Nonato Guedes
À medida que se aproxima o prazo de definição partidária do presidente Jair Bolsonaro, como condição indispensável para que ele possa concorrer à reeleição, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) confirmou ter oficializado a proposta de ingresso do mandatário na sigla. com garantia plena de influência, tal como ele vinha reivindicando para, finalmente, optar. Bolsonaro, que foi eleito em 2018 pelo PSL (Partido Social Liberal), em vias de se fundir com o Democratas, está sem partido desde que, internamente, divergiu da cúpula. De lá para cá, o presidente tentou fundar um partido, que se chamaria Aliança pelo Brasil, cuja plataforma carregaria nas tintas do conservadorismo e no alinhamento com a ideologia de direita, mas o projeto não avançou, o que abriu terreno para exame de outras alternativas e para propostas como a do PTB.
O Partido Trabalhista, na atual fase da conjuntura nacional, é presidido pelo ex-deputado federal Roberto Jefferson, um extremista que está preso há um mês e meio em Bangu, no Rio de Janeiro, por propagar ameaças de morte a ministros do Supremo Tribunal Federal e incitar atos antidemocráticos. Jefferson é figura carimbada da política brasileira, tendo ganho notoriedade quando fez parte da tropa de choque atuante na Câmara, na década de 90, para barrar o impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello, o que não teve êxito. Posteriormente, Jefferson ficou em evidência na história como delator do esquema do mensalão, patrocinado pelo Partido dos Trabalhadores e do qual o próprio PTB fazia parte. Na Paraíba, a legenda vinha sendo presidida pelo deputado federal Wilson Santiago, que foi destituído do cargo por contrariar orientação da cúpula nacional na votação de matérias que afetavam o governo federal. Com a saída de Santiago, assumiu o PTB o comunicador Nilvan Ferreira, ex-candidato a prefeito de João Pessoa e defensor do bolsonarismo.
De acordo com versões da mídia sulista, a sugestão para que Bolsonaro saia candidato à reeleição pelo PTB foi feita a interlocutores diretos do chefe do Executivo no período em que ele estava nos Estados Unidos para a Assembleia Geral da ONU. Integrantes do partido também sondaram recentemente ex-integrantes do governo que possuem perfil ultrarradical, como os ex-ministros da Educação, Abraham Weintraub, e das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, para saber se teriam interesse em se filiar à sigla de Roberto Jefferson, que nos últimos anos deu uma guinada ideológica reacionária. Pela proposta apresentada aos assessores próximos do presidente da República, além de sair candidato à reeleição pelo partido, Bolsonaro teria assentos assegurados na executiva nacional da legenda e o poder de indicar candidatos ao Senado em vários Estados. Na Paraíba, o PTB deverá lançar o próprio Nilvan a deputado federal e analisa nomes para concorrer à Assembleia Legislativa.
Historiadores e estudiosos do século 20 no Brasil já afirmaram que ao longo de 130 anos de República jamais um presidente mudou de partido durante o seu mandato, em razão de uma dissidência, referindo-se à iniciativa de Bolsonaro de abandonar os quadros do PSL por causa de uma acirrada disputa que sustentou com o presidente nacional da sigla, Luciano Bivar (PE). Se ele ingressar no PTB, será a nona sigla a que Bolsonaro se associa, considerando trocas de legendas, fusões e mudanças de nome de partido desde a entrada oficial do capitão reformado na política em 1989. A Primeira República (1889-1930) também teve casos peculiares na relação entre presidentes da República e partidos. Em 1893, um ano antes de ocupar o Palácio do Itamaraty, sede do governo federal no Rio, Prudente de Moraes criou o Partido Republicano Federal sem se desligar de sua legenda anterior, o PRP, Partido Republicano Paulista, um arranjo permitido pela legislação da época.
A “diáspora” de Bolsonaro por partidos políticos, geralmente de feições conservadoras e características fisiológicas, refletidas na composição com o poder de plantão, traduz o desapreço ou o descompromisso do mandatário com relação a princípios que possam fortalecer a legitimidade das agremiações no sistema político-institucional do país. Ele não escolhe filiar-se a partidos por afinidade doutrinária mas, sim, por interesses e conveniências de ocasião. Ao optar pelo PSL em 2018, repetiu a façanha de Fernando Collor em 1989, quando se elegeu presidente a bordo de um certo PRN, intitulado Partido da Reconstrução Nacional, que era apenas legenda de aluguel. Eleito, Collor abandonou o PRN à própria sorte, porque, para ele, já não tinha mais serventia. Bolsonaro ainda ensaiou movimentos para retornar ao PSL e chegou a ter acenos de acolhida, mas tudo esbarrou na sua exigência de ter plenos poderes ou controle absoluto da legenda, promovendo, inclusive, a expulsão de desafetos como o deputado federal paraibano Julian Lemos. No PTB, as portas estão escancaradas, como o presidiário ex-deputado Roberto Jefferson tem sinalizado a Bolsonaro.