Nonato Guedes
O economista paraibano Maílson da Nóbrega, sócio da consultoria “Tendências” e ex-ministro da Fazenda no governo José Sarney, afirmou em artigo na revista “Veja” que em menos de um ano “poderemos estar livres do pior desastre político de nossa história, se as eleições presidenciais encerrarem o infeliz governo de Jair Bolsonaro”. De acordo com Maílson, “terão sido quatro anos de má gestão, tensões institucionais e baixo crescimento”. Observa que antes da vitória de Bolsonaro (PL) em 2018, seu passado de parlamentar irrelevante e corporativista já sinalizava maus augúrios. E que o programa de governo do então candidato, “cheio de ideias desconexas”, parecia um trabalho estudantil.
Maílson, que não arrisca prognósticos sobre quem pode vencer as eleições de outubro nem externa preferências por candidatura, defende que diante dos desacertos que estariam sendo cometidos pelo governo de Bolsonaro torna-se “crucial” renovar a liderança do país na eleição presidencial. Relata que o mandatário elogiou notórios torturadores, defendeu o regime militar e o fuzilamento do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), entre outras barbaridades e idiossincrasias cometidas à frente do posto mais importante da hierarquia de poder no Brasil. O ex-ministro admite que, surpreendentemente, Bolsonaro soube explorar o sentimento antipolítica de então, “que decorria da corrupção dos governos do PT e dos desatinos do período da presidente Dilma Rousseff”.
E prossegue: “Os otimistas diziam que ele (Bolsonaro) abandonaria a ingênua ideia de governar com o apoio de frentes parlamentares e da “nova política”, seja lá o que isso significasse. Desapareceria o toma lá dá cá da “velha política”, tida como associada à corrupção e a negociações subterrâneas no âmbito do Congresso Nacional. Eleitores mais confiantes diziam que os arroubos da campanha se curvariam ao controle dos ministros militares. A governabilidade e a aprovação da agenda de reformas se viabilizariam pela formação de uma base parlamentar coesa e majoritária. O presidente exerceria o papel de coordenador do jogo político, tal como foi definido pelo cientista político Carlos Pereira. Nada disso aconteceu, entretanto. Bolsonaro confirmaria o despreparo para o cargo e instintos autoritários”.
A pandemia de Covid-199, na opinião do ex-ministro Maílson da Nóbrega, ainda no exercício de análise que ele faz do governo do presidente Jair Bolsonaro, acabaria revelando um líder negacionista, antivacina e defensor do ineficaz combate precoce à doença. Ressalta que o presidente da República buscou induzir a população a expor-se ao vírus, chamando de maricas os que aderiram ao distanciamento social, evitavam aglomerações e usavam máscaras. Também ao afirmar que todos iriam morrer algum dia, de acordo com Nóbrega, Bolsonaro parecia justificar uma estratégia para acelerar a imunidade de rebanho e a liberação das atividades econômicas, mesmo que à custa de mais mortes. Desse modo, seriam removidas as restrições à mobilidade, que ele julgava prejudiciais ao seu projeto de reeleição.
Ainda Maílson: “Os menos informados sobre as complexidades do governo se entusiasmaram com as propostas ousadas do ministro da Economia, Paulo Guedes. Confiavam em suas credenciais acadêmicas e no discurso sobre reformas, as quais, afirmava, teriam malogrado por incompetência de governos social-democratas. Agora, sim, veríamos o advento de um programa efetivamente liberal: ampla privatização, abertura da economia, encolhimento do Estado obeso e por aí afora. A realidade revelaria um enorme fracasso. Bons legados, como a reforma da Previdência, a autonomia do Banco Central e novos marcos regulatórios, foram ofuscados pela irresponsável PEC dos Precatórios e pela destruição da âncora fiscal, que resultaram em taxas de juros mais altas e menor atividade econômica”. Em conclusão, o economista paraibano exorta: “Que os votos a favor de Bolsonaro em outubro se limitem basicamente ao seu eleitorado raiz, estimado pelo Datafolha em 11% do total”.
O artigo assinado pelo ex-ministro da Fazenda, sem dúvida, expõe um diagnóstico certeiro, irretocável, acerca das mazelas que o país passou a padecer sob a Era Bolsonaro. É verdade que o atual presidente traiu expectativas, frustrou aspirações populares e tem tentado sobreviver à custa de artifícios demagógicos, de mãos dadas com o mais puro fisiologismo que dizia repudiar e que, na prática, estimulou descontroladamente à frente do Planalto ao dar as mãos ao Centrão, grupo político que é uma excrescência no Parlamento e no cenário brasileiro. Maílson, como deixa claro, é crítico em relação a posturas de governos petistas, sobretudo no que diz respeito ao “glossário” adotado por Lula e Dilma Rousseff na parte econômica. Mas a manifestação do ex-ministro engrossa o coro dos que não compactuam com atitudes antidemocráticas cometidas quase diariamente pelo atual governo e, menos ainda, com retrocessos que esse governo tenta infligir à Nação. Por isso é que ele acha que o governo que está aí tem os dias contados – devendo entrar para a História como o primeiro que não conseguiu se reeleger desde que o instituto da reeleição foi implantado na aurora democrática. A esta altura, de fato, não há milagre capaz de reverter a maré de desgaste que fulmina a atual gestão federal a olhos vistos.