Uma reportagem do UOL cita o ex-senador paraibano Cássio Cunha Lima (PSDB) e o ex-deputado federal José Múcio Monteiro (Pernambuco) como dois políticos profissionais contratados pela fabricante de cigarros Philip Morris para atuar em nome da empresa perante a Anvisa, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. José Múcio foi ministro do governo Luiz Inácio Lula da Silva e dos quadros do Tribunal de Contas da União, tendo sido aposentado da Corte em dezembro de 2020. A reportagem de Eduardo Militão e Rafael Neves lembra que Cássio Cunha Lima foi governador da Paraíba.
Diz o texto: “Aposentado da Corte em dezembro de 2020, Múcio foi recrutado pela multinacional em março deste ano, uma semana depois de a empresa sofrer uma derrota para registrar um produto que “alimenta” uma espécie de cigarro eletrônico. Já Cássio tem mais tempo de casa: foi contratado em 2019. Questionado pelo UOL, o ex-senador disse que “por questões concorrenciais” não comenta “assuntos relativos aos (seus) clientes”. Como mostrou o UOL, a Anvisa se prepara para julgar um processo que reavalia a proibição aos cigarros eletrônicos e aos demais dispositivos eletrônicos para fumar no Brasil, em meio à mudança na Gerência de Tabaco, que fiscaliza o setor. Desde 2019 a Anvisa proíbe a venda, a importação e a propaganda destes aparelhos no Brasil.
Neste ano, a Philip Morris já teve negado por duas vezes um pedido de registro para um produto que abastece um cigarro eletrônico produzido pela empresa, o IQOS, sigla para I Quit Original Smoking, ou “eu parei com o cigarro original”. Nele, o tabaco é aquecido em vez de queimado, razão pela qual é chamado de “produto de tabaco aquecido”. A primeira negativa foi feita pela Gerência de Tabaco em 26 de fevereiro passado. Os técnicos recusaram-se a autorizar a venda dos “heets”, que se assemelham a minicigarros e “alimentam” o IQOS. Na semana seguinte, a empresa contratou Múcio, segundo ele informou ao UOL.
A Anvisa prevê concluir até dezembro um processo geral, não apenas para a Philip Morris, sobre regulação de dispositivos eletrônicos para fumar. A Philips Morris não comentou a contratação dos dois consultores. Sete dias depois da negativa, em 5 de março, Múcio e Cássio Cunha Lima tiveram reunião com Cristiane Jourdan Gomes, a diretora a quem a gerência está subordinada. O presidente do Sinagências (Sindicato Nacional das Agências Reguladoras) Cleber Ferreira disse ter notado os movimentos. “Nessas reuniões tem até lobista. Tem aquele ex-senador Cássio Cunha Lima. Eu vi que ele virou lobista da indústria de tabaco e foi bater ponto lá também”, afirmou Cléber. A assessoria da Anvisa afirma que a reunião foi uma “cortesia para parabenizar” Cristiane Jourdan por ter assumido o cargo de diretora, cuja posse foi em 11 de novembro, quase quatro meses antes.
A assessoria da Anvisa afirmou que, de modo geral, todas as reuniões são realizadas por agendamento e atendidas “à medida que são solicitadas”, independentemente da “origem do pedido”. Semanas após o encontro, a Philip Morris recorreu da decisão da Gerência de Tabaco. Houve encontro de outros representantes da empresa com Cristiane e a gerente Stefania Pires. Mas o recurso foi negado pela Gerência de Recursos em 25 de julho. Três dias depois, houve novo recurso da Philip Morris. No dia seguinte, 29 de julho, Stefania foi afastada do cargo. Em seu lugar assumiu um funcionário de fora da agência, Luiz Bernardo Viamonte. Como a Anvisa está na reta final de análise de uma série de processos ligados a cigarros eletrônicos, os servidores estranharam a “pressão”. Cleber Ferreira declara: “A gente nunca viu nada parecido com isso”. O UOL pediu informações à Philip Morris sobre a contratação de Múcio e Cássio mas não obteve esclarecimentos.