Nonato Guedes
Tem ficado evidente que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva empreende uma verdadeira ginástica para atrair a maior soma possível de apoios à sua virtual candidatura a presidente da República pelo PT em 2022 e é nesse contexto que deve ser entendido o seu gesto de procurar o governador da Paraíba, João Azevêdo (Cidadania), num evento do Consórcio Nordeste, em Natal, e confirmar com ele uma agenda oficial em João Pessoa, na segunda rodada de viagens do ex-mandatário a esta região, a ocorrer em setembro. A Paraíba ficou de fora, junto com dois outros Estados, do roteiro inicial de conversas que Lula idealizou com gregos e troianos, a pretexto de discutir a conjuntura nacional, mas, na verdade, dentro da tática de agregar adesões ao seu projeto, senão já no primeiro, com certeza no segundo turno da disputa vindoura. Ao irromper na reunião do Consórcio para um abraço caloroso no gestor paraibano e conversar ao pé do ouvido, Lula traduziu a importância que dá à presença de João no seu palanque.
O ex-presidente deseja o apoio de Azevêdo por algumas razões plausíveis. A primeira é que em 2018, mesmo tolhido na sua liberdade, já que estava preso na Polícia Federal em Curitiba, manifestou apoio ao atual governador, que foi eleito em primeiro turno e concorreu pelo PSB, com o aval ostensivo do então governador Ricardo Coutinho, hoje fazendo o caminho de volta aos quadros do PT. Embora Azevêdo e Ricardo estejam rompidos e o primeiro tenha migrado para o Cidadania, Lula sabe que o governador lidera pesquisas preliminares de intenção de voto na corrida pela reeleição no próximo ano, dada a boa aprovação de sua gestão. Além do mais, Azevêdo é oposição declarada ao presidente Jair Bolsonaro, manifestou voto pessoal em Lula já no primeiro turno e pediu, até, autorização ao seu partido para se compor com o líder petista. Para completar, Azevêdo acolhe petistas em cargos da sua administração, com o conhecimento da cúpula nacional.
Como Lula vai fazer para conciliar apoios distintos nos vários Estados, é um quebra-cabeças que somente o pré-candidato do PT deve resolver mais na frente. Lula não deverá interferir nas disputas estaduais ou regionais que em muitos casos acontecerão entre apoiadores da sua candidatura, mas poderá abrir exceção para anunciar apoios a candidaturas a governos se isto estiver pacificado na sua tática que privilegia a própria volta ao Palácio do Planalto. O que ele não quer é dispersar acenos de reforço à sua candidatura. Como definiu o jornalista Renato Rovai em artigo na “Revista Fórum”, o ex-presidente está fazendo de tudo para abrir portas mesmo com interlocutores que não vão lhe apoiar no primeiro turno, para construir desde já um grande movimento que deixe Jair Bolsonaro isolado na disputa final. Essa tática exige malabarismo, habilidade ímpar, mas jogo de cintura é o que não falta a Lula, inclusive para sustentar conversas fiadas enquanto ganha tempo para mapear situações nos Estados.
– O périplo pelo Nordeste está servindo para que Lula teste essa fórmula na região onde tem mais apoio. Se conseguir fazer uma articulação que vá da esquerda aos partidos da terceira via, buscando que as diferenças regionais não atrapalhem o projeto nacional, ele vai partir para o ataque em todas as outras regiões do país. E, ao que tudo indica, vai deixar São Paulo para os 45 minutos do segundo tempo, porque a decisão de São Paulo será consequência dos arranjos em outros Estados e não ao contrário. Lula sabe que joga sua última cartada eleitoral e não está disposto a errar. Como sabe que o principal erro é o de subestimar o adversário, esse erro ele já mostra que não vai cometer – acrescenta Rovai, alertando que, ao contrário de alguns analistas políticos, Lula não trata o atual presidente como um morto-vivo, reconhecendo o tamanho da força do Estado brasileiro e o quanto ele pode ser usado para pavimentar uma candidatura à reeleição.
O colunista analisa que Lula também sabe que Bolsonaro ainda não perdeu seu núcleo duro de apoio e que pode, se vier a mantê-lo nos atuais patamares, ter aproximadamente 35% no primeiro turno das eleições, o que lhe garante a ida para o segundo turno e lhe permitirá ir com tudo para cima do petista, com suas fake news e ameaças. Lula está, entre outras coisas, apontando o seguinte para o PT e suas bases: 1) Que vai fazer alianças para além da esquerda e da centro-esquerda na eleição de 2022; 2) que pretende fazer um governo amplo, que não busque o revanchismo caso seja eleito; 3) que não considera um passeio a eleição de 2022 e nem acha que Bolsonaro já está derrotado por antecipação. É por ver tudo o que está vendo que ele busca patronos de uma aproximação que terá de fazer com o mercado e parte das elites, tanto para derrotar Bolsonaro no segundo turno, quanto para garantir a governabilidade depois.
Enquanto os concorrentes estaduais e regionais se debatem, Lula vai abrindo caminho entre eles para sedimentar a sua própria candidatura à presidência da República. Esta é a sua maior ambição, a sua prioridade máxima, depois de ter assistido ao desgaste do Partido dos Trabalhadores nos últimos anos, ao impeachment da presidente Dilma Rousseff e do estágio a que foi submetido, tendo que ficar recolhido por 580 dias numa sala da Polícia Federal em Curitiba. A “revanche” para Lula significa voltar ao poder nos braços do povo – e ele não quer desperdiçar sua última grande oportunidade.