A Justiça do Trabalho reconheceu o vínculo empregatício entre a jornalista paraibana Rachel Sheherazade e o SBT, empresa do Grupo Sílvio Santos e determinou o pagamento de direitos trabalhistas referentes ao período em que ela esteve na emissora, de abril de 2011 a setembro de 2020, até ser demitida. A informação é do jornalista Carlos Estênio Brasilino, do site “Metrópolis”, onde Rachel atualmente trabalha. Ela também atua como colunista da revista “IstoÉ” em São Paulo. A sentença foi publicada ontem, 21/1. O SBT deverá pagar à jornalista indenizações trabalhistas de aviso prévio indenizado, décimos terceiros salários, férias, adicionais por tempo de serviço e FGTS, além de indenização por danos morais estipulada em R$ 500 mil. Ainda cabe recurso mas Sheherazade comentou que já se sente “vitoriosa” diante da batalha desgastante enfrentada.
Outro ganho de Sheherazade foi que a Justiça do Trabalho reconheceu atitude misógina e abusiva de Sílvio Santos contra a então funcionária, durante a entrega do Troféu Imprensa em 2017. Na ocasião, Sílvio disse que não a havia contratado para opinar sobre política. “Mas quando você me chamou foi para dar a minha opinião”, rebateu a jornalista. “Não, eu te chamei para você continuar com a sua beleza, com a sua voz, foi para ler as notícias no teleprompter, e não para dar a sua opinião. Se quiser falar sobre política, compre uma estação de TV e faz a bagunça que vocês quiserem”, disse o apresentador. O juiz Ronaldo Luis de Oliveira reconheceu a prática de dano moral contra a jornalista. “O referido apresentador, de forma muito deselegante e abusiva, em comportamento claramente misógino, utilizou o seu poder patronal e de figura notória no meio artístico e empresarial para repreendê-la, em público, não somente como profissional, mas, sobretudo, como se pode concluir, por questão de gênero, rebaixando-a pelo fato de ser mulher, a qual, segundo expressou, deveria servir como simples objeto falante de decoração”, observou o magistrado.
Para Oliveira, condutas como a do apresentador Sílvio Santos “não espelham o que se espera de uma sociedade civilizada e que tem como parâmetro constitucional fundamental o respeito à igualdade de tratamento de gênero, dentre outros, em prol da dignidade do ser humano e, sobretudo, da dignidade da mulher, inclusive enquanto profissional”. Segundo o advogado da jornalista, André Froes de Aguilar, a justiça foi feita. “Relevante neste processo, muito mais que o reconhecimento do vínculo empregatício, foi a decisão sobre os danos morais quando o juiz relata que não é a primeira vez que este juízo se depara com situações semelhantes envolvendo a mesma figura pública, ou seja, Sílvio Santos”, disse. O advogado ainda ressaltou que o magistrado pontuou: “Quando a mulher é tratada como um objeto, como se observou no presente processo, o Poder Judiciário deve atuar, de maneira contundente, a se evitar que o mesmo padrão seja repetido, até porque a violência não é praticada apenas em relação à reclamante, mas em relação a toda e qualquer profissional do sexo feminino”.
Em mensagem que postou em redes sociais, a propósito da decisão judicial, Rachel Sheherazade afirmou: “Obrigada, meus amores, pelo apoio e a empatia de vocês esse tempo todo. Temos um caminho ainda pela frente, mas já me sinto uma vitoriosa por tudo”. Ela trabalhava na TV Tambaú, afiliada do SBT em João Pessoa, quando o vídeo de um comentário criticando o carnaval de João Pessoa viralizou na internet e despertou a atenção do próprio Sílvio Santos, que determinou a sua contratação para atuar na sede do SBT em São Paulo, como noticiarista e comentarista. O estilo polêmico de Sheherazade em opiniões que passou a emitir sobre temas delicados como política, violência e tabus sociais levou-a a ser “patrulhada” por grupos petistas em redes sociais. Posteriormente, ela se indispôs com bolsonaristas quando passou a fazer críticas a Jair Bolsonaro. Rotulada de “direitista”, Rachel acabou sendo proibida por Sílvio Santos de comentar fatos no telejornal do SBT e teve sua demissão pedida publicamente pelo empresário Luciano Hang, dono da Havan, um dos maiores anunciantes do canal de televisão. Passou a se manifestar, então, em sua conta em redes sociais e, mesmo assim, as pressões não cessaram. O SBT rescindiu o contrato com Sheherazade antes do término, iniciando-se desde então uma guerra trabalhista que se arrasta há uma década. No SBT, Rachel trabalhou como pessoa jurídica enquanto era contratada e ficou à frente do telejornal SBT Brasil. Além disso, a apresentadora pediu o pagamento de todos os direitos trabalhistas que acumulou durante quase 11 anos em que exerceu seu ofício no canal.