Linaldo Guedes
linaldo.guedes@gmail.com
Há algo de místico na poesia de W. J. Solha!
Não no sentido religioso, embora não deixe de ser também pelo tom reverencial com que devamos ler tal poesia.
Mas no sentido de sobrenatural, de algo misterioso que não encontra nada parecido na poesia que lemos nesse mundo terrestre.
É como o “mistério” que construiu a Capela Sistina, principalmente os afrescos e o teto, pelas mãos de Michelangelo.
Mãos é uma forma simplória de definir um trabalho que não tem definição nas palavras humanas.
Pois bem, a poesia de Solha me chega como se fosse o teto da Capela Sistina. Como se tivesse um Deus em cada página separando a Luz das Trevas.
É assim que vejo a poesia de Solha. E esse “1/6 de Laranjas Mecânicas, Bananas de Dinamite” confirma essa minha impressão.
Solha parte, “ab ovo”, do princípio, ao negar o início de tudo como nos foi ensinado, na inquietude do eu-lírico que percorre todo o livro com seus questionamentos. Uma inquietude que se permite a sacadas que só os grandes mestres conseguem ter com tanta simplicidade, como ao falar da soma que existe de “ave” e “Maria” em toda mulher.
Solha nos permite, com sua poética incomum, perceber nossos atos falhos mais que freudianos, porque remontam a algo que queremos compreender: o mistério da vida, não da morte.
Mistério que passa por Tamar e Raabe – prostitutas que Solha vê como necessárias na genealogia de Cristo. Assim como Moisés e Elias ao lado de Jesus, o mesmo Moisés que ilustra a capa dessa obra com a banana de dinamite a mostrar que não pode ser visto apenas como vítima.
Solha busca esse mistério em tanta coisa que a gente termina a leitura do livro meio que sem fôlego: Angelina Jolie, Lula, Bolsonaro, parteiras na caatinga paraibana, estrada de ferro de Sorocaba, Shakespeare, Dom José Maria Pires, Dom Casmurro, Camões…
“Somos o mais fascinante dos animais”, diz em determinado momento do longo poema. Somos? Solha é a melhor definição dessa assertiva. Sua poesia não precisa de tradução ou de notas de rodapé, como ele quis me fazer ver uma vez. Isso porque sua poesia não se explica pela leitura sistemática dos humanos, nem em novos livros ou alfarrábios preciosos. Sua poesia traz o mesmo mistério da Capela Sistina. Se lê e se sente que tem algo além, muito além da própria poesia! Há o mistério! O mistério da vida, da arte, que é vida. Não seriam os artistas semideuses?
Linaldo Guedes é poeta, jornalista e editor. Com 11 livros publicados e textos em mais de trinta obras nos mais diversos gêneros, é membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras (Acal), mestre em Ciências da Religião e editor na Arribaçã Editora. Reside em Cajazeiras, Alto Sertão da Paraíba, e nasceu em 1968.