Nonato Guedes
A candidatura da vice-governadora Lígia Feliciano (PDT) ao governo do Estado, embora ganhe espaços na mídia, ainda constitui um balão de ensaio, um projeto em construção que, para se viabilizar, precisa agregar consensos mais sólidos e apoios mais consistentes. Vice-governadora do Estado pela segunda vez (a primeira foi no governo de Ricardo Coutinho, quando este era filiado ao PSB) e mulher do deputado federal Damião Feliciano, reconhecido pela habilidade como articulador político nos bastidores, Lígia tem competência para exercer o governo, o que já ficou demonstrado nas vezes em que ascendeu à titularidade, tanto na gestão passada como na gestão atual de João Azevêdo (Cidadania). Foi figura central em negociações com investidores do exterior para atraí-los a empreender na Paraíba, aproveitando as potencialidades que o território oferece e os incentivos fiscais acenados pelo poder público.
Além do mais, é uma mulher sensível, comprometida com as causas das camadas mais pobres da população, o que é reforçado pela sua atuação como médica e pelo conhecimento de problemas cruciais que afetam a vida do Estado. No seu histórico, Lígia registra outras incursões, como uma candidatura ao Senado, que não chegou a ser vitoriosa. A postulação ao governo, que agora ela coloca, foi incentivada pela cúpula nacional do PDT, presidida por Carlos Luppi, que em entrevistas à imprensa local a considerou “preparada” para alçar voos maiores, falou da representatividade feminina que ela encarna e invocou a decisão da direção pedetista de lançar candidaturas próprias a governos nos Estados, como parte de uma estratégia que possa fortalecer as pretensões do ex-ministro Ciro Gomes, novamente candidato oficial da legenda à presidência da República. Ciro vem perdendo votos desde que o ex-juiz Sergio Moro lançou-se pré-candidato ao Planalto pelo Podemos, perseguindo a ocupação de espaços na chamada terceira via, já que as duas principais vagas ainda são ocupadas, em pesquisas de intenção de voto, pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).
Em dezembro, o “clã” Feliciano entregou cargos que exercia na administração de João Azevêdo, com isto sinalizando postura de distanciamento do atual governo. Lígia contou que teve uma conversa franca com o governador, explicando a questão e agradecendo as atenções que foram deferidas até agora. Chegou a ressaltar que não se tratava de um rompimento, mas, sim, de uma posição autonomista, já que desejava estar livre, à vontade, para analisar toda a conjuntura política paraibana e os destinos de agora em diante. Tal não foi compreendido pelo titular do Poder Executivo, que preferiu rotular a decisão como um “rompimento” de fato. Na verdade, já na campanha municipal para prefeito em 2020, dentro de João Pessoa, os Feliciano divergiram da orientação do governador João Azevêdo, que apoiou a candidatura vitoriosa de Cícero Lucena, do PP, e formaram chapa com o esquema do então prefeito Luciano Cartaxo (ex-PV, atual PT), indicando uma filha, Mariana, como vice da candidata Edilma Freire, concunhada de Cartaxo, cuja performance na disputa ficou muito aquém das expectativas e bem distante das projeções de desempenho feitas pelo esquema.
Mesmo com o resultado adverso nas urnas do pleito municipal, ficou evidenciado, ali, que os Feliciano estavam batendo em retirada da órbita do esquema governista estadual, passando a procurar caminhos próprios na realidade local, o que incluiria novos parceiros e, por via de consequência, novas alianças. A pré-candidatura de Lígia ao governo foi colocada dentro do contexto de um agrupamento de oposição, espectro que, no campo da esquerda ou centro-esquerda inclui o Partido dos Trabalhadores, onde estão alojados dois adversários de Azevêdo – o ex-governador Ricardo Coutinho e o ex-prefeito Luciano Cartaxo. Lígia Feliciano já admitiu a possibilidade de fazer um palanque duplo com Ciro Gomes e o PT, formando, segundo ela, uma grande frente de esquerda em oposição ao governo de Jair Bolsonaro. Ela já foi admitida por petistas como opção para cabeça de chapa na Paraíba, mas precisará medir forças com Luciano Cartaxo, que igualmente aspira a essa indicação, por ter refugado a possibilidade em 2018, quando preferiu lançar o irmão gêmeo Lucélio na disputa vencida em primeiro turno por João Azevêdo.
Lígia se apresenta com uma credencial de peso para figurar em chapa majoritária, qual seja, a condição de representante de Campina Grande, segundo colégio eleitoral do Estado. Também procura massificar o papel de mulher, insinuando que tal segmento deve ter a sua vez. Numa de suas falas a respeito desse tema específico, Lígia foi enfática: “Eu acho que está chegando a vez da mulher na Paraíba. E se essa mulher for eu, quero dizer que me sinto preparada para honrar todas as mulheres do nosso Estado”. Reafirmou, também, que a sua meta é manter o que está certo, corrigir o que avalia que está errado “e fazer o que nunca foi feito pela Paraíba”. Na prática, o filho de Lígia, Gustavo Feliciano, entregou o cargo de secretário de Estado do Turismo e do Desenvolvimento Econômico. Nos meios políticos, o reconhecimento ao potencial eleitoral que Lígia possa vir a alcançar é mencionado com respeito, bem como reflexos de cisão que ela pode abrir no esquema comandado por João Azevêdo. A sua dificuldade maior parece ser formar a sonhada frente de esquerda ou de oposição. Há muito lero-lero e pouco avanço concreto na construção de uma chapa competitiva nessas fileiras.