Nonato Guedes
Embora as eleições presidenciais estejam distantes pouco mais de um ano, há movimentação nos bastidores do cenário político, principalmente em segmentos que fazem oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), sem que o mandatário dê partida a articulações mais consistentes para atrair apoios, montar palanques estaduais e consolidar uma posição competitiva para o páreo que promete ser mais acirrado do que o de 2018, quando posou de “outsider” e acabou levando o troféu no segundo turno. Bolsonaro, pelo contrário, tem perdido apoios, acumulado defecções e alimentado dúvidas, até entre aliados fiéis, quanto ao interesse concreto em disputar um novo mandato. No reverso da medalha, o presidente investe na tática de fomentar atritos com ministros de Cortes Superiores, governadores de Estados e partidos francamente adversários.
De acordo com o site “Poder360”, estrategistas situados no entorno do presidente Bolsonaro avaliam, de forma realista, que ele está em seu pior momento, tendo que se debater, ainda, com focos de desgaste disparados pela Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada no Senado para investigar supostas omissões do governo federal no combate à pandemia de coronavírus no País. São esses estrategistas políticos governistas que dizem que o encerramento da CPI da Covid, provavelmente em meados de setembro, permitirá ao Planalto recompor e reforçar o apoio no Congresso. O presidente até que fez acenos nessa direção, quando insinuou prestígio ao chamado “Centrão”, agrupamento fisiológico e conservador atuante no Parlamento. Mas não tem segurança plena quanto à aprovação de matérias do seu interesse ou à rejeição de matérias que lhe contrariam.
A partir de agora, os bolsonaristas enxergam o seguinte quadro, no chamado roteiro da reeleição: 1) reforma ministerial – até o final de 2021, mais integrantes do Centrão devem ganhar cargos. A meta é alterar até quatro pastas, entre as atuais, ou recriando antigos ministérios; 2) entorno palaciano – o presidente está sendo convencido a enviar alguns de seus “colaboradores de gabinete” para algum posto no exterior, dentro da estratégia do Centrão de “desintoxicar” o Planalto; 3) sangue-frio com o Supremo – Bolsonaro já prometeu a vários ministros que não apresentará pedido de impeachment contra Luís Roberto Barroso, do STF, como procedeu em relação a Alexandre de Moraes, e todos acreditam nessa promessa de forma moderada; 4) partido indefinido – o presidente ainda não sabe a qual sigla vai se filiar, havendo várias na disputa, mas em todas ocorrendo restrições regionais ao nome do presidente; 5) lobby pró-PSL – vários ministros dizem acreditar que a melhor opção talvez seja mesmo Bolsonaro fazer as pazes com o deputado pernambucano Luciano Bivar, que preside o PSL e retornar o partido. Dizem que seus eleitores já se acostumaram a votar no 17 e a sigla terá bom tempo de TV. O presidente estaria muito bem servido.
De acordo com o “Poder360”, “parece incrível” mas o último óbice para Bolsonaro voltar ao PSL é a antipatia mútua nutrida entre o presidente e o deputado federal da Paraíba Julian Lemos, um dos vice-presidentes do partido, que se incompatibilizou diretamente com os filhos do governante, embora, no plenário da Câmara, por convicção ideológica conservadora, apoie alguns dos projetos de iniciativa da gestão Bolsonaro. “Bombeiros” já estariam escalados para tentar resolver essa pendência e, finalmente, acomodar o mandatário numa legenda. Sobre os palanques estaduais, a versão que se tem é que as negociações estão mesmo atrasadas, mas os bolsonaristas dizem acreditar que até dezembro deslancham vários acordos nos Estados. Em alguns Estados, são esperados “emissários bolsonaristas com habilidade” para quebrar arestas locais e garantir palanques para o capitão.
A questão da economia também está no radar das avaliações dos bolsonaristas. Apesar das incertezas (dólar e juros altos, inflação e crise hídrica), o prognóstico é de que haverá crescimento em 2021 e algum avanço em 2002, o que seria suficiente para a volta do “feel good factor” nos eleitores, sobretudo por causa do fim da pandemia do coronavírus, em meio ao avanço da vacinação. Esse ambiente beneficiaria Bolsonaro. O adversário predileto dos bolsonaristas, apesar de hoje ser fortíssimo, continua sendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. A reedição do confronto (“ou-eu-ou-ele”) é a estratégia que deve ser reeditada, até para efeito de polarização, impedindo a ascensão da chamada terceira via, ou opção de centro. A reportagem do “Poder 360” destaca que a realidade pode não ser exatamente como desejam os governistas, mas não deixa de impressionar o fato de que tantos aliados do presidente estejam sustentando essa estratégia.
“Todos acreditam que o maior desafio de Bolsonaro é “vencer a si próprio”, ou seja, controlar-se, não reagir ao que considera errado no Supremo Tribunal Federal, não apresentar outros pedidos de impeachment. O presidente já prometeu várias vezes que vai se conter. Depois, partiu para o ataque”, acrescenta a reportagem. Em meio a tantas oscilações de temperamento e de postura do presidente da República, reina o consenso de que um bom teste pode ser o Sete de Setembro. Até aqui, dentro da estratégia de tensão permanente que adora cultivar, Bolsonaro incentiva manifestações de rua de ativistas, sobretudo dos mais radicais, que teriam como alvos prediletos ministros do Supremo Tribunal Federal. Para analistas isentos, além de se controlar mais, Bolsonaro precisa acabar de uma vez por todas com narrativas autoritárias. Tais manifestações corroem a sua credibilidade e passam a ideia de “golpismo” em marcha. Como se vê, um vasto contencioso para tão pouco tempo de adaptação pelo presidente da República. Além do que, há uma pergunta pairando no ar: e se a CPI não acabar em “pizza”?