estava organizando agenda para tratar sobre a proposta da reforma tributária e o projeto Governadores pelo Clima, mas decidiu antecipar a reunião “pela conjuntura sobre a crise entre os Poderes, que afeta os investimentos e piora a situação do Brasil”. O petista resumiu o espírito do encontro: “Vamos tratar sobre como podemos, de forma suprapartidária, independente de quem é governo ou oposição, contribuir para a pacificação”.
Wellington Dias aposta que o caminho para a solução é o diálogo amplo com os presidentes e líderes da Câmara e do Senado, o presidente e os ministros do Supremo Tribunal Federal. O presidente da República é excluído desse rol porque, na verdade, desde que se investiu na suprema magistratura da Nação, nunca esteve disponível para o diálogo com conteúdo e com respeito, de forma a construir uma relação republicana tanto com os gestores que são seus aliados como os que lhe fazem oposição. A postura de Bolsonaro tem piorado à medida que ele patrocina ataques sistemáticos contra instituições ou tenta jogar ostensivamente a opinião pública contra elas. O exemplo mais emblemático dessa estratégia foi o desfile militar de tropas e blindados pela Esplanada dos Ministérios em Brasília no dia em que o Congresso decidia a sorte do voto impresso, bandeira pela qual, na falta de outros argumentos, Bolsonaro se empenhou ferozmente – e também inutilmente.
A agenda de emergência que os governadores mobilizam-se para colocar em prática tem em vista, exatamente, suprir a inação do governo federal, que não debate as graves ou as grandes questões nacionais, preferindo dar ênfase a picuinhas do jogo político e interferir em decisões sobre regras para as eleições do próximo ano. Alguns parlamentares da oposição e representantes da sociedade civil estão começando a se convencer de que Bolsonaro, ao mesmo tempo em que “chantageia” com o povo brasileiro, desenvolve orquestração para ser beneficiário do confronto, mesmo que isto se dê a um custo elevado para a democracia. Wellington Dias lembra que o rumo da reforma tributária, por exemplo, é tema de preocupação porque a reforma está sendo praticamente “esquartejada” pelo governo federal. “E ainda, com grave risco de desequilíbrio da Federação, especialmente Estados e municípios, o que pode piorar ainda mais a situação do país”.
O esforço concentrado que governadores estão agilizando leva em conta a sensação de paralisação que o País enfrenta por causa do desgoverno praticado por Bolsonaro. Conforme o governador do Piauí, é urgente a reflexão de que todos perdem com a crise. “O afastamento de investidores e a paralisia do País acarretam, como consequências, mais desemprego e crise social. É preciso agir, portanto, sem deixar de lado o compromisso reiterado com a defesa da democracia e o cumprimento às Leis que regem o Estado de Direito. O movimento de governadores, independente de filiação partidária ou de tendência ideológica, sinaliza para um esboço de reação frente aos excessos e arbitrariedades do governo Jair Bolsonaro, numa ponta, e à ausência de respostas do governo que está aí para os graves desafios nacionais. Os governadores decidiram tomar as rédeas de um processo que o próprio presidente poderia estar liderando, se tivesse competência e interesse para tanto.