Nonato Guedes
A senadora Simone Tebet, do MDB-MS, anunciou esta semana que é pré-candidata – a única mulher, até o momento – à presidência da República e assumiu um discurso que a muitos soou como independente. Mas, na prática, o MDB é uma legenda que integra a base de apoio do governo do presidente Jair Bolsonaro. Dados do Radar do Congresso, divulgados pelo site “Congresso em Foco” indicam que, na Câmara e no Senado, os parlamentares ligados à legenda mantêm um alinhamento com as orientações do governo em 88% nas duas Casas. Tal alinhamento do MDB com a pauta governista é acima da média da Câmara, que hoje tem alinhamento a Bolsonaro em 75% das votações, e no Senado, com média de 83%.
Para consolidar os referidos números, o Radar, ferramenta que analisa dados sobre as votações de parlamentares na atual legislatura, colheu subsídios referentes a 1.143 votações da Câmara dos Deputados e a 270 votações no Senado desde o início da atual legislatura em 2019. Todos os 34 deputados emedebistas são classificados, pelo sistema da plataforma, como “de base do governo” por terem se alinhado em mais de 75% das votações, como orientou o poder Executivo na Câmara dos Deputados. Dois deputados dividem o topo da lista de alinhamento: Rogério Peninha Mendonça (SC) e Osmar Terra (PR), que, inclusive, chegou a ser ministro da Cidadania por 13 meses durante o governo Bolsonaro, além de ser apontado pela CPI da Covid como uma fonte de desinformações sobre a pandemia. Ambos compartilham uma taxa de alinhamento de 97%.
No Senado, onde Tebet pontifica, o alinhamento tende a ser maior por ser uma Casa onde prevalece mais o acordo. Mesmo lá, o MDB supera a média: 14 senadores estão classificados como “base do governo”, enquanto apenas dois nomes estão pouco abaixo deste limiar. O levantamento mostra que o senador paraibano Veneziano Vital do Rêgo, vice-presidente do Senado, votou com o governo em 74% das vezes, enquanto sua mãe, Nilda Gondim, também do MDB, em 67%. Nilda Gondim assumiu a titularidade do mandato na condição de suplente, com a morte de José Maranhão, por complicações da Covid-19. A própria pré-candidata a presidente da República Simone Tebet registra um alinhamento com o governo em 86% dos casos.
Uma matéria do “Congresso em Foco” revela que a bancada do MDB, a maior do Senado, tem contradições dentro do grupo: o líder do governo, Fernando Bezerra Coelho (PE) faz parte da bancada e, sem nenhuma surpresa, votou com o governo em 100% das vezes. Renan Calheiros (AL), um dos maiores algozes da família Bolsonaro no Senado e relator da CPI da Covid, é o líder da maioria na Casa, e votou com o governo em 83% das vezes – cinco em cada seis. Eduardo Gomes, do Tocantins, líder do governo no Congresso Nacional, tem 97% de acompanhamento com o oficialismo. No Senado, entre os partidos com mais de um representante, o MDB é o quarto mais alinhado com o governo Bolsonaro, atrás apenas do Democratas (93%), PP (92%) e PSD (89%). As bancadas do Patriota (96%), PSC (95%), PSL (92%) e Republicanos (89%) tem até alinhamento mais significativo, mas possuem apenas um senador cada um.
A pré-candidata a presidente da República pelo MDB faz parte de uma das legendas mais tradicionais do país, que ocupou o cargo de chefia de Estado em três substituições de presidentes: com José Sarney (1985-1990) no lugar de Tancredo Neves, Itamar Franco (1992-1995), sucessor de Fernando Collor de Mello, e Michel Temer (2016-2019), sucedendo Dilma Rousseff. No período da ditadura militar, em que predominou unicamente o bipartidarismo, o MDB destacou-se na oposição ao regime, empalmada, sobretudo, por um grupo de parlamentares denominados “autênticos”, entre os quais figurava o paraibano Marcondes Gadelha, que posteriormente filiou-se ao PFL e se elegeu senador. Os “autênticos”, na Câmara, denunciaram torturas contra presos políticos, violações de direitos humanos e levantaram bandeiras de impacto como a da Constituinte e das eleições diretas. Posteriormente, a legenda passou a denominar-se PMDB e conquistou governos de Estados importantes do país como São Paulo e Minas Gerais, também infligindo derrotas ao poder de plantão no Senado.
Simone Tebet, em suas falas no lançamento como pré-candidata do MDB às eleições de 2022, deu ênfase a temas como responsabilidade fiscal e combate à fome. Talvez para aparentar maior credibilidade no papel de candidata ao Planalto, fez críticas ao atual governo, afirmando que ele não tem responsabilidade social e defendeu a necessidade de resgate democrático no Brasil, o que foi entendido como alusão crítica a atos considerados autoritários, atribuídos ao presidente Jair Bolsonaro e a seu governo. Integrante da bancada ruralista, a senadora considerou desastrosa a política ambiental do presidente e pediu a preservação do meio ambiente. A pré-candidatura de Simone foi articulada pela ala do partido mais ligada ao presidente da sigla, Baleia Rossi (SP) e enfrenta resistências de outras facções que se inclinam por aliança com Luiz Inácio Lula da Silva. A posição corrente no MDB é que seu nome deve ser testado para que o partido avalie o desempenho e receptividade que terá nos próximos meses, e, assim, tome a decisão de mantê-la ou não na disputa no início do ano que vem, possivelmente até março.