Linaldo Guedes
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A poesia de Eugénia Tabosa chega ao sabor do vento, como bem define o título desta coletânea (“Ao sabor do vento”, Arribaçã Editora, 2021). Em época de malabarismos na linguagem, até como forma de se impor dos poetas no cenário literário contemporâneo, Eugénia chega com uma poética cheia de musicalidade, de ritmo, sobretudo de conteúdo lírico e imagético – o que faz toda grande poesia sobreviver aos modismos.
Uma poesia que chega com um olhar desarmado, como fala em um dos poemas do livro. Como um “Voo de verão”, mas que pode muito bem ser de qualquer estação, porque é suave como uma brisa na manhã:
Da pequena janela,
olho do avião
que deslizava no ar
num aparente não-esforço
Vi a terra virar mar
e a neblina envolvê-la
Senti que rumava ao sul
e o ontem era amanhã
As nuvens eram castelos
montanhas d’outro lugar
passeei no meio delas
Sentado ia meu corpo
transportado e conformado
entre o ser anjo ou pássaro
“Prelúdio” para ninar gente grande, como diria a canção. Poesia de “Recuerdos”, mas não apenas do touro citado no poema, e sim de toda poética ausente nestes tempos de imediatismo:
No meio da praça
o touro
todo de negro
tinha morte no olhar
o toureiro
lantejoulas
meias rosa
e cortesia
na capa solta
escondia
uma espada de matar
Uma boa definição da poesia de Eugénia Tabosa vem de Eduardo Alves da Costa:
“Os poemas de Eugénia Tabosa, à primeira vista singelos, vêm impregnados de um sentimento não sentimental, uma carga emocional emanada não do ego mas do Ser. Há neles uma profundidade insondável, como se estivéssemos a deparar mapas, indícios de alguma coisa apenas entremostrada, que se insinua sem se deixar apanhar”.
E acrescenta:
“Há também, na maioria deles, o pulsar de uma saudade que transcende a realidade próxima, que remonta ao que os taoístas denominavam “Céu Anterior”, a dimensão em que dormitam as coisas antes de se manifestar neste nosso mundo, por eles denominado “Céu Posterior”. Uma versão oriental da Caverna de Platão”.
Eugénia Tabosa nasceu em Lisboa, Portugal. Viveu lá e cá cruzando o Atlântico várias vezes até se transferir definitivamente para este lado do Oceano, São Paulo, Brasil, em 2005. É licenciada em Pintura pela Universidade de Belas Artes de Lisboa. Trabalha também em Cerâmica e Azulejaria; fez restauro arqueológico e lecionou Educação Visual no ensino público por mais de 26 anos. A leitura e a escrita são paixões antigas.
A poesia de Eugénia Tabosa nos leva a aos primórdios da poética lusitana. Nos leva a Floberla Espanca, sem entrar em sua dramaticidade, e a nomes como Jorge de Sena, Camilo Pessanha, Mário de Sá-Carneiro e, claro, a Fernando Pessoa. Uma poesia moderna, romântica e simbolista. Eugénia Tabosa é a prova em livro que a poesia não se perde nas palavras para quem sabe. Ela seduz o leitor, com as palavras.
Linaldo Guedes é poeta, jornalista e editor. Com 11 livros publicados e textos em mais de trinta obras nos mais diversos gêneros, é membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras (Acal), mestre em Ciências da Religião e editor na Arribaçã Editora. Reside em Cajazeiras, Alto Sertão da Paraíba, e nasceu em 1968. É membro, também, da União Brasileira dos Escritores – Seção Paraíba.