Nonato Guedes
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na maratona que empreende para tentar voltar ao Palácio do Planalto, tem tido, ao mesmo tempo, diferentes interlocutores políticos nos Estados e no Distrito Federal, que geralmente são apoiadores declarados ou simpáticos ao seu projeto para 2022 e estão agrupados em partidos distintos, não só da esquerda, mas também do centro. Na Paraíba, tem-se a impressão que o ex-governador Ricardo Coutinho é o interlocutor preferencial de Lula, que fez questão de abonar sua ficha de refiliação ao PT. Mas, há, também, o governador João Azevêdo (Cidadania), o ex-prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PV), e o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB). Este tem sido “tomado” por Lula como um dos interlocutores privilegiados, fato que chama a atenção da mídia e dos setores políticos. Pode ser sintomático de novidades nas articulações políticas do próximo ano envolvendo o nosso Estado.
Em pouco tempo, já houve dois encontros envolvendo o ex-presidente Lula e o senador Veneziano, o primeiro em São Paulo, o último esta semana em Brasília, durante um jantar oferecido pelo ex-senador Eunício de Oliveira (CE) em sua residência no Lago Sul. No dizer de Veneziano, foi um momento importante, “no qual debatemos assuntos relevantes para o país”. Na ocasião, o parlamentar emedebista paraibano estava no exercício da presidência do Senado Federal, em virtude de viagem oficial do presidente Rodrigo Pacheco (DEM-MG) à Itália, num período de definições sobre matérias polêmicas em tramitação no Parlamento. Em paralelo, o Senado deu prosseguimento esta semana à CPI da Covid, colhendo depoimentos que comprometeram cada vez mais o negacionismo e a omissão do governo de Jair Bolsonaro em relação à pandemia e respingaram no cardiologista paraibano Marcelo Queiroga, que segue no Ministério da Saúde, à parte todo o fogo cruzado que enfrenta.
Interessava a Lula, portanto, dialogar com Veneziano, que, em termos efetivos, é primeiro vice-presidente do Senado e participa de deliberações referentes à pauta de demandas em discussão e votação no Parlamento. Mas o parlamentar do MDB registrou, em declarações, que o encontro mostrou o estreitamento “de laços preexistentes”. E acrescentou: “Os registros fotográficos dizem muito e evidenciam atenções e carinho, de uma amizade que vem desde 2002 e se reforça a cada dia”. Nesse diapasão, Veneziano recordou as atenções que o ex-presidente demonstrou em relação à Paraíba, especialmente com Campina Grande, numa época em que ele era o prefeito da Rainha da Borborema e o petista era o mandatário. “Foram muitos investimentos importantes que tivemos, graças a esta atenção e carinho que o presidente sempre teve. As parcerias estabelecidas muito favoreceram os campinenses e paraibanos”, pontuou o parlamentar, num “depoimento histórico”.
A verdade é que Veneziano ganha deferências especiais graças à posição de destaque que ocupa na Mesa Diretora do Senado e também porque é senador influente, com mandato até o final de 2024, e, em paralelo, ascendeu à presidência do diretório estadual do MDB na Paraíba, no vácuo da morte do ex-senador José Maranhão. Mais: Veneziano tem sido lembrado como opção para a hipótese de disputar o governo do Estado no próximo ano, apesar da promessa que anunciou de apoiar a reeleição de João Azevêdo. Lula tem interesse, caso seja eleito presidente, em contar com apoio de senadores para aprovar projetos que vierem a ser esboçados pelo seu governo, e já atua preliminarmente buscando definir apoio a nomes viáveis, fora do PT, à eleição ao Senado. Na hipótese de uma candidatura de Veneziano ao governo do Estado, não haveria maiores dificuldades, em termos de composição, para Lula, que no passado fez o PT local coligar-se com o PMDB maranhista mesmo em detrimento de Ricardo Coutinho, como se deu em 2010.
Em última análise, o ex-presidente Lula tem consciência da tradição política do MDB paraibano, uma espécie de “Fênix política”, que em 2020 ressurgiu em alto estilo na disputa pela prefeitura de João Pessoa, colocando o comunicador Nilvan Ferreira no segundo turno do páreo que acabou vencido por Cícero Lucena, do PP. Como vem deixando em segundo plano candidaturas próprias do PT a governos estaduais, priorizando eleição de senadores e deputados federais, Lula estará à vontade, na Paraíba, para se compor com o governador João Azevêdo ou com o próprio Veneziano, caso estes dois venham a se confrontar – uma hipótese sempre admitida diante de ruídos constantes na comunicação entre o senador e o chefe do Executivo, cujo estopim parece ter sido a tomada do “Podemos” em Campina Grande do grupo que era liderado por Ana Cláudia, mulher de Veneziano, em benefício de aliados de confiança de João Azevêdo.
Sobre a relação entre Lula e Veneziano, que “tem se estreitado”, no dizer do senador emedebista, ao comentar recentes atenções de que se sentiu alvo, cabe lembrar que o ex-presidente demonstra ter apagado resquícios do episódio em que Veneziano, como deputado federal, votou pelo prosseguimento do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016. Na ocasião, Veneziano patenteou que estava votando “com equilíbrio e moderação” e, ao mesmo tempo, com “responsabilidade e jurídica e consciência política”. Foram palavras que aparentemente calaram fundo junto ao ex-presidente Lula. que produziu a narrativa do “golpe” contra Dilma por honra da firma, mas que ultimamente tem se reconciliado com inúmeros outros políticos que durante muito tempo figuraram no índex do PT nacional como supostos algozes da ex-mandatária. Lula tem urgência em passar uma borracha em fatos desagradáveis, porque também tem urgência em voltar ao comando do Planalto.