Nonato Guedes
Demonstrando a sua extrema dificuldade para enquadrar-se aos ditames partidários na condição de filiado, ainda que de filiado ilustre, o presidente Jair Bolsonaro informou, ontem, do exterior, onde está passeando com familiares, que suspendeu a filiação ao PL, o Partido Liberal comandado pelo ex-mensaleiro Valdemar Costa Neto. A decisão abrupta ocorreu depois de Bolsonaro ter dito na segunda-feira, dia 8, que estava “99% fechado com o PL”, seguindo-se a confirmação da filiação pela equipe de Valdemar Costa Neto e o anúncio de um evento no dia 22 deste mês para o ato de filiação. Apurou-se que desde o anúncio, o vereador Carlos Bolsonaro (RJ), filho do presidente, passou a monitorar a reação da base política da família nas redes e repassou ao pai as críticas devido à condenação de Valdemar Costa Neto no processo do mensalão e sua proximidade remota com o PT, entre outras críticas.
No domingo, durante viagem nos Emirados Árabes, Bolsonaro disse que ainda tinha muito para conversar com Valdemar antes da confirmação da filiação e não garantia mais o evento no dia 22. Em seguida, o presidente do PL confirmou o recuo. “Após intensa troca de mensagens na madrugada deste domingo, 14, com o presidente Jair Bolsonaro, decidimos, de comum acordo, pelo adiamento da anunciada cerimônia de filiação”, revelou Valdemar. Publicamente, segundo o UOL, tanto o presidente como o senador Flávio Bolsonaro, seu filho, citaram que a mudança ocorre por uma falta de acordo em relação ao nome que disputará o governo de São Paulo e ao apoio do PL a candidaturas com candidatos da esquerda no Nordeste. Ao portal R7, Bolsonaro disse que está “com um nó em São Paulo”. Flávio também citou uma nota do PL que autorizou as executivas a apoiarem partidos considerados “impossíveis” pela família Bolsonaro, mas o senador amenizou o grau de atrito com o PL, dizendo que após nova rodada de negociações no retorno ao Brasil, acredita que os problemas são “contornáveis”.
Nos bastidores, porém, interlocutores do presidente avaliam que será muito difícil um novo acordo e contam uma história diferente. Em reunião na quinta-feira passada, integrantes do PL já tinham informado ao presidente que desistiram de apoiar o nome de Rodrigo Garcia para o governo de São Paulo. Garcia é vice do governador de São Paulo, João Doria, além de possível adversário na eleição de 2022. Integrantes do PL também relatam que a vontade do presidente de lançar o nome do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, para o governo paulista, vai contra a vontade do próprio ministro, que deseja disputar uma vaga ao Senado. O certo é que os movimentos das últimas 48 horas foram considerados totalmente inesperados tanto no PL como por pessoas próximas ao presidente, que davam a filiação como resolvida e a situação em São Paulo como “pacificada”. Ninguém se arrisca agora a garantir que a filiação de Bolsonaro e seu grupo vá realmente acontecer ao PL. Ao mesmo tempo, especula-se que uma mudança brusca nesse anúncio pode tirar o PL da base de apoio do presidente em breve e rachar a bancada.
Bolsonaro chegou a afirmar que tem muita coisa a conversar ainda com Valdemar Costa Neto. “Afinal de contas, não é a minha bandeira que vai ficar isolada no partido dele. Queremos um projeto de Brasil e o discurso não é apenas o meu, mas do presidente do partido também, para que possamos estar perfeitamente alinhados”, comentou o presidente. Aqui, na Paraíba, a notícia do impasse nas negociações para a filiação de Jair Bolsonaro ao PL teve o efeito de uma ducha fria no ânimo de dirigentes do partido e de políticos bolsonaristas que vinham admitindo migrar para o Partido Liberal, na expectativa de se beneficiar de ações do governo federal. O partido é presidido no Estado pelo deputado federal Wellington Roberto, que num primeiro momento chegou a se animar com a possibilidade, até, de lançamento de candidaturas próprias ao governo e ao Senado, tendo colocado o nome do seu filho, Bruno Roberto, para essa última perspectiva.
Expoentes bolsonaristas da Paraíba que estão filiados ao PTB, PSL e Patriota apostavam fichas na filiação do presidente da República nos respectivos partidos em que atuam. Assim foi com o comunicador Nilvan Ferreira, que se destacou nas eleições para prefeito de João Pessoa em 2020 quando avançou para o segundo turno contra Cícero Lucena, do PP, afinal consagrado nas urnas, ou com o deputado estadual Walbber Virgolino, do Patriota, que também concorreu à prefeitura da Capital e com o deputado Cabo Gilberto Silva, do PSL, que admitiu seguir Bolsonaro incondicionalmente em sua nova opção. Até mesmo o deputado Moacir Rodrigues, irmão do ex-prefeito de Campina Grande, Romero (PSD), que deu sinais de desistir da candidatura ao governo do Estado, opinou que estava pronto a acompanhar Bolsonaro.
A suspensão da filiação de Bolsonaro ao PL é mais um capítulo na odisseia que o presidente da República empreende para fixar-se numa legenda a fim de concorrer à reeleição em 2022. Desde que deixou o PSL, pelo qual foi eleito em 2018, ele tem cortejado siglas distintas e chegou a admitir retorno aos quadros do PSL desde que tivesse o controle absoluto da agremiação e que a legenda lhe entregasse de bandeja a expulsão do deputado federal paraibano Julian Lemos, que se incompatibilizou com o presidente por comprar brigas, publicamente, com seus filhos. O PP (Partido Progressistas), a que Bolsonaro já foi filiado, também entrou no seu radar, mas ele não sentiu segurança quanto ao domínio dos espaços da legenda e do lançamento de candidaturas nos Estados. Foi quando cogitou instituir um novo partido, o Aliança pelo Brasil, mas não teve força para mobilizar apoiadores e conseguir assinaturas em tempo útil para viabilizar a legenda. No universo político brasileiro, a expectativa é quanto às cenas dos próximos capítulos dessa odisseia de Bolsonaro em busca de um partido para chamar de seu.